A boa bilheteria de “Oito Mulheres e um Segredo”, que levou o filme protagonizado por Sandra Bullock e Cate Blanchett a ocupar o 10º posto entre os mais vistos do ano nos Estados Unidos, é garantia de que mais produções com versões femininas de histórias de sucesso deverão ocupar as telonas nos próximos anos.
A tendência começou em 2016, com “As Caça-Fantasmas”, em que a ideia era praticamente a mesma de “Oito Mulheres e um Segredo”, trocando um grupo de amigos em uma missão bem-sucedida por mulheres que exibem, como no original de 1984, união e personalidades muito diferentes entre elas.
“Por mais que estas versões femininas de filmes essencialmente masculinos sirvam para apontar o dedo para a discrepância no protagonismo em Hollywood em relação ao gênero, elas não substituem a necessidade de olhar as personagens interessantes que já existem em algumas franquias”, registra Nayara Renaud, do site Nervos.
“Em um universo com Hermione, o spin-off de Harry Potter (‘Animais Fantásticos e Onde Habitam’) é novamente dominado por homens. Sem falar na evolução de Elizabeth Swann, que continua sendo ofuscada pela insistência em tornar Jack Sparrow algo maior do que ele já era em ‘Piratas do Caribe’”, salienta Nayara.
Cecília Barroso, do Cenas de Cinema, não é muito favorável a versões que existem apenas para fazer essa troca de gênero, objetivando cumprir a agenda do momento. “Acho que existem milhares de narrativas femininas que ainda não foram contadas, mas confesso que, às vezes, ao ver filmes muito masculinos, me pego pensando em como seria se aqueles personagens fossem mulheres”, admite.
Curiosamente, os filmes mais lembrados na enquete realizada pelo Hoje em Dia com críticas de cinema são o japonês “Os Sete Samurais” (1954) e “Sete Homens e um Destino” (1956), que se trata de uma refilmagem – em formato western – do longa com samurais de Kurosawa.
“Seria uma maravilha vermos sete mulheres habilidosas com o uso de armas e na arte de montaria. Arriscaria até em escalar o elenco: Lupita Nyong’o, Jennifer Lawrence, Gal Gadot, Lea Seydoux, Barbara Lennie, Rooney Mara e Emily Blunt. Sabemos que o gênero sempre foi um ambiente predominantemente masculino, de modo que seria ótimo vermos novamente mulheres protagonizando esses filmes de ação no Velho Oeste”, destaca Suyene Correia, do Bangalô Cult.
A crítica de cinema gaúcha Fatimarlei Lunardelli enfatiza que é preciso pensar o feminismo não como uma simples substituição do homem pela mulher nos lugares de poder, mas enfrentando o desafio de incorporar questões de natureza biológica nesta reivindicação. A sugestão de “O Poderoso Chefão” tem a ver com essa ideia. “O desafio seria, por exemplo, incorporar a maternidade e tudo o que ela implica para a mulher. Como reproduzir a espécie e ser, ao mesmo tempo, chefe do crime organizado?”, indaga.

APOLLO 13 (1993, Ron Howard)
“Poderia virar uma versão focada na russa Valentina Tereshkova, que, em 1963, se tornou a primeira mulher no espaço. Embora não tão dramática quanto a Apollo 13, a missão da cosmonauta renderia momentos de tensão, aventura e a oportunidade de tatear a questão de gênero no universo majoritariamente masculino da corrida espacial, uma mistura que renderia um filme pipoca divertido e com conteúdo” (Susy Freitas, Cineset)

CIDADE DE DEUS (2002, Fernando Meirelles e Kátia Lund)
“Sabemos que o gênero western sempre foi um ambiente predominantemente masculino, de modo que seria ótimo vermos novamente mulheres protagonizando esses filmes de ação no Velho Oeste, como já aconteceu com ‘Johnny Guitar’ e ‘Quatro Mulheres e Um Destino’. Se for para radicalizar total, gostaria de ver a versão feminina de ‘Cidade de Deus’ ou de ‘Pulp Fiction’. Seriam versões que já nasceriam polêmicas” (Suyene Correia, Bangalô Cult)

CAÇADORES DE EMOÇÃO (1991, Kathryn Bigelow)
“Em vez daquela versão lamentável feita em 2015, poderia ser algo na mesma linha do filme de Kathryn Bigelow, só que com uma gangue de mulheres com máscaras de ativistas feministas ou artistas (já que não temos uma variedade de presidentas) e uma policial mulher infiltrada. Talvez ficasse divertido e a própria Bigelow poderia ser chamada para dirigir se não se importasse em retornar ao gênero” (Amanda Aouad, CinePipocaCult)

CONTA COMIGO (1986, Rob Reiner)
“O mais interessante agora seria uma versão feminina de ‘Conta Comigo’ ou um filme nesse estilo que mostrasse a amizade entre garotas. Por mais incrível que ‘Meninas Malvadas’ seja, ele faz parte de uma tendência de sempre colocar mulheres umas contra as outras, especialmente se for para brigarem por causa de um homem. Uma obra que valorizasse a sororidade na infância/adolescência seria importante para mudar este estigma” (Nayara Renaud, Nervos)

GOSTO DE CEREJA (1997, Abbas Kiarostami)
“Uma versão deste roteiro minimalista, trazendo uma protagonista, seria interessante porque geralmente são homens que se matam nos filmes. No cinema, eles costumam ter mais crises existenciais do que as mulheres. Hollywood, que descobriu o filão da adaptação de gênero, certamente não investiria num enredo tão mórbido e codificado. Mas o fato de ser uma mulher traria mais complexidade à personagem, já que, estatisticamente, elas se suicidam menos do que os homens” (Ivonete Pinto, Teorema)

O PODEROSO CHEFÃO (1972, Francis Ford Coppola)
“Minha sugestão seria colocar a mulher no lugar em que mais se expressa a cultura patriarcal e o machismo. É o caso da trilogia ‘O Poderoso Chefão’. Mas o princípio da inversão paródica não deveria ‘masculinizar’ a mulher com um comportamento semelhante ao do homem, e, sim, desconstituir esses lugares ocupados por homens com elementos que fazem parte do mundo feminino” (Fatimarlei Lunardelli)

OS SETE SAMURAIS (1954, Akira Kurosawa)
“Além de uma nova interação com os moradores da vila, uma nova versão do filme de Akira Kurosawa seria uma ótima chance de apresentar as oona-musha (ou oona-bugeisha), mulheres guerreiras japoneses praticamente desconhecidas. Tomoe seria o nome da líder, em homenagem a Tomoe Gozen, uma das mais conhecidas oona-musha” (Cecília Barroso, Cenas de Cinema)

TROPA DE ELITE (2007, José Padilha)
“O capitão Nascimento, eternizado por Wagner Moura, seria uma mulher, Claudia Abreu, malandrona, que assumiu o posto depois que ele, enfim, se aposentou. Ela vai subir os morros, dar ordem para atiradoras de elite, ir atrás de bandido. Outra versão que imaginei é do clássico ‘O Poderoso Chefão’. A chefona seria a mamma, vivida aqui por Meryl Streep. Ela não recebe as pessoas no escritório enquanto a festa corre solta lá fora, mas sim na cozinha, entre panelas, e falando alto” (Tatiana Babadobulos)