
Cláudio Assis não é o primeiro cineasta pernambucano a levar para as telas a questão da especulação imobiliária e da descaracterização da faixa litorânea de Recife. Ele já havia inserido o tema em “Febre do Rato”, mas dessa vez o realizador dá o mesmo relevo que obras de conterrâneos, como “Deserto Feliz”, “Um Lugar ao Sol” e “Aquarius”.
Para isso, ele convoca Irandhir Santos, o mesmo ator que, em “Febre do Rato”, representou a voz defensora de uma apaixonada anarquia urbana, uma erva daninha que teima em existir em meio à sociedade capitalista. Em “Piedade”, Santos vive uma espécie de ativista ambiental numa comunidade ameaçada pela ganância de uma petroleira.
A radicalidade romântica do poeta de “Febre do Rato” esbarra, agora, numa luta desalentadora do ativista. A realidade em “Piedade” é mais palpável, percebida na mudança do ecossistema da região, com a presença constante de tubarões, enquanto o artista se vale do choque gerado por suas palavras e ações.
Assis deixa de lado a violência narrativa e o sexo como catalisador dessa força visceral. Esse surge mais comportado em relação às obras anteriores, enquanto os movimentos de irrupção parecem se curvar à sedução pelo dinheiro. É o filme menos coletivo do cineasta, deixando evidente um antagonismo entre o ativista e o representante da petroleira.
O executivo, vivido brilhantemente por Matheus Nachtergaele, é só lábia, num redemoinho de argumentações que nos deixa tontos, sensação ampliada pela câmera que o persegue. A beleza das ideias brutas e puras se sucumbe em “Piedade”, dando lugar às lives e aos posts que, aparentemente, são mais eloquentes e efetivos