A sequência inicial de "Gravidade" é de encher os olhos. Num longo plano-sequência, a câmera gira sem parar em torno de três astronautas americanos que fazem reparos no telescópio Hubble.
Rodeados pela imensidão negra do espaço e com a Terra enchendo a tela ao fundo, eles flutuam num cenário harmônico e encantador, estabelecendo um belo dueto de aproximação e distanciamento com a câmera.
Até que um míssil russo atinge um satélite espião e os destroços viajam em alta velocidade na direção deles. A visão da proximidade dos detritos e do instante em que batem na nave, quando o diretor mexicano Alfonso Cuarón retira o som, é estarrecedora.
Em seguida vivemos momentos de grande tensão com a astronauta Ryan (Sandra Bullock), sozinha e sem comunicação.
Veja o trailer oficial em HD legendado
Oscar à vista
Impressiona como o filme nos deixa sem ar e nos faz sentir tão pequenos diante do universo, em que a vida se torna tão insignificante. Quem parece compreender isso perfeitamente é o veterano comandante Matt (George Clooney), que se apresenta como aqueles experimentes soldados que lidam bem com as situações de perigo e a iminência constante da morte.
São esses ingredientes que justificam a excelente recepção de crítica e público – dobradinha rara de acontecer – e a entrada de "Gravidade" na corrida ao Oscar.
O filme não é um thriller de suspense comum. Apesar de tirar bom proveito do 3D, como se sugasse a plateia para dentro da telona, e de contar com fortes cenas de ação, o roteiro não deixa de trabalhar o desenvolvimento da personagem.
O medo e a solidão a levam a se confrontar com o passado, especialmente com a sensação de perda. Não deixa de ser curioso que as informações sobre seu trauma sejam extraídas por Matt, minutos depois de o acidente ocorrer.
Clooney protagonizou a refilmagem de "Solaris" dirigida por Steven Soderbergh, interpretando um astronauta que se conecta com a esposa morta durante uma missão.
O planeta Terra como sinônimo de vida na tela
A diferença para "Solaris" é que, no caso de Ryan, a reconexão se dá com a vida, num crescendo contagiante que deságua num clímax de valorização das pequenas coisas que envolvem nossa existência.
Falando assim dá a impressão de uma história de autoajuda, mas Cuarón tem o cuidado de não ser melodramático. Põe em pauta, de maneira sutil e vigorosa, o bombardeamento de coisas desnecessárias a que somos submetidos.
Contraposições
Esse bombardeamento ganha sentido real quando um satélite desativado é alvejado pela Rússia, que não imagina a reação em cadeia que essa ação pode gerar.
Com a Terra sempre a "engolir" a astronauta, não há como não olhar para outro lugar que não para o planeta, aqui representado como sinônimo de vida. E Cuarón nos entrega esse quadro a partir de simples e eficientes contraposições e ausências.