Filha de Charles Chaplin, Geraldine fala sobre a sétima arte e, claro, sobre o icônico genitor

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
02/11/2014 às 10:11.
Atualizado em 18/11/2021 às 04:52
 (Mario Miranda Filho)

(Mario Miranda Filho)

SÃO PAULO – Geraldine Chaplin chama a atenção dos passantes e frequentadores de um cinema na rua Augusta. Mas não por ser uma celebridade – o sobrenome denuncia, ela é filha de ninguém menos que o criador do eterno “Carlitos”. Seu olhar curioso como o de uma criança e um falar contagiante (que reverbera por todo o corpo) fazem dela também um personagem chapliniano. E a comparação não a incomoda. Apesar da longa carreira, Geraldine exibe um enorme prazer ao falar do pai.
 
Uma das razões de sua passagem pela capital paulista foi justamente celebrar, mais uma vez, o talento de Chaplin, que, ela não se cansa de dizer, foi um gênio. “Ou melhor, ele não gostava dessa palavra. Era único”, ressalta, ao Hoje em Dia.
 
No encerramento da 38ª Mostra de Cinema de São Paulo, ontem, foi exibido “Corridas de Automóveis para Meninos”, curta que lançou, há 100 anos, o engraçado andarilho pobretão de chapéu coco e bengala.
 
Com 70 anos completados em julho, Geraldine também acompanhou a apresentação de seu mais recente longa, “Dólares de Areia”, dirigido pelo casal Laura Guzmán e Israel Cardenas.

A senhora já se definiu como uma andarilha, filmando em vários países (um de seus trabalhos mais recentes, “Dólares na Areia”, foi realizado na República Dominicana). O que mais lhe motiva a participar de cinematografias tão diversas?

Busco os diretores. Na verdade, não há diferenças no cinema dos países onde trabalhei. Há bons e maus filmes. Há diretores bons, medianos e ruins. Eu busco sempre os bons diretores, mas, muitas vezes, me equivoco. A vantagem de falar três línguas (inglês, espanhol e francês) também amplia o espectro de possibilidades.

Uma das razões que a levou a aceitar o convite para “Dólares de Areia” foi sua narrativa mais calcada nas sensações, menos explícita ao acompanhar a história de uma senhora estrangeira que se envolve com uma nativa mais jovem?

Com um tema que poderia ser contado de distintas maneiras, o filme tem uma elegância e delicadeza ao abordar o que há de mais profundo naquela relação. Minha personagem é como um animal moribundo, carregando uma saudade que não é da juventude, mas de algo que ela mesma não sabe bem o que é. Quando a câmera insistentemente foca em nossos olhos, o filme quer mostrar a busca que há nos dois lados, a partir da ilusão de que o dinheiro pode comprar o amor, por um lado, e a possibilidade de sair do país, do outro.

A senhora mencionou a “saudade da juventude”... Com 70 anos completados em julho, como se relaciona com o avançar da idade?

Minha relação com o tempo é de guerra. A sensação que tenho é que aconteceu um massacre. Não há nada de bom em envelhecer, pois cada vez mais você se aproxima da morte.

Os críticos, de maneira geral, têm avaliado que a personagem de “Dólares na Areia” corresponde a um dos melhores momentos de sua carreira. Quais outros você acrescentaria à lista dos grandes papéis de sua vida?

Esse, esse e esse (risos). Na verdade, não sei dizer. Deverá ter algum bom, não? (risos).

A Mostra Internacional de Cinema de São Paulo exibiu o curta-metragem “Corridas de Automóveis para Meninos” (1914), filme em que seu pai interpretou Carlitos pela primeira vez. Cem anos depois, o que torna esse personagem ainda tão cativante?

Meu pai foi um homem que sempre esteve à frente de seu tempo. É o que faz seus filmes serem tão atuais. Charles Chaplin era um gênio. Ou melhor, ele não gostava dessa palavra. Ele era único. Em 1917, em “O Imigrante”, há um plano incrível em que ele mostra a Estátua da Liberdade e depois vai descendo até enxergamos aquele monte de pessoas que acabaram de chegar a Nova York e são mal-tratadas pela polícia. Que colhão!

A senhora tem, na memória, alguma situação que reflete o fascínio que os filmes de Chaplin exerceu nas pessoas?

Não me ocorre nesse momento, mas posso citar um filme de papai, “Luzes da Ribalta”, uma espécie de testamento dele. É sobre o sentimento de dignidade que pode ter um comediante, no contato com seu público. Sempre vi como uma história de amor entre um palhaço mais velho e uma jovem bailarina. Hoje, no momento em que tenho a mesma idade daquele personagem, vejo que seu verdadeiro tema é o terceiro ato de um artista. Isso me faz refletir sobre esse momento de nossa carreira. E posso dizer que foi uma valentia enorme de meu pai em fazer esse filme. Não sei se essa resposta é a que você queria para a sua pergunta (risos). Aquela bailarina, pela qual já tive pena, agora vejo como uma histérica, uma perdida.

No próximo ano, serão comemorados os 50 anos de “Doutor Jivago”, em que você fez seu primeiro papel adulto. Que lembranças guarda do filme de David Lean?

Não tinha a sensação de que estava fazendo um grande filme, que seria bastante lembrado depois. Quando foi lançado, as primeiras críticas foram muito negativas e David Lean ficou muito sentido. Mas foi muito divertido trabalhar com um sol a 40 graus e usar neve artificial, interpretando como se sentisse muito frio.

Em quais projetos você está trabalhando agora?

Vou trabalhar com o (J. A.) Bayona, num papel pequeno, em “Monster Calls”. Depois irei para a França para fazer um filme com Mathieu Almaric, “Spiritismes”. E entre os que estão para ser lançados, tem um dirigido por Wolfgang Becker (“Ich und Kaminski”), o mesmo de “Adeus, Lênin!”. E outro de Pascal Thomas, “Valentin Valentin”. Depois verifique esses títulos porque eles (diretores) estão trocando (risos). Ah! E acabo de trabalhar com Karl Lagerfeld, diretor da maison Chanel, um spot publicitário.

    
 

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