
Não é preciso ser familiarizado com o universo funk para reconhecer os passinhos – como são chamadas as várias maneiras de se dançar o estilo país afora. Na web, pipocam vídeos que quase sempre tornam-se virais, com grupos de jovens se movendo de forma sincronizada ao som de hits, incluindo rock. Muitos viram memes.
Mas, por mais que o caráter viral das imagens faça parecer que o passinho é só um passatempo adolescente, a dança é levada a sério. Tanto que existem estilos diferentes e vários representantes para cada um deles, além de grupos e dançarinos profissionais encarregados de divulgá-los. Mas dentro dessa vasta seara de passinhos, o fenômeno mais recente da internet vem de Minas: é o Passinho de BH.
Apesar de já ser conhecido nos movimentos dos frequentadores de bailes funk da capital, o passinho com jeito mineiro ganhou notoriedade nos últimos meses, quando vídeos da dança começaram a viralizar.
Um dos responsáveis por esse impulso é Mike Gabriel Severino, de 23 anos, o MC Zilu. Funkeiro em Belo Horizonte, criou no Facebook uma página dedicada exclusivamente a vídeos de pessoas dançando o passinho da capital. Já são 6 mil curtidas.
“Sempre vi páginas de outros tipos de passinho, aí decidi criar algo para representar BH”, conta.
No Instagram também é possível encontrar vários perfis dedicados à coreografia mineira. A maior tem quase 190 mil seguidores.
Jeitinho
Mas o que está por trás da força do estilo de BH? Para MC Zilu, principalmente a possibilidade de se dançar tanto sozinho quanto junto.
O dançarino e funkeiro Johnathan Gomes tem outro palpite. Membro e um dos idealizadores do grupo mineiro Passistas Dancy, ele diz que o Passinho de BH lembra muito o Miami, outro estilo da dança. “Mas é mais tranquilo e suave, com mais molejo no corpo”, compara.
Para Welleton Carlos, integrante de um dos grupos de maior visibilidade da capital, o Favelinha Dance, o passinho mineiro também tem como característica a liberdade e a variedade de movimentos que abarca. “Cada dia você aprende uma coisa nova e pode fazer do seu jeito”.
Cenário
Embora tenha um passinho particular, BH abre espaço também para outros passinhos, que arrebatam a turma em apresentações, oficinas e batalhas de funk.
Os Passistas Dancy são um exemplo disso, já que são representantes “batizados” pelos próprios cariocas como representantes do Passinho Foda, em Belo Horizonte.

Os Passistas Dancy foi formado no Aglomerado da Serra
Manifestação cultural transforma membros da comunidade
“Tanto o passinho quanto o funk mudaram a minha vida e a de muitos meninos que dançam comigo”, diz Jonhathan Gomes, que além de se apresentar com o Passistas Dancy também dá aulas de dança em espaços da capital mineira.
Mas é principalmente ao trabalho com o grupo que ele credita várias oportunidades que teve. “Foi por meio do passinho e do funk que conseguimos viajar, conhecer vários lugares”, conta.
Essa possibilidade de abrir portas faz o funk ganhar espaço nas quebradas. “Para a galera da comunidade, é algo muito importante também, porque com o funk você pode se tornar um dançarino, um MC, um DJ. Consegue ganhar uma grana com o trabalho e, com isso, pode incentivar um menino a correr atrás daquilo que quer”.
Mas o funk também traz desafios. “Acabamos virando uma referência para vários jovens. Então temos que tomar cuidado com certos comportamentos, com o que vamos falar e como vamos agir”, afirma.
A visão estereotipada, que associa o funk muitas vezes à criminalidade, é outro obstáculo – mas que, para Jonhathan, tem sido superado com o tempo.
“O funk está sendo bem aceito dentro da sociedade. Há ainda quem critique, queira criminalizar, mas graças a Deus estamos conquistando nosso reconhecimento a cada dia mais”, destaca.

MC Zilu é um dos responsáveis por impulsionar coreografia no Instagram e no Facebook
Reconhecimento
Embora as várias manifestações do universo do funk conquistem novos espaços – foi com o passinho, por exemplo, que o grupo Favelinha Dance, do Aglomerado da Serra, se apresentou no MECAInhotim em 2017 e, recentemente, abriu o show da banda Liniker e os Caramelows, em BH – existe ainda uma luta por reconhecimento, respeito e legitimação do movimento.
“O passinho, o funk e os bailes são o que a quebrada tem de cultural. Muitas vezes a polícia chega com truculência e não consegue entender isso, sabe? Existe ainda uma barreira muito grande entre a periferia e o asfalto”, diz Welleton Carlos, do Favelinha Dance.
E se como música e manifestação cultural o funk luta por reconhecimento, na dança não é diferente. Welleton conta que uma das lutas do grupo de que participa é pela inserção do Passinho de BH como uma técnica específica de dança. “Acreditamos na força da nossa luta de falar que o funk é, sim, cultura”, declara.