Cuba deve algumas estátuas ao Buena Vista Social Club. Pois desde 1999, quando esse grupo de uma velha guarda de cantores e instrumentistas de Havana e Santiago prestes a desaparecer sem nunca ter aparecido fora da Ilha passou a fazer shows pelo mundo, a história ganhou um novo capítulo. Chan Chan, com a voz do santiaguero Eliades Ochoa, passou a rivalizar com Guantanamera entre as mais tocadas em núcleos turísticos e a música retomou suas forças para 'vender' a Cuba que deu certo.
A notícia ruim é que o grupo original teria, por razões biológicas, vida curta. Quem não viu, não viu. Eles eram o pianista absurdo Ruben Gonzales; o cantor mais carismático das Américas, Compay Segundo; o homem bolero Ibrahim Ferrer. Todos se foram, mas o Buena Vista não. A notícia boa é que seus remanescentes, incluindo os fundadores Omara Portuondo, a maior cantora de Cuba; o sofisticado alaudista Barbarito Torres; o trompetista Manuel Guajiro Mirabal; e o trovador do Oriente, Eliades Ochoa, estarão com novos integrantes do grupo neste sábado, em São Paulo, às 22h, na casa de shows Tom Brasil.
A turnê tem o triste título de Adiós, sendo bem objetivo. É a temporada de despedida do grupo, mas é bom lembrar de que ela está na estrada desde 2014. "A essência de nossa música é o que tem feito o grupo perdurar por todos esses anos. E agora contamos com uma geração de talentosos músicos novos que dão muita energia ao grupo." Ele diz que a turnê atual é para homenagear o público que, de fato, transformou o projeto em um 'case' de sucesso, mas também "os integrantes que já não estão conosco."
Seria mesmo um adeus esta turnê? Cuba não perde quando o grupo parar de se apresentar? "Nosso adeus é uma forma de dizer 'obrigado'. São mais de 20 anos celebrando a música por todo o mundo. A verdade é que não acredito que nossa cultura deixe de sonhar. Cuba é um país muito potente, você vão ouvi-la muito ainda." Se é assim, por que o Buena Vista não poderia continuar na estrada, mesmo com a maioria dos integrantes originais fora de cena? "Este é o momento de agradecer a todos esses anos. Mas todos seguiremos cantando, temos ainda muita energia."
Como bom artista que ainda vive ou tem familiares em Cuba, Barbarito finge que não percebe a deixa para falar de política e desconversa. No momento em que a Ilha ganha um novo líder, Miguel Díaz-Canel, por mais que tenha se apresentado assumidamente como um porta-voz de Raul Castro, o músico segue em seu discurso sobre suas expectativas com relação a mudanças: "Com os anos e as novas gerações, aparecem sempre sons e estilos. E então a música muda a todo tempo, novos ritmos aparecem e muitos artistas chegam na Ilha para tocar com nossos artistas locais. Há muita inovação, e isso é sempre bom."