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Recados para Juca Ferreira: fazedores de cultura falam dos desafios do novo gestor da área na PBH

Lucas Buzatti
lbuzatti@hojeemdia.com.br
Publicado em 16/06/2017 às 20:18.Atualizado em 15/11/2021 às 09:07.

O ex-ministro da Cultura, Juca Ferreira, assume nesta segunda_feira (19), a área em Belo Horizonte. Escolhido por Alexandre Kalil, em um anúncio que pegou de surpresa o setor cultural mineiro, no início do mês, o baiano vai comandar a Fundação Municipal de Cultura, sem gestor desde a saída de Leônidas de Oliveira, enquanto o projeto que recria a Secretaria Municipal de Cultura espera aprovação da Câmara Municipal.

Criada na gestão de Patrus Ananias (1993-1996), a secretaria foi extinta em 2005 pelo então prefeito Fernando Pimentel. “A volta da secretaria converteu-se em demanda histórica de parte significativa dos agentes culturais da cidade”, afirma a vereadora Áurea Carolina, em texto escrito com a também vereadora e militante cultural Cida Falabella.

A cultura mineira, cuja efervescente produção tem se comprovado ao longo dos anos, viu com bons olhos a chegada do novo gestor – principalmente porque ela representa a recriação da secretaria, prometida por Kalil durante a campanha. Mas o assunto tem dividido opiniões: criar a nova secretaria ou manter a fundação? Em entrevista ao Hoje em Dia, na semana passada, Juca Ferreira afirmou que a melhor opção é unificar as duas propostas.

“Essa oposição não existe. Acho que a discussão não está bem posta. A criação da secretaria não acaba com a fundação. A ideia é ter uma estrutura orgânica, em que a existência da secretaria colocaria a cultura no patamar de outras políticas, participando de reuniões com o prefeito e valorizando o orçamento para a área. Já uma fundação cultural pode nos dar agilidade na captação de recursos e na execução de programas e projetos. Uma secretaria bem desenvolvida tem uma estrutura descentralizada, com uma ou até mais fundações. Isso é normal”, salientou Ferreira, que também foi secretário de Cultura de São Paulo, na administração de Fernando Haddad (PT).

Experiência, de fato, não falta a Juca Ferreira. O baiano começou a trabalhar no Ministério da Cultura em 2003, quando foi convidado pelo então ministro Gilberto Gil para o cargo de secretário-executivo da pasta, onde permaneceu por cinco anos. Em agosto de 2008, assumiu o ministério, onde trabalhou até o fim do governo Lula, em 2010. Com a reeleição de Dilma, deixou a secretaria de Haddad e voltou a assumir o Ministério da Cultura, de onde saiu após o impeachment da presidente.

Para além do debate sobre a criação da Secretaria Municipal de Cultura, Juca Ferreira vai encontrar acertos e desafios oriundos das gestões passadas e do atual momento político e econômico que vive o Brasil. Para entender melhor o terreno que o gestor encontrará em BH, conversamos com alguns fazedores de cultura, que apontaram desafios e prioridades para Juca Ferreira.

Leonardo Lessa - Artista de teatro e Gestor Cultural

                                                                                    Janine Moraes/DivulgaçãoLeonardo Lessa

"Para orientar a nova gestão, cidadãs da capital mineira já construíram importantes marcos legais: a Política Municipal de Fomento, o Plano e o Sistema Municipal de Cultura. Essas leis foram elaboradas em importantes instâncias de participação social, como o Conselho Municipal de Políticas Culturais e as Conferências Municipais de Cultura, que devem ser cada vez mais fortalecidas. A nova Secretaria conta com uma potente rede de equipamentos públicos de cultura: 17 centros culturais, 3 museus, 3 teatros públicos, entre outros, que precisam ser priorizados não somente no que diz respeito à sua programação, mas também no diálogo com as comunidades em que se localizam, articulados em rede e com programas setoriais que possam fomentar a cultura viva que pulsa em todos os cantos de BH. A tradição da cidade em realizar eventos calendarizados (festivais, mostras, viradas, encontros) de iniciativa da própria prefeitura ou de agentes culturais da cidade deram relevância à nossa produção artística no cenário nacional e internacional. Essas iniciativas também merecem um olhar específico do poder público. Apesar de sua natureza eventual, FIT, FAN, FIQ, FLI e Virada Cultural devem ser um marco temporal que torne visível o conjunto de políticas voltadas para esses setores, e não as próprias políticas, como temos percebido nos últimos anos. As políticas para a formação artística, que ganharam destaque na última gestão de Juca à frente do MinC, devem ter na Escola Livre de Artes – Arena da Cultura um espaço privilegiado para prosperar em âmbito municipal. O município precisa recompor as sucessivas perdas orçamentárias do Fundo Municipal de Cultura, que completa agora um ano e meio de atraso". 

Titane - Cantora e militante da área cultural

Titane

"Acredito que o grande desafio que temos na gestão pública é criar mecanismos que avaliem as ações pela consistência e pela qualidade dos projetos. Hoje, as avaliações são quantitativas, fiscais, muitas vezes feitas por departamentos jurídicos de instituições que não têm a menor sensibilidade para com a cultura, que não conhecem a complexidade do fazer artístico. Isso faz com que sejam sacrificados projetos fundamentais, pioneiros e de grande poder de multiplicação social nas comunidades de atuação. Outro grande problema é que a disponibilização de equipamentos cresceu muito, mas não foi acompanhada pela valorização dos recursos humanos. Se não são colocadas, nesses equipamentos, cabeças pensantes, inquietas e responsáveis, eles viram grandes elefantes brancos. Penso que a cultura não precisa apenas de uma pasta, mas de uma pasta com recursos e possibilidades para exercer a função à altura. A decisão de recriar a secretaria é uma vitória, pois a extinção reduziu a dimensão da cultura na gestão pública. Mas essa secretaria só funcionará se houver condições que tornem viável o trabalho do Juca". 

Beto Franco - Ator e diretor-presidente do Grupo Galpão

Beto Franco

"Acabamos de passar por um momento difícil em Belo Horizonte, com as gestões de Marcio Lacerda, que tinham uma atuação muito fraca, até contrária, no que toca à cultura. Juca Ferreira, por sua vez, tem a experiência de ter sido ministro da cultura, é um cara muito inteirado do ambiente cultural e bem articulado com o setor. De modo geral, percebo que o meio cultural recebeu com bons olhos a nomeação dele. O primeiro desafio é fazer com que a secretaria volte, de fato, com força dentro do executivo municipal. Espero que seja uma pasta firme, que tenha recursos para implementar novas políticas e programas culturais. Talvez uma boa iniciativa seja a aproximação com agentes do setor cultural. Escutar os setores para levantar as demandas e, assim, conseguir respondê-las. Por exemplo, no caso das artes cênicas, uma demanda é reequipar os teatros municipais, que estão um pouco largados, e buscar uma política de ação mais efetiva nas periferias. Acho que, quando a secretaria tiver força política e recursos, Juca deve buscar uma ação efetiva no sentido de reativar os editais. A cultura é algo de que a cidade precisa, e os artistas precisam trabalhar. Quando o município fomenta a cultura, a cidade se movimenta e o artista tem a oportunidade de viver do próprio trabalho. Sem contar que é um setor que mobiliza grande cadeia produtiva, que emprega muito, direta e indiretamente".

Raquel Coutinho - Cantora, compositora e produtora cultural

Raquel Coutinho

"A gente tem uma produção cultural muito rica em Minas, e BH é o polo disso. Alguns projetos vêm agregando e desenvolvendo políticas de capacitação, de treinamento, de desenvolvimento de mão de obra, como os chamados Pontos de Cultura. Essas iniciativas devem ser mais abrangentes e descentralizadoras, envolvendo também as periferias e pequenos núcleos de produção, e é importante que o Juca dê atenção a elas. Acredito que, para um secretário de cultura, a grande dificuldade é entender a estrutura cultural da cidade como um todo. Temos vários cruzamentos, é tudo interligado, e Juca deve ter um olhar sensível para conhecer essas redes, que são formadas por associações, núcleos, coletivos e produtores. O desafio de Juca é formar uma equipe que possa fazer essa pesquisa em BH, identificando os focos de produção para dar passos agregadores, com ações culturais efetivas. A secretaria deve manter vivos os projetos que estão dando frutos e incentivar a criação de políticas públicas que dêem mais força à cultura. Também é preciso movimentar casas e espaços que estão abandonados, bem como parques e praças que também têm muito potencial para receber todo tipo de ocupação cultural. E, claro, conseguir recursos para a área cultural e reativar os editais é fundamental, afinal são eles que também dão o suporte para que o artista possa trabalhar".

Makely Ka - Músico, compositor e integrante do Coletivo Matraca

Makely Ka

"Belo Horizonte está entre as cidades com a maior desigualdade social do mundo. Para quem vive aqui isso pode não ser óbvio, mas tampouco é uma surpresa. Nesse ambiente de tensão constante, a cultura é um espaço de interlocução entre as diferenças, e a música, uma possibilidade de convívio, senão harmônico, pelo menos intenso. Sem dúvida, uma característica peculiar da música produzida na capital mineira hoje é a capacidade de promover o encontro dos contrários de forma espontânea, não- programática. Talvez seja um artifício inconsciente e coletivo de sobrevivência, mas o fato, que pode ser observado tanto nas formações dos grupos, nas fichas técnicas dos discos, no público que frequenta os shows, é que não há uma divisão rígida das tribos urbanas identificadas com estilos e gêneros musicais específicos como se verifica na maioria das grandes metrópoles. A harmonia, ou a falta dela, é sempre um elemento de referência nessa produção, muitas vezes como contraponto ou diálogo cruzado com uma tradição recente. A música, por sua vez, integra outras artes como a dança, o teatro, o audiovisual, a literatura. Em Minas, essas colaborações transversais se multiplicam e as linguagens se retroalimentam num processo cada vez mais vertiginoso e necessário para a dinâmica de funcionamento. Ou de sobrevivência. As pessoas entenderam que para ter autonomia precisam trabalhar coletivamente, e que esse tecido social fundamenta e dá sentido ao ato criativo, muitas vezes solitário. Prova de que o arco das artes está tensionado tanto quanto o das relações sociais, mas aponta para outros alvos. Quando encontra os canais para se manifestar, essa produção cultural mostra toda a potência, seja no Carnaval de Rua, no Duelo de MCs, na Praia da Estação, na efervescência da cena musical, da dança, do cinema. Espero que o novo secretário da futura Secretaria de Cultura tenha capacidade de reinventá-la".

Rose Pidner - Produtora cultural e diretora da Veredas Produções

Rose Pidner

"O que vejo de positivo em Belo Horizonte é a efervescência cultural que saiu para as ruas e praças da cidade. Muitos festivais de música, teatro, livros, gastronomia estão ao alcance dos cidadãos. Existe aqui uma riqueza criativa enorme, com grandes artistas e fazedores de cultura em todas as áreas, excelentes técnicos que conhecem e dão conta de desenvolver e realizar projetos. Dos mecanismos de custeio existentes à Lei de Incentivo à Cultura, que está consolidada com seus dois mecanismos, o Incentivo fiscal e o Fundo Municipal, tudo deve ser mantido, sempre buscando maior dotação orçamentária. Porém os desafios são muitos e o principal deles é como administrar com recursos escassos. Um exemplo: nossos museus municipais estão à míngua, sem verba para exposições, sem o mínimo de funcionários necessários para manutenção, limpeza, segurança etc. Este é um de vários outros problemas a serem enfrentados. Desejo boa sorte e boa administração ao Juca Ferreira".

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