Polly Paixão

'Somos contra a camarotização do Carnaval de BH', diz presidente da Liga Carnavalesca

Angel Drumond
angel.lima@hojeemdia.com.br
05/02/2024 às 08:28.
Atualizado em 05/02/2024 às 08:30
Polly Paixão conta como a folia mineira se tornou referência no país (JPFrans/Divulgação)

Polly Paixão conta como a folia mineira se tornou referência no país (JPFrans/Divulgação)

Mal deu tempo de se recuperar do Réveillon. Desde meados de janeiro – quando houve o teste de som para o desfile de blocos, “esquenta” que levou milhares de pessoas à avenida dos Andradas na região Leste – que Belo Horizonte respira Carnaval.

Peça fundamental da festa na cidade, a paulistana Pollyana Belo Paixão Sandenberg, produtora da Banda Mole, do Baianas Ozadas e do Funk You, resgata a história e conta detalhes de como o Carnaval de BH se tornou referência para o país e o porquê de turistas procurarem cada vez mais a capital mineira.

Presidente da Liga Carnavalesca, a gestora empresarial, mais conhecida como Polly Paixão, fala nessa entrevista também da relação com o carnaval de rua. 

O que o carnaval de 2024 terá de diferente em relação ao do ano passado?
Especificamente de diferente é o despertar do governo. Voltar os olhos para o carnaval de Minas é algo que tenho dito nas entrevistas, que foram 10 anos e evolução em um. A gente começa a fazer propaganda em outros estados, uma publicidade bem agressiva, seja no aeroporto de São Paulo, no metrô do Rio de Janeiro ou em pontos estratégicos de Salvador, coisas que a gente só via dessas capitais aqui para a gente, e acho incrível, porque cada real investido no carnaval de Belo Horizonte se reverte em muitas vezes mais para os cofres públicos em relação a impostos, fora a economia informal. Eu achei sensacional a história das avenidas sonorizadas, um lugar que os trios tenham onde passar, de pleitear, que não precise ficar desviando de árvore ou ficar abaixando a cabeça no semáforo, uma situação mais estruturada, mais organizada, em que todos possam ouvir o que está sendo tocado. Sem contar a segurança que terá nesses lugares, até porque ninguém vai precisar ficar atrás do trio elétrico para ouvir. As pessoas poderão ficar mais espaçadas umas das outras. 

Na sua opinião, o que levou o Carnaval de Belo Horizonte a ser um dos mais procurados pelos foliões de todo país?
Um pouco foi por causa da diversidade. Nosso carnaval tem para todos os gostos, tem para todos os públicos, tem os blocões, tem os megablocos, com as mais variadas temáticas, tem os blocos médios e tem os blocos de bairro. Qualquer pessoa, com qualquer gosto, fica satisfeita no carnaval de Belo Horizonte. Temos religiosidade, tem cores, tem causas, enfim, é muito diverso e muito popular. Se algum bloco faz algo parecido com camarote, fica mal visto entre os outros participantes carnavalescos. Carnaval é realmente uma festa em que todas as pessoas são iguais. Somos contra a ‘camarotização’ do carnaval de BH.

Acho que pagar R$ 250 para ter quatro meses de ensaio, duas vezes por semana, para adentrar um bloco que é referência na cidade, onde você não tem que pagar nem sua camisa, não sei falar se o valor é realmente fora do normal, e não acho caro.

Como começou sua relação com o carnaval de BH?
Eu não era uma produtora de carnaval, eu não era uma produtora artística, não mexia com nada disso, me formei em relações públicas, logo depois fiz um MBA em administração, e fui trabalhar, em grande parte da minha carreira, fazendo consultoria empresarial. Aí em 2016 eu conheci o Gel, o idealizador do Baianas Ozadas. Ele me procurou pedindo uma consultoria sobre o bloco que chegou a 200 mil pessoas. Depois disso, fui tentar entender o carnaval, saí no bloco, e aí sentei pós carnaval com ele para fazer algumas perguntas. Foi aí que ele me contou como era difícil ganhar dinheiro com o carnaval, principalmente pela falta de patrocínios. Em 2016, sentamos pela primeira vez com uma cervejaria, junto com outros blocos considerados grandes na época, e lembro que vários saíram revoltados da primeira reunião achando que estaríamos privatizando o carnaval. Foi aí que no carnaval de 2017 o Baianas Ozadas, patrocinado, saiu no maior trio elétrico que a cidade já tinha visto. Virei a “Yoko Ono” do carnaval, todo mundo falava mal de mim, que o bloco tinha acabado com o carnaval de Belo Horizonte. Depois disso, o Baianas Ozadas rachou. Mas o mais legal de tudo foi que todos esses blocos que tinham falado mal da gente saíram patrocinados no ano seguinte. Em 2020 acabou o patrocínio da cervejaria com a Prefeitura de Belo Horizonte e desde 2023 a cervejaria entendeu que era a grande patrocinadora do carnaval e que era melhor fazer isso através da Lei de Incentivo, e desde então a Belotur não conseguiu se reinventar. Antes disso acontecer, eu fui chamado para trabalhar no Funk You, e o levei para a avenida Afonso Pena. No ano passado, ele foi o bloco mais populoso de todo o carnaval. A Banda Mole eu assumi este ano. Consegui regularizar o problema de inadimplência junto ao Estado, ou a Lei de Incentivo. Escrevi um projeto no ano passado e consegui que ele fosse aprovado e hoje estou à frente do que chamo do maior evento e mais antigo da vanguarda do carnaval de Belo Horizonte que é a Banda Mole e que está fazendo 49 anos. E ainda falo da Liga Belorizontina, onde em 2023 acabou a gestão do Gel e fui indicada para o cargo. Através dela que converso com o Governo do Estado, e foi aí que surgiram todas essas ideias de inovação para este ano. 

O que você, como líder carnavalesca, pensa sobre o assédio às mulheres durante a festa popular e o que tem sido feito para evitar?
Sobre o assédio, acho que infelizmente ele está no nosso dia a dia. Está nas menores coisas. Eu nem diria que o carnaval é um mapeador disto. Particularmente sofro assédio todos os dias. De um olhar, às vezes a pessoa nem fala porque essas ações são mais coibidas. Não passam mais a mão na gente, não pegam pelo cabelo, não puxam a roupa, mas o assédio continua. Mas a gente vem em uma luta constante, inclusive estamos fazendo um trabalho muito bonito com o Governo do Estado, com a Secretaria de Mulheres para fazer uma prevenção de como lidar frente ao assédio. Mas acho que isso não é uma particularidade de Belo Horizonte, infelizmente é algo que vem do Brasil, esse machismo que impera. As coisas estão começando a ser ditas, mas até trocar uma cabeça tem que trocar uma geração. Eu acho que tem diminuído, pelo menos as situações mais grotescas. Mas acho que o machismo é estrutural, muitas vezes ele não se dá pelo assédio e sim pelas relações.

O folião já percebeu que o carnaval está mudando na capital mineira. Os grandes blocos estão virando enormes, e o preço para se tocar já está sendo comentado como fora do normal. O que você tem a dizer sobre?
Sobre valores, eu não vivencio isso nos blocos que gerencio. A gente percebe que é necessário cobrar, porque toda aula que você for ter na sua vida existe um professor para te ensinar. E alguém tem que pagar esse professor. E as pessoas aprendem a tocar, não viram músicos, mas aprendem. Acho que os blocos estão enormes sim, estão se profissionalizando sim, represento esses blocos na Liga e só tem bloco gigante, mas não acho que seja alguma coisa fora do normal. Acho que pagar R$ 250 para ter quatro meses de ensaio, duas vezes por semana, para adentrar um bloco que é referência na cidade, onde você não tem que pagar nem sua camisa, não sei falar se o valor é realmente fora do normal, e não acho caro. Não é a minha realidade. 

No ano passado, foi falado quase 5 milhões de foliões pelas ruas. Qual a expectativa para esse ano? 
Eu não confio muito nesses números que são passados pela prefeitura. Nem de dinheiro recolhido, nem de pessoas, os números não batem. Então, prefiro não falar de números, mas não tenho dúvida nenhuma que o turismo vai crescer por conta da propaganda que o governo do Estado fez, além do investimento e do crescimento natural que já está acontecendo todos os anos, mas prefiro falar de qualidade. Acho que temos em Belo Horizonte agora um Carnaval que é o mais seguro do Brasil e que ficará mais seguro ainda, pelo menos nestas duas avenidas (sonorizadas). Acho que teremos essa particularidade do bloco totalmente sonorizado. E isso vai atrair muitos turistas para cá.

Apesar da festa, os mineiros e turistas têm lidado com situações de furtos. Mesmo não sendo um assunto de sua responsabilidade, como você pode tranquilizar a população com o trabalho da segurança pública?
Se formos lembrar de furtos, podemos lembrar de uma matéria no Réveillon de roubos de celulares que aconteceram dentro de um clube na capital. Eu que estou muito na rua, vivenciando shows e eventos, tenho visto furtos dentro de boates, de locais caros. Mas quando falo de carnaval seguro, é sobre não ter arrastão, não ter tiro, não ter morte. Eu ainda acho que a polícia militar, embora haja algumas controvérsias, se excede, e um pequeno número de pessoas acaba fazendo coisas que acabam repercutindo grandiosamente. Mas particularmente, acho que a PM faz um excelente trabalho no carnaval de BH.

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