
Foi encerrada, recentemente, a 26ª edição da Expocachaça, que já se consolidou como a maior e mais importante vitrine do agronegócio da cachaça, sendo responsável pela promoção e divulgação da bebida nos mercados interno e externo.
Segundo José Lúcio Ferreira, diretor-presidente da feira, “em todos esses anos, o evento serviu de palco para inúmeras tomadas de decisão que ajudaram a fomentar o desenvolvimento do setor e contribuíram para a mudança de conceitos e paradigmas a respeito da nossa bebida nacional.”
Esta declaração, juntamente com uma pesquisa que realizei recentemente, me levam a refletir sobre a carta de destilados na atualidade.
Há tempos afirmo que a atenção dada à adega de vinhos – com o trabalho de profissionais conceituados e sommeliers qualificados – não encontra correspondência quando o assunto é destilado, cuja carta frequentemente não condiz com a qualidade do restaurante.
O profissional de cozinha dificilmente acumula conhecimento na área de bebidas. A responsabilidade recai, então, no sommelier. Ocorre que a formação deste profissional é deficiente.
Os cursos oferecem apenas um punhado modesto de informação, o que irá se refletir na carta do lugar onde estes especialistas irão trabalhar. Os que vão além, geralmente o fazem exclusivamente em relação ao vinho.
Cabe ao profissional de bebidas a tarefa de conduzir os clientes a boas escolhas, quer sejam de vinho ou de destilado. A carta escrita por um sommelier é o espelho do seu conhecimento sobre bebidas.
A pesquisa aponta para o que já intuíamos: cartas refinadas em relação ao vinho e extremamente deficientes quando se trata de destilados. Ressalte-se que nosso campo de pesquisa não foi a de restaurantes medianos, mas estabelecimentos que são vitrines de excelência da mesa nacional e internacional, nos quais a adega é um elemento essencial e quase sempre muito rica. Por que não ser assim também na seção dos destilados?
Um exemplo está relacionado ao vinho francês. Para o champagne são dedicadas páginas inteiras das cartas. Por que não fazer o mesmo com o conhaque? A razão seria econômica, já que se vendem copos de conhaque e garrafas de champagne?
Outros pontos sensíveis: o conhaque é quase sempre servido em copo baloon, sendo muito improvável o serviço em taça tulipa e, mais raro ainda, o serviço do brandy à mesa.
Deficiências injustificáveis quando o restaurante tem adega e chef renomados. Os críticos gastronômicos, no entanto, parecem não considerar estes itens – para nós, substanciais – em suas avaliações.
A cachaça nacional, então é sempre traída e maltratada, embora seja o nosso único recurso em termos de destilado. Se no exterior começam a valorizá-la, as cartas daqui ainda trazem quase sempre as mesmas marcas, de alguns poucos produtores.
Tudo isto me levar a concluir que os sommeliers precisam de mais qualificação em relação aos destilados. Talvez eles argumentem que não há demanda que justifique o esforço. Mas, sem estudo e pesquisa, como estes profissionais podem oferecer uma carta atraente que incentive a demanda?
Precisamos admitir que ainda estamos no meio das trevas em relação aos destilados.
(*) Sommelier e membro da Frente da Gastronomia Mineira