'A diretoria jogou a toalha cedo em 2005', diz Danrlei sobre pior ano da história do Atlético

Henrique André
24/05/2019 às 16:28.
Atualizado em 05/09/2021 às 18:48
 (Arquivo Hoje em Dia)

(Arquivo Hoje em Dia)

Com a camisa do Grêmio, Danrlei de Deus Hinterholz fez história e se tornou um dos atletas mais vitoriosos do clube gaúcho. Do início em 1993 até a despedida, em 2003, o ex-goleiro disputou 594 partidas e conquistou 21 taças; entre elas, cinco Estaduais, uma Libertadores, três Copas do Brasil, uma Recopa Sul-Americana e um Brasileirão.

Contudo, apesar dos altos e baixos no Tricolor, foi no Atlético que o hoje deputado federal pelo PSD do Rio Grande do Sul viveu o maior desafio da carreira. Contratado em 2004, quando defendia há poucos meses o Fluminense, Danrlei se tornou líder do grupo que, no ano seguinte, amargou o único rebaixamento do alvinegro para a Série B.

Nesta entrevista ao Hoje em Dia, o ex-jogador relembra as duas temporadas em que defendeu o Atlético, fala dos atrasos salariais e dificuldades para manter os jogadores focados no trabalho, afirma que Tite tinha todas as condições de ser campeão pelo clube se o cenário fosse diferente e diz que, para ele, a diretoria se precipitou ao já planejar o 2006, mesmo com o Brasileiro em andamento. Segundo Danrlei, a ordem de sacar os “medalhões” e iniciar as trocas por garotos da base desestabilizaram mais ainda o conturbado ambiente na Cidade do Galo.

Além disso, ele ainda recorda dos momentos de glórias pelo Grêmio, a importância de Luiz Felipe Scolari em sua vida, as passagens pela Seleção Brasileira e o sonho de voltar a trabalhar com o futebol.

Atlético e Grêmio se enfrentam neste fim de semana. Como você enxerga o momento das duas equipes?

Olha, não estou acompanhando tanto, mas os vi principalmente na Libertadores. Ambos com as mesmas dificuldades, mas o Grêmio tendo mais sucesso e se classificando e o Atlético, infelizmente não. Apesar dos bons nomes no grupo, não conseguiu encaixar e ficou de fora.
 

O que espera do jogo?

É um jogo complicado, principalmente para o Grêmio. O Atlético conseguiu se acertar, começou numa crescente no Brasileiro. O Grêmio, principalmente por colocar toda sua energia para se classificar na Libertadores, deixou o Brasileiro um pouco de lado e não conseguiu se encontrar. Vejo o Atlético com mais capacidade para conseguir o resultado. Porém, o Tricolor também precisa vencer, o que complicará a vida do Galo.

“Qualquer treinador em situações como esta (2005) não consegue manter o grupo unido. O Tite daquele tempo, era capaz de fazer um grande trabalho com aquele grupo do Galo. Podia ser o Guardiola ali”


Logo no seu segundo ano como titular do Grêmio, você conquistou a Copa do Brasil, no seguinte, a Libertadores e, em 1996, o Brasileirão. Como um jovem teve capacidade para assumir a bronca naquele momento, com tanta firmeza e estrela?

Muito é graças ao apoio que tive da direção e do treinador, que naquele momento era o Luiz Felipe Scolari, principalmente no início. Entrei direto no Campeonato Brasileiro. O Felipão me deu a segurança de poder jogar, me ajudou bastante nos erros também. O título da Copa do Brasil foi essencial para que eu pudesse me manter na equipe por 10 anos.

A Libertadores foi a cereja do bolo, né?

Certamente, você ganha a Copa do Brasil e depois é campeão da América e diretamente vai para outro patamar dentro do clube. Os atletas que ganharam a Libertadores pelo Atlético estão num patamar muito acima de todos os outros...

Em 1996, você viu de perto a eliminação da Seleção Brasileira para a Nigéria. O que lembra daquele dia?

Olha, cara. Lembro que estávamos até os 25 minutos do segundo tempo ganhando um jogo tranquilo. De repente, do nada, parece que deu um branco na nossa equipe. Íamos fazer a final contra a Argentina, contra quem já havíamos vencido no Pré-Olímpico. Já estávamos pensando na decisão. Teve o gol de ouro que, para mim, é uma grande injustiça. Não acreditamos naquilo.

 Arquivo Pessoal 

 Foi um aprendizado após tantas glórias?

A gente não gosta de perder, mas tem que aprender também com as derrotas. Temos que ficar ligados os 90 minutos, como era no Grêmio. Foi uma das maiores seleções olímpicas que o Brasil conseguiu montar. Em 20 minutos de apagão perdemos a chance de conquistar aquela medalha inédita.

Em 2004 você foi para o Fluminense e, em seguida, para o Atlético. Como foi a chegada ao clube mineiro? Lembra das negociações?

Eu sei que a minha multa rescisória não era muito alta. O Atlético ficou sabendo, viu que eu estava fazendo um bom início de temporada lá, e tomou a decisão de me contratar. Entraram em contato com meu empresário, fizeram uma oferta a qual o Fluminense não quis ou não conseguir bater e, naquele momento, a pedido do Bonamigo, fui para o Atlético. 
 

E o Atlético honrou com os vencimentos?

Naquele ano sim. O clube tinha dificuldades com todo o grupo, mas mesmo assim conseguiram se superar. No outro ano, que a gente acreditava que as coisas fossem melhorar, infelizmente pioraram muito. O Ricardo Guimarães ajudou muito o clube, financeiramente, mas chegou num momento não conseguiu mais. Muitos atletas poderiam ter deixado o clube por causa dos atrasos. O segundo semestre de 2005 foi muito complicado. Eu, como capitão, tentava segurar o grupo inteiro, tive um dos momentos de maior aprendizado. 
 

Isso foi o que mais pesou para o rebaixamento no Brasileirão de 2005?
Ah! Com certeza. Foi um dos principais motivos. Alguns atletas não queriam ir mais trabalhar. Todos têm contas a pagar e nem todos ganhavam bem. Muita meninada do júnior subindo, que dependia daquele valor. Manter o foco naquele momento era complicado. Promessas não cumpridas com os atletas e com outros funcionários.. Uma coisa vai levando a outra e tirando o foco dos atletas. 

“O Felipão me deu a segurança de poder jogar e me ajudou bastante nos erros também. O título da Copa do Brasil (1994) foi essencial para que eu pudesse me manter na equipe do Grêmio por 10 anos”

 Como você analisa o Tite naquele time do Atlético?

A mesma resposta que eu dei como capitão, posso usar para o treinador. Imagina o quão difícil seja focar o seu time naquela situação? Se o atleta chega atrasado, como você vai multá-lo se ele não recebe? Não tem como manter o grupo fechado e focado pois não havia justificativa para nada. O único lugar que o Tite não obteve sucesso foi lá, naquele momento. Qualquer treinador em situações como esta não consegue manter o grupo fechado e unido. O Tite daquele tempo, com quem eu já havia trabalhado no Grêmio em 2001, era totalmente capaz de fazer um grande trabalho com aquele grupo, que era muito bom. Podia ser o Guardiola ali. Se tivessem honrado tudo no final, já não daria mais tempo para reverter. Outra coisa que lembro do clube é que naqueles últimos quatro meses, o clube parecia que, antes de nós, já havia largado a toalha quanto ao ano. Muito antes da hora, começaram a planejar o ano seguinte com a base. Mandavam colocar os meninos da base. A gente jogando o Brasileiro, ainda com capacidade de ficar na Série A, mesmo com todas as dificuldades, mas vendo o clube fazendo o planejamento para o ano seguinte apenas com a base. Foi uma escolha da direção, que tinha todo o direito de tomar aquelas decisões. Eu, particularmente, achei que era muito cedo.

Há 10 anos, o trágico acidente vitimou vários jogadores do Brasil de Pelotas, time que você defendia na época. Foi o momento mais triste da sua carreira? 

Não tem jeito. Qualquer tragédia, não tem como ser diferente. Ali eu já estava fazendo meus cursos de gestão e começando a transição para terminar minha carreira como atleta e seguir numa nova caminhada da minha vida. Ali eu fui para um projeto a pedido do treinador que era meu amigo. Ninguém imagina. A tristeza foi tanta que eu decidi dar um tempo no futebol e ficar longe um pouco. Foi aí que eu decidi que eu ia fazer outra coisa e apareceu esta oportundidade de fazer algo pelo esporte como parlamentar. E deu certo. 

Você pensa em voltar para o futebol?

Sim. Eu volto para o futebol. Estou fazendo todo um planejamento para a minha vida para voltar ao futebol. Vou fazer o curso de treinador da CBF e um outro de gestão. Com a experiência que tenho trabalhando aqui na comissão de esportes, com o conhecimento da gestão em si, e com os 22 anos como jogador - nisso ninguém me engana, pois foi minha vida -, vejo que foi tudo muito positivo. Sou jovem, estou com 46 anos apenas, tenho muito tempo ainda no futebol e só sei que irei voltar. 

Você fez vários duelos entre as duas equipes pelos dois lados. Qual o jogo mais marcante?

Tem um que para mim foi importantíssimo. Se a gente tivesse passado do Atlético, poderíamos ser campeões brasileiros. Não me lembro bem o ano, mas tinha o Guilherme. Creio que foi em 2001. 
 

Renato Gaúcho é um dos melhores do país hoje? Chegará à Seleção?
O Renato está fazendo um dos melhores trabalhos no Brasil, até pelo tempo que está no Grêmio. É muito competente. Acho que tem capacidade sim para ir à Seleção. Vai depender do Tite e dos resultados, né? (Risos).

Danrlei sempre foi conhecido pelo temperamento forte. Se arrepende de algumas brigas que comprou e das agressões aos árbitros Walter Rial, Marcelo Tofanello e Luiz Carlos Silva? Vai levar este espírito caso volte ao futebol como treinador?

Eu seria eu mesmo. Sempre fui um atleta que briguei pela camisa que vesti e lutei para ganhar. Aqueles que trabalharam comigo sabe o quanto sempre fui atleta do grupo. Sempre estarei do lado da minha equipe, até para demonstrar que o comandante deles estará ao lado nos momentos bons e ruins. Não conheço outro formato para mim. Se o chefe não mostrar o comprometimento, porque os liderados terão o mesmo. Os atletas têm que acreditar em ti. O Renato está mostrando isso. Liderança tu não compra; tu conquista. Me tornei capitão no Atlético porque os atletas assim quiseram. Foi uma decisão em conjunto. 

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