Na face branca e preta da lua - Crônica de Roberto Drummond sobre o título

Wallace Graciano - Do Portal HD
22/09/2012 às 19:27.
Atualizado em 22/11/2021 às 01:30
 (Guinaldo Nicolaevsky)

(Guinaldo Nicolaevsky)

Dois dias após a conquista do primeiro título internacional do Atlético, o escritor Roberto Drummond nos brindou com mais de uma suas crônicas que eleva ao máximo o sentimento pelo seu clube do coração.

 

Na face branca e preta da lua

 

Escrevo diretamente de uma cidade feliz. Imaginem um disco voador (que uma vez eu vi um) sobrevoando nossas cabeças e nossos corações.

Ah, o que pensaria um ET, ocupante do disco voador sobre tanta alegria?

Pensaria que descobrimos a fórmula da felicidade?

Pensaria que aqui fica o paraíso?

Pensaria que um novo regime político nasceu às margens da Serra do Curral?

Ao ET eu faria um convite: venha comigo que eu vou ser seu cicerone na cidade da alegria, também conhecida como Belo Horizonte.

Se o ET quisesse saber a razão de tanta felicidade entre pobres e ricos.

Entre os que moram nos palacetes e os que habitam as favelas.

Entre os que fazem a festa nos apartamentos e os que festejam debaixo dos viadutos e das pontes.

Entre crianças e os velhos de todas as idades.

Entre homens e mulheres.

Entre jovens que acabam de chegar aos 15 anos de maduros cinquentões.

Se o ET me perguntasse:

Acaso vocês fundiram as conquistas da social democracia da Suécia e o que o trabalhismo fez de bom na Inglaterra e que nem Margareth Tatcher conseguiu destruir com sua mão de ferro, com a alegria dos trópicos?

Se o ET perguntasse assim eu haveria de dizer: meu caro amigo que veio de longe, que veio de Marte ou veio de Vênus, devo informar que, por enquanto, ainda não resolvemos os problemas sociais do Brasil. Você está vendo: tem gente morando debaixo dos viadutos. Tem gente que faz mágica de viver com o salário mínimo. Tem gente que trabalha e que molha o rosto com suor honesto e não tem recompensa.

Não, meu caro ET, o Brasil ainda está cheio de problemas que, um dia, haveremos de resolver.

Nesse ponto, vendo alegria na cidade.

Vendo os foguetes estourando no céu de Belo Horizonte.

Vendo o povo, de camisa preta e branca, carregando bandeiras da mesma cor, e dançando.

Vendo automóveis em carreata com ocupantes que, no mesmo embalo, gritam “Galôôô campeão” e “Fora Collor!”.

Vendo tudo isso, sem entender nada destes mistérios tropicais, o ET diria:

_ Eu não posso acreditar no que vejo. Se o Brasil não resolveu seus graves problemas, então porque acontece essa explosão de alegria?

_ Eu vou responder, meu estimado ET. O que está acontecendo, nesta cidade que passou a noite cantando e comemorando, é uma dupla festa.

_ Mas dupla festa, como – pergunta o ET.

_ Dupla festa, meu caro ET, porque a cidade que ama o Atlético, que é uma paixão coletiva, festeja não apenas a conquista da Copa Conmebol pelo time dirigido pelo técnico Procópio._ Mas o Atlético não perdeu para o Olímpia, em Assunção? – apartou o ET.

_ Perdeu, sim, bravo ET, mas ele podia perder, porque venceu no Mineirão por 2 a 0, no primeiro jogo. Então, os atleticanos comemoram a conquista do primeiro título internacional pelo Atlético. Há muito tempo, desde 1971, quando foi campeão brasileiro, o Atlético não dá à sua torcida uma alegria tão grande. E como se não bastasse, ET, a torcida do Atlético comemora também a goleada de 6 a 3, no Supremo Tribunal Federal, a favor do julgamento do “impeachment” do presidente Collor, pelo voto aberto e sem dar novo prazo para defesa.

_ Ah, estou começando a entender – diz o ET. – Mas só não estou entendendo porque a torcida do Cruzeiro, que você apelidou de China Azul, também está em festa. Acaso os cruzeirenses estão comemorando a grande conquista do Atlético, em Assunção?

_Não, não, ET velho de guerra. A China Azul comemora apenas a goleada do STF, está entendendo?

_ Não, não estou entendendo, não – fala o ET. – Esta cidade de vocês é muito estranha. Mas quem falou que a alegria precisa ser explicada? A alegria precisa ser vivida.

_ É isso mesmo. É tempo de alegria, ET. E, se você olhar a lua, não se surpreenda se vê-la branca e preta. E nem se surpreenda se, até na face da luta, estiver escrito: - Fora Collor! 

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