De volta do Japão, Cerezo fala da carreira, da seleção e do jogo deste domingo

Henrique André e Felippe Drummond Neto - Hoje em Dia
Hoje em Dia - Belo Horizonte
13/09/2015 às 11:21.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:44
 (Ricardo Bastos / Hoje em Dia)

(Ricardo Bastos / Hoje em Dia)

Há três semanas, Toninho Cerezo encerrou um ciclo no Japão – com o fim do contrato com o Kashima Antlers, o qual treinava desde 2013 – e retornou para ficar mais perto da família e dos amigos. Hoje, ele estará no Mineirão para acompanhar o clássico entre Cruzeiro e Atlético e matar saudade de um duelo no qual fez história nas décadas de 1970, 80 e 90 – atuou pelas duas equipes.   Aos 60 anos, o belo-horizontino recebeu a reportagem do Hoje em Dia no apartamento que tem no bairro Belvedere, próximo ao BH Shopping, para uma entrevista exclusiva, na qual lamentou o fim das torcidas divididas no clássico, revelou planos de futuro para a carreira, analisou o momento do futebol brasileiro e até foi às lágrimas – em momentos de intervalo do bate-papo, nos quais revelou estar fazendo terapia e que se emociona ao relembrar o passado.   Você voltou há poucos dias do Japão e, além de BH, já viajou à Bahia e São Paulo. É apenas a passeio ou são também assuntos profissionais? Voltei tem três semanas para o Brasil. Fiquei dois anos e meio fora. Agora, então, estou viajando para rever amigos e para conhecer lugares. Os dias passaram igual um foguete.   Quais são os planos de momento para a carreira? Pretende assumir um clube brasileiro como treinador? Eu vivo disso. Pretendo na próxima temporada assumir algum time, seja ele pequeno, médio ou grande. Tenho um mercado muito bom na Ásia também. Tenho que trabalhar e não posso ficar parado.   Você é treinador há 16 anos, mas no Brasil se firmou apenas no Vitória, em 1999. Por quê? Faltou oportunidade em um clube maior ou existe algum outro motivo? Aqui no Brasil para você trabalhar, você tem que se enquadrar em determinados esquemas que não fazem o meu perfil. Não desejo a ninguém ser treinador por aqui. É melhor ser jogador. (risos)   Quais são os esquemas? Ah, todo mundo sabe quais. Não preciso falar.   Em 1999 e em 2005, você treinou o Atlético. Quais lembranças tem? No Atlético foi praticamente uma imposição na época. Eu era um diretor e com a saída do treinador pediram para eu assumir. Eu estava começando a minha carreira. Do outro lado tinha um grande clube, o Cruzeiro, que ganhou o campeonato; o que é mais que normal. Não tem mágoa nenhuma.   Marcelo Oliveira, cria do Atlético, fez história no Cruzeiro, agora como técnico. Gostaria de treinar o Cruzeiro um dia ou tem vontade de ter nova chance no Galo? Não tenho essa ilusão. Pelos anos todos que o Marcelo trabalhou nas categorias de base e no profissional, acabou sendo coroado com dois títulos brasileiros no Cruzeiro. Depois que o cara ganha tudo isso ainda é contestado. Eu sinceramente não entendo como funciona. Vai tudo de resultado. Hoje em dia até os treinadores das categorias de base se não ganharem são mandados embora. É o cúmulo.   Levir Culpi costuma dizer que voltou do Japão muito mudado como cidadão e como profissional. E você como voltou de lá? Eu só aprendi com eles. Lá tudo funciona. São mais frios que os europeus em si, em relação ao sentimento, mas são muito profissionais. Daquilo que conheci do Levir, hoje no Glorioso (Atlético), sei que ele fala muita coisa com grande autoridade. Lá fora você tem um aprendizado e principalmente um respeito muito grande.   Ao ter como parâmetro um país civilizado e desenvolvido como o Japão, o que mais incomoda você no Brasil? No Brasil você assume um pacote. Você vira o técnico e já é burro, filho da p.... Tem que ter um assessor de imprensa muito bom, tem que ler na cartilha do diretor esportivo, senão você não vai ficar. Dependendo do caráter da pessoa, ela não vai suportar ou se adaptar bem.   A crise política e econômica que o Brasil está vivendo afeta a percepção dos japoneses sobre o país ou esse tipo de notícia nem repercute muito por lá? Eles têm uma visão muito grande do Brasil, pois eles tem uma das maiores colônias aqui (São Paulo). Eles não conseguem entender porque estão alguns anos na nossa frente. É um povo que se acostumou a reconstruir o país após terremotos. São muito unidos e a briga pela sobrevivência faz com que eles, no que se trata de política, sejam honestos. Querem ver a população bem e o futuro dos filhos encaminhado.   Esperava-se muito da seleção japonesa após a era Zico, a partir dos anos 90, mas o fato é que o futebol do Japão nunca conseguiu dar um passo adiante e virar uma força. Por quê? O Zico me indicou no Kashima. O beisebol sempre foi o esporte número 1 por lá, mas foi superado pelo futebol. Eles têm duas prioridades nas escolas: matemática e educação física. O problema é que o atleta quando sai da universidade, com 21 ou 22 anos, ele não está pronto para enfrentar uma competição de alto nível. Só aí começa a educação e lapidação das partes técnica e tática. Eles estão passando um processo de adaptação de ter que saber usar o corpo nas divididas e trabalhar mais a bola parada. Eles estão aprimorando e evoluindo. Isso é virtude dos brasileiros que foram para lá.   E quanto à Seleção Brasileira? Como o Japão, a Ásia e o mundo a têm visto após o 7 a 1 de 2014? Perdemos prestígio? Quase todos os times de ponta da Europa tem um toque brasileiro. Em relação ao futebol brasileiro, vejo bons jogos, mas todos muito truncados e às vezes de pouca técnica, mas a gente vai se adaptando às coisas. Hoje o futebol é diferente do passado. Para o atacante chegar ao gol hoje, você precisa de um time muito técnico, com um trabalho pelas laterais, porque o meio está sempre muito embolado.   O Dunga é um crítico do culto à Seleção de 82, da qual você fazia parte. Ele sente que a Seleção de 1994, que foi campeã, não tem a mesma valorização da de 82, que não ganhou a Copa. Como vê isso? Eu não vi nenhuma Seleção Brasileira ruim. A do ano passado, por exemplo, não era ruim. O time da Alemanha que era muito bom. Se a gente for analisar assim, como ele, a Holanda perdeu duas finais. E quem ia falar mal dela? Você ia falar mal do Cruyff? São coisas do futebol.   No seu tempo de jogador, os clássicos tinham torcida dividida meio a meio no Mineirão. Hoje, é 90% de uma e apenas 10% de outra, quando não é de torcida única. O que acha disso? Esse pra mim é um dos maiores absurdos do futebol. Tudo por culpa da impunidade. Uma das coisas mais lindas que eu via (nos clássicos) era quando tinha a torcida do Cruzeiro do outro lado, dividindo a festa com a do Atlético. Se não tem, a emoção em campo é outra. O futebol no mundo todo deveria ser para a família, para o lazer. A coisa mais linda para mim era ver o Mineirão balançar com a festa das duas torcidas. Se tivesse fiscalização forte e punição, acabaria o problema.   E quanto ao clássico deste domingo? Dê o seu palpite. Clássico sempre foi jogo aberto. Hoje o Cruzeiro está com um treinador novo (Mano Menezes), e o time do Atlético está no páreo pelo título. Difícil palpitar.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por