“Dizer que Spider tem canela de vidro é ignorar a sua história”

Felippe Drummond Neto
Hoje em Dia - Belo Horizonte
25/01/2015 às 11:47.
Atualizado em 18/11/2021 às 05:47
 (Alexandre Loureiro/ Inovafoto/UFC)

(Alexandre Loureiro/ Inovafoto/UFC)

O carioca Rafael dos Anjos, de 30 anos, tem a chance de se tornar o primeiro brasileiro a se tornar campeão dos pesos leves (até 71kg) na história do UFC. Para isso, ele terá de derrotar o americano Anthony Pettis, detentor do cinturão da categoria, no dia 14 de Março, no UFC 185. Oriundo do jiu-jitsu, o lutador, que alcançou a faixa preta nos tempos em que morava em Belo Horizonte, concedeu entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, por telefone.   O que você pensa a respeito do Anthony Pettis? É um excelente lutador, que atravessa uma ótima fase na carreira. Além disso, ele é muito criativo, mas chegou a minha vez de fazer a fila andar. Estou muito confiante que vou conseguir tirar o cinturão dele, pelos acontecimentos recentes da minha carreira, e tenho certeza de que serei o primeiro brasileiro campeão dos pesos leves na história do UFC.    Apesar de ser o seu rival, ele sempre fala que você não vinha tendo a atenção que merece. Concorda? Concordo com as declarações dele. Não sou um lutador que caiu de paraquedas no UFC, tenho uma história dentro e fora da organização. Ao todo, já fiz 30 lutas como profissional, sendo 17 delas dentro do Ultimate, além disso ganhei oito dos últimos nove combates que fiz. Sou um cara que está conquistando o próprio espaço fazendo por onde, não falando, como alguns.   O Pettis normalmente aceita lutar onde o adversário é melhor, você acredita que ele vai se arriscar no Jiu-jitsu contra você? Ainda é um pouco complicado falar sobre a luta, já que ela só vai acontecer em março. O que posso garantir é que estarei preparado para todas as situações para buscar o título, mas se ele achar que deve levar a luta para onde o adversário é melhor, eu vou gostar.   Com as suas apresentações recentes, contra o Ben Henderson e o Nate Diaz, cresceu a expectativa para uma luta empolgante, de muita trocação entre você e o Pettis. Concorda ou vai tentar controlar a luta? Também espero isso. Mas o que mais me anima é que pela primeira vez estou vendo esses comentários a meu respeito. Em todas as minhas lutas anteriores, até me entristeço um pouco, os próprios brasileiros não confiavam em mim, e dessa vez é diferente. Muitos fãs estão apostando em mim e postando mensagens nas redes sociais falando que eu vou ganhar. Isso é muito bom, pois sabemos o quanto é difícil a vida de todo atleta brasileiro, que precisa sair de baixo para chegar neste nível que estou hoje. Por isso, sempre torço pros atletas de qualquer modalidade, pois sei da dificuldade que enfrentamos no Brasil para ter apoio.   Qual a luta mais difícil da sua carreira? Com certeza, a minha luta mais complicada foi contra o Clay Guida. Machuquei seriamente com um minuto de luta e mesmo assim consegui levar até o terceiro round, mas infelizmente acabei perdendo.    Muitos acharam que você tinha sido colocado como escada para o Ben Henderson, mas você acabou roubando a cena.  Como foi essa luta? Eu cheguei muito bem naquela luta, muito feliz por fazer a luta principal pela primeira vez e foi uma luta que se tornou o divisor de águas na minha carreira. Ele era considerado o desafiante número um e eu ganhei dele daquela forma, com um nocaute relâmpago ainda no primeiro round. Nunca ninguém havia nocauteado ele e eu fui o primeiro. Quando eu tenho grandes desafios eu cresço, e a luta contra o Pettis não vai ser diferente.   Caso você conquiste o cinturão, sua próxima luta pode ser contra o russo Khabib Nurmagumedov, que foi o último a te derrotar. Você pensa em vingar aquela derrota? Seria muito legal poder enfrentá-lo com o cinturão, mas meu foco, agora, é todo no Pettis. O Khabib é um lutador muito novo (26 anos), tenho certeza de que ainda vamos nos encontrar novamente. Ele é um grande lutador que ainda está invicto na carreira, com 22 vitórias, mas ainda falta enfrentar grandes nomes do MMA. Afinal, a única vitória expressiva que ele possui contra um adversário renomado foi contra mim. Além disso, esse tempo que ele ficou parado, por conta de lesões, o fez perder alguns degraus que ele terá que recuperar. Atualmente, acho que para ele voltar a ser um desafiante ao título será preciso duas vitórias, já que nessa categoria tem o Ben Henderson e o Donald Cerrone que estão na frente.    Você é um lutador que sempre se mostrou confiante para as lutas. De onde vem tanta inspiração? Eu treino muito duro, e acho que isso facilita na hora que subo no octógono. Lá na Kings MMA temos uma das melhores equipes que nos prepara muito bem, tanto que acho os treinos mais difíceis que minhas lutas. Além disso, por ser muito religioso, sempre coloco Deus na frente de tudo e acredito que Ele prepara o caminho para a gente passar. E por Ele ter me dado essa oportunidade de lutar pelo cinturão, estou tranquilo para o que acontecer.    Até 2013 você era considerado um lutador unidimensional, que tinha só o jiu-jitsu como ponto forte, e no ano passado você apresentou uma evolução grande na trocação. De onde veio isso? Sempre gostei de treinar os meus pontos fracos. Sou um atleta que começou jiu-jitsu e é normal eu ter tido mais dificuldade na luta em pé, mas desde que me mudei para os Estados Unidos, há três anos, tenho treinado muito com o Rafael Cordeiro , que me ajuda bastante com o muay thai, que tem me ajudado muito a evoluir.   Você treinou aqui em Belo Horizonte por quanto tempo? Morei em Belo Horizonte por seis anos, inclusive me tornei faixa preta de jiu-jitsu com o mestre Aldo Caveirinha. Qual é a sua relação com a cidade hoje? Você ainda vem muito pra cá?   Quase sempre que vou ao Brasil dou uma passada em BH. Meu pai mora na cidade e meus melhores amigos são daí. Além disso, conheço muita gente que me apoia e torce por mim, e sinto saudade da cidade. Como está a preparação para a grande luta contra Anthony Pettis? Já estou treinando há três semanas com o foco nele, porque na verdade eu não paro de treinar. Após a minha última luta (contra Nate Diaz, em 13 de dezembro de 2014), eu dei uma passada no Brasil e depois voltei para a academia. Mas sei que é uma luta que eu tenho que ter cuidado na preparação para não me machucar, afinal será minha quinta luta em apenas 11 meses. Eu já estou em um ritmo muito forte e só preciso entrar em forma e definir a estratégia que vou usar no dia   Você tem treinado mais em alguma área para esse combate? Nessas semanas iniciais eu tenho feito as coisas que eu mais gosto de treinar, sem exagerar para não sofrer quando chegar mais perto da luta. Estou evitando pegar muito pesado para não saturar e eu não começar a ir treinar sem vontade, encarando aquilo como trabalho. Apesar de ser um lutador profissional, eu gosto do que eu faço. Por enquanto estou treinando boxe e muay thai de forma mais relaxada, fazendo manopla e algumas  combinações, e no jiu-jitsu ainda estou treinando com quimono.   Quais os treinadores que vão te ajudar na sua preparação? Cheguei até aqui treinando com eles e mantive os mesmos. O Rafael Cordeiro no muay thai e no MMA; o Roberto Gordo no jiu-jitsu e no MMA também; o Philipe Della Monica, que é de Belo Horizonte e também me ajuda com o jiu-jitsu; e o Beneil Dariush, que também é lutador do meu peso no UFC e me ajuda como sparring.   Como você gosta de fazer sua preparação? Um tempo perfeito quando estou sem uma luta marcada são 12 semanas, mas no ritmo que eu estou, as 10 semanas que recebi para me preparar são perfeitas.    Como você vê o atual momento do MMA brasileiro, que, após o ápice, com cinturões simultâneos de Anderson Silva, Junior Cigano e José Aldo, agora busca recuperar os títulos no UFC? Após um ano que não foi tão bom, estamos novamente em uma crescente dentro do UFC, mas no geral ainda falta incentivo aos eventos nacionais que poderiam pagar um pouco melhor aos lutadores. Mas está cada vez melhor e os lutadores que estão chegando agora vão pegar uma das melhores fases deste esporte.    Como você viu o episódio de Jon Jones, que foi pego no doping com cocaína? O Jon Jones é um lutador que não perde para ninguém, o único que pode derrotá-lo é ele mesmo. Quando fiquei sabendo da notícia, do envolvimento dele com cocaína, fiquei triste por ele. Ele ficou exposto de uma maneira ruim.    Maconha e cocaína são assuntos recorrentes no universo do UFC. As drogas estão tão próximas assim dos lutadores? Você acha que esses casos podem afetar a credibilidade e a reputação do UFC? Não acho que se limita apenas aos lutadores. As drogas estão ao alcance de todo mundo, ainda mais dos atletas que todo mundo tenta se aproximar. Não acho que isso possa afetar a imagem do evento, porque são problemas que estão sujeitos a acontecer em todas as áreas. Já tivemos casos semelhantes com jogadores de futebol, basquete, nadadores e outros esportistas, e isso não pode ser generalizado. Acho que isso afeta apenas o Jon Jones e não o UFC.   Anderson Silva é considerado por muitos o melhor lutador do MMA em todos os tempos. Você concorda? Eu também acho que ele é o melhor de todos os tempos. O que ele já fez no MMA não pode ser esquecido, é algo muito difícil. O problema é que a maioria das pessoas tem uma memória muito curta e só lembra dos lutadores pela última performance. E neste caso o MMA foi muito ingrato com Anderson. Ouvi muitas brincadeiras de mau gosto falando que ele tem a canela de vidro, isso mostra que estão ignorando o que ele já fez. E pra mim ele é o melhor de todos os tempos, sim.   Você acredita que ele dará a volta por cima, mesmo com quase 40 anos? Acha que ele tem condição de recuperar o cinturão? O Anderson é um cara que ninguém pode duvidar dele. Acho que ele tem condição, sim, de recuperar o cinturão. Apesar da idade, ele é um lutador que sempre se cuidou, treina da forma certa, não apanha muito nos treinos nem nas lutas. É um cara que não toma muitos golpes na cabeça e isso ajuda a prolongar a carreira.   E quanto ao esperado duelo entre Weidman e Belfort, em 28 de fevereiro? Qual é a sua aposta? Sempre torço pelos brasileiros. São dois lutadores casca-grossa, mas depende da forma como a luta vai se desenvolver. O Vitor é um lutador que pressiona muito no início da luta, onde ele é muito perigoso, mas é uma luta bem parelha. Se fosse analisar como números, acho que o favoritismo é do Weidman (60% a 40%), já que as chances do Vitor são nos dois primeiros rounds; passando disso, acho que complica para ele.   Você e o Werdum têm uma história parecida. Os dois são oriundos do jiu-jitsu e tem o Rafael Cordeiro como mestre. Qual é a sua relação com ele? E você acha que também chegou a sua vez de brilhar? Somos muito amigos, sempre treinamos juntos aqui nos Estados Unidos. Fiquei muito feliz quando ele conseguiu realizar o sonho de conquistar o cinturão. E quando ele chegou com o cinturão lá na academia ele falou comigo que eu seria o próximo.

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