Duas Fernandas, a mesma idade e um mesmo rótulo: as competentes do futebol masculino

Henrique André
hcarmo@hojeemdia.com.br
08/03/2018 às 15:20.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:45
 (Felipe Carneiro/RBS; Reprodução/Instagram)

(Felipe Carneiro/RBS; Reprodução/Instagram)

O título desta matéria poderia ter o adjetivo 'musa', rótulo que muitas mulheres recebem quando encaram de perto o mundo do futebol masculino. Contudo, respeitando o que de fato importa, preferimos fugir deste cliché. 

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 "Ganhar o rótulo de musa não é incômodo nenhum. O incômodo é quando o  rótulo se torna mais importante do que a competência". É desta forma que a ex-auxiliar de arbitragem Fernanda Colombo define o sentimento da mulher que se arrisca no mundo do futebol masculino.

A catarinense de 26 anos chegou a trabalhar em mais de 50 partidas oficiais, mas decidiu pendurar a bandeira para se especializar no jornalismo esportivo. Em Minas, inclusive, guarda na memória um clássico entre Atlético e Cruzeiro no qual foi a principal notícia.

Bastante criticada ao marcar impedimento inexistente da Raposa diante o Galo, em 2014, ouviu de Alexandre Mattos, até então diretor de futebol do clube celeste, que fosse posar para a revista masculina "Playboy" pois não estaria preparada para exercer a função de assistente.

 "É uma decepção. O machismo, que tantas vezes é escondido, aparece escancarado", diz Fernanda ao Hoje em Dia

"A mulher no futebol já é uma realidade. Só precisam de oportunidades para mostrar a competência", acrescenta a ex-auxiliar, que chegou a ser aspirante ao quadro da Fifa.

Questionada sobre o peso dado aos gêneros (masculino e feminino), Colombo afirma que a mulher chama mais atenção no meio da bola, principalmente por não ser algo tão comum.

"Para mim, a maior diferença mesmo é a maneira como expressam a irritação com o erro. Com as mulheres apelam para frases machistas. Infelizmente, a cultura do futebol é xingar sempre a equipe de arbitragem, sem se importar com o gênero", comenta.

Empenhada nos novos projetos de vida, a futura jornalista - nada de musa do jornalismo! - prepara o lançamento de um livro sobre regras do futebol voltado para o público infantil. A expectativa é que a obra, em fase de desenvolvimento da estrutura e ilustração, comece a ser comercializada antes da Copa do Mundo.Reprodução/Facebook 

 A competente de Minas Gerais

Ao contrário da catarinense, Fernanda Nandrea, também de 26 anos, segue firme e forte  na arbirtragem. A auxiliar, que atualmente faz parte do quadro da Federação Mineira de Futebol (FMF), também encarou de frente o desafio de lidar com o machismo e o desafio do gênero.

Fernanda, mesmo antes de saber da existência de um curso para arbitragem, começou seu caminho apitando uma partida para o pai e amigos, em uma quadra society. A atuação foi tão boa que ela recebeu incentivo de todos para se profissionalizar. Formada em 2011 no curso da Federação Mineira de Futebol (FMF), ela também precisou lidar com os rótulos.

"Acredito que nada impeça uma mulher de ser bonita e, ao mesmo tempo, ser competente. Os elogios à característica física são engrandecedores, mas exaltar o trabalho realizado por essas 'musas' é tão engrandecedor quanto, talvez até mais importante e motivador. As mulheres ganham e se mantém em seu espaço pelo seu trabalho, e não pela beleza, ou pelo menos deveria ser assim", opina.

Perguntada sobre alguma história marcante com atitudes machistas, ela destaca uma envolvendo um próprio companheiro de apito.

"Lembro que, bem no início da carreira, dentro da equipe de arbitragem, recebi um comentário dizendo 'me acompanha nas marcações, o que eu fizer você aponta, deixa comigo'. Não sei se era por ser iniciante, ou por ser mulher, ou até mesmo pelos dois", destaca Nandrea.

Sobre os elogios desrespeitosos e xingamentos além da conta, ela diz que já se acostumou. E curiosamente, eles vêm até de mulheres.

"Ouço de tudo! O que você quiser imaginar, de cantadas a palavrões e expressões de baixo calão. Posso errar, até mesmo acertar, que irão xingar e reclamar. Inclusive ouço isso de mulheres também", conta a auxiliar.

"Fora dos campos, as torcidas não se contentam ao falar pouco da arbitragem e principalmente das mulheres quando estão atuando, usando palavras e expressões machistas. Temos que ignorar e concentrar no jogo", conclui.Reprodução/Instagram 

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