'Estou atualizado para trabalhar no Brasil', afirma Lazaroni, técnico da Seleção da Copa de 1990

Henrique André
hcarmo@hojeemdia.com.br
08/06/2018 às 22:57.
Atualizado em 03/11/2021 às 03:30
 (Divulgação)

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Era junho de 1990, quando um passe milimétrico de Diego Maradona para Claudio Caniggia freou não só o sonho do tetracampeonato mundial da Seleção Brasileira, mas também a meteórica ascensão do técnico Sebastião Lazaroni, na época com 40 anos.

Apesar de ter comandado equipes importantes após a eliminação em solo italiano – como Fiorentina-ITA, Fenerbahçe-TUR, Grêmio e Botafogo –, o treinador precisou desbravar o mundo árabe para, enfim, ter trabalho duradouro. 

Aos 67 anos e ligado ao futebol moderno, como ele mesmo garante, Lazaroni aguarda um convite para trabalhar no Brasil e vê o objetivo como grande sonho; o último foi em 2005, no Juventude. 

Nesta entrevista ao Hoje em Dia, o ex-comandante da Seleção fala sobre a Copa de 1990, da conquista quatro anos depois, opina sobre o time de Tite e muito mais.CARLOS FENERICH/ESTADÃO CONTEÚDO

Um dos comandados de Lazaroni era Dunga, técnico do Brasil em 2010

 Existe algum ressentimento pelo episódio das vaias na Copa América de 1989? Como foi jogar em casa boicotado pela torcida baiana, irritada com a ausência do atacante Charles (Bahia)?

As dificuldades não estavam na torcida e sim no campo da Fonte Nova. Era um período chuvoso em Salvador e que nos trazia grandes dificuldades. Mas é sempre triste você ter que jogar sem o apoio da torcida. Não é fácil não, mas eu não guardo mágoa de nada.

Em 1990, o Brasil vivia um momento de virada de gerações. E você levou a base do tetra à Copa da Itália. Acha que a campanha ruim apaga esse papel importante que você teve?

Seleção é momento e é continuidade. Tem que ter um histórico e, para nós treinadores enquanto estamos no cargo, temos que ter uma resposta positiva quando solicitado para mostrar o trabalho na Seleção. É o que é importante para que abandone o atleta ou continue com ele. 

Passe de Maradona e conclusão de Caniggia à parte, o que faltou para o Brasil ir adiante na Itália e confirmar um título que boa parte daquela geração conseguiu quatro anos mais tarde?

Infelizmente tem aquela máxima do futebol de que “quem não faz, acaba levando”. Mas o nosso grande problema foram as lesões que antecederam o Mundial. Alguns atletas diminuíram as suas participações e não jogaram tanto assim; só foram estar em condições na Copa seguinte. Tudo serviu de base para superarmos e chegarmos ao título em 1994. O que se viveu em 1990 foi importante para isso.

Quem, dos lesionados, fez mais falta?

Infelizmente, teve o Aldair, que foi jogar a Liga dos Campeões da Europa pelo Benfica e voltou lesionado; o Romário, o Bebeto e o próprio Silas foram outros. Quando aconteceu agora com o Tite estas lesões eu até fiquei preocupado, porque vivi e com muita tristeza um período de dificuldades, que antecedeu a Copa de 1990. Romário quebrou a perna 45 dias antes do Mundial.

Com você no comando em 1990, Ricardo Teixeira era um recém-eleito presidente da CBF. Como era seu relacionamento com ele?

Era bom. Todos nós éramos jovens iniciando, cada um nas suas respectivas funções. Eu, Ricardo, Eurico (Miranda), Jorge Salgado e muitos jogadores. 

Você nasceu pouco depois de o Brasil perder a Copa de 1950. Assim, tinha menos de 40 anos no Mundial de 1990. Como foi assumir a Seleção ainda numa idade jovem?

Muita honra, satisfação e alegria. Apesar de bastante jovem, eu dirigindo a Seleção, acho que vivi um momento feliz, de resultados positivos, que foram a base para que eu fosse convidado. Na época que houve o convite feito por Ricardo Teixeira, Eduardo Viana e Eurico Miranda, que tinham acabado de chegar à Seleção.

Podemos pensar num treinador tão jovem assumindo a Seleção Brasileira atualmente?

Acho que tudo pode acontecer, depende do trabalho, do que se apresenta, dos resultados positivos. Somos muito ricos em qualidade de jogadores e também de treinadores. 

Muito se fala de Neto em 1990. Mas se você tivesse que refazer a convocação de 1990, qual jogador levaria?

Para o bem ou para o mal, você como técnico da Seleção vai deixar gente boa de fora. Temos uma abundância de bons jogadores, mas a lista é limitada a 23 atletas. Como exemplo pleno disso, será que o Arthur, o Luan, o Paquetá e o Paulinho não poderiam estar na lista do Tite? O atleta que você citou (Neto), foi testado antes, mas não produziu oportunidades para ele mesmo para ser convocado. Não é apenas o treinador. O atleta tem que mostrar capacidade.

Dos campeões mundiais de 1994, dez haviam estado contigo na Itália. Com que olhos você observou o Mundial dos EUA?

Com muito orgulho e alegria. Sou apaixonado pelo futebol brasileiro e um torcedor. Mostrei que nós estávamos no caminho certo.Arquivo Hoje em Dia

Lazaroni é apresentado por Ricardo Teixeira como treinador da Seleção

Exceto por uma breve passagem pelo Juventude, em 2015, você trabalhou apenas no exterior nos últimos 17 anos. Houve uma desilusão de sua parte em trabalhar no futebol brasileiro? Pensa em assumir alguma equipe brasileira antes de se aposentar?

É um sonho que acalento. Como estou com saúde, energia e atualizado, penso estar em serviço. É claro que aquele resultado negativo de 90, e eu ter saído em situação de trabalho para o exterior, impediram muitas vezes de, com frieza e qualidade, fazer uma análise do meu trabalho frente à Seleção, que pudesse proporcionar novos convites para dirigir equipes no futebol brasileiro. Espero que isso possa acontecer. Me sinto bastante capaz.

Um de seus comandados em 1990, Dunga se tornou treinador anos depois. Via potencial nele já naquela época? Por que está fora do mercado da bola?

Quando se perde, alguns pagam uma conta mais alta que outros. O Dunga sempre foi um líder em campo, jogador de muita personalidade. Aconteceu a transformação natural da sua carreira de dentro para fora do campo. Assim como o Silas, o Jorginho e o Ricardo Gomes.

Como encara a Seleção de Tite? 

Estou vendo com bastante otimismo. Um momento muito feliz quando ele assumiu. Teve muita clareza na exposição das ideias e das escolhas. Engrenou bons resultados e uma forma de jogar agradável, sabendo suportar os momentos de pressão do adversário e dar a resposta em seguida, seja no talento ou na velocidade, dentro da técnica do futebol brasileiro. O Brasil é forte candidato ao título.

Vê a tão falada “Neymar-dependência?

Não. O sentimento e trabalho de equipe, com novos atletas ocupando o espaço de grandes jogadores. Não somos dependentes do Neymar, mas de todo bom jogador que tenha capacidade de servir e mostrar que pode defender a Seleção. Gabriel Jesus, Coutinho, Renato Augusto, Paulinho, Marcelo... Todos são atletas da escola brasileira e torço para que sejam vitoriosos neste Mundial.

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