Ex-jogador usa canal no Youtube para ensinar os fundamentos do futebol; assista

Estadão Conteúdo
15/05/2017 às 09:00.
Atualizado em 15/11/2021 às 14:33

A lista de materiais do treinador Christiano Falconi inclui bolas, cones, pinos, gols em miniatura, um tripé, uma câmera Sony Cibershot, dois aparelhos iPhone e um microfone de lapela. Pelo menos uma vez por semana, os treinamentos que ele dá na zona sul de São Paulo para alunos em início de carreira tem várias interrupções. Nessas pausas, ele imposta a voz, olha para a câmera e dá dicas de como bater na bola assim ou assado. São gravações para seu canal no YouTube, site de compartilhamento de vídeos na internet. Ele é um youtuber do futebol.

Além de conteúdos de gastronomia, artes, entretenimento, música, jogos e celebridades, que o transformaram em um capítulo à parte na cultura da internet, o YouTube também ensina a jogar futebol. O canal de Falconi, chamado "Eu treino fundamento", como o próprio nome indica, traz vídeos com dicas práticas e orientações sobre passe, drible, cabeceio e finalização, movimentos básicos da modalidade.

"O objetivo é estimular treinadores e jogadores a aperfeiçoar a parte técnica", disse o ex-lateral-direito que atuou em clubes como Bragantino, Portuguesa, Mixto-MT e Internacional, de Bebedouro (SP), em 10 anos de carreira, entre 1996 e 2006.

Futebol no YouTube ainda está no campo da inovação e Falconi é um dos pioneiros a ensinar futebol virtualmente. O técnico Valdir Espinosa, campeão mundial com o Grêmio, possui um canal para ensinar táticas e também dá dicas sobre posicionamento para os atletas. Zico alia histórias do futebol, conselhos técnicos e também entrevistas.

Por outro lado, vários canais ainda trazem apenas os chamados "tutoriais", neologismo usado em informática para ensinar o funcionamento de programas para usuários iniciantes.

Criado pelo jornalista e também ex-jogador Lucas Queiroz, o canal "Brazil Kickers", dirigido a jogadores amadores, é um dos mais vistos no segmento. "Procuro fazer lances que possam ser feitos nos jogos", disse o youtuber, que atuou apenas nas categorias de base. "Não sou o melhor jogador de futebol, mas sou um dos bons apresentadores do YouTube", afirmou.

As iniciativas, especialmente as páginas que ensinam fundamentos, preenchem uma lacuna no futebol brasileiro: a falta de treinos específicos para aperfeiçoar a técnica. "Nunca tive treinos técnicos. Fui mandado embora da usina de cana de açúcar e fui fazer um teste. Passei no profissional do CRB. Tive de aprender na raça", contou o ex-atacante Aloisio Chulapa.

Nos times profissionais, poucos clubes no Brasil ensinam o jogador a bater na bola ou adotar a posição correta para "matá-la" no peito. O ex-jogador Amoroso, hoje embaixador do Boca Ratón, clube norte-americano da quarta divisão, achou a iniciativa de ensinar fundamentos na internet tão importante que levou o próprio Falconi para conduzir a primeira clínica esportiva do clube no Brasil, realizado no mês passado, no hotel Bourbon Atibaia, em São Paulo. "Eu cresci com a técnica. No início da carreira, futebol não é só jogo. A técnica é mais importante que a tática ou físico", disse o ex-jogador do São Paulo.

Joshua, filho de Pelé, é um dos assinantes do "Eu treino fundamento". Jogando por uma universidade nos Estados Unidos, depois de passar pelas categorias de base do Santos, o atacante gravou até um vídeo para apoiar o canal. Cristiane e Andressa Alves, da seleção feminina, fizeram o mesmo.

Os canais dedicados ao futebol não têm a mesma visibilidade de outras áreas. O site Social Blade, responsável por mostrar estatísticas sobre YouTube, Instagram, Twitter e Twitch, aponta que o maior canal de YouTube do Brasil, em número de visualizações, pertence ao funkeiro Kondzilla, com 5,5 bilhões de views. Os maiores canais de futebol atraem 10% disso.

Pollyana Ferrari Teixeira, professora da Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP) e pesquisadora de Mídias Sociais, aposta no crescimento. "Esse desenvolvimento tardio se deve à grande influência das transmissões da tevê aberta. O futebol ainda possui estruturas tradicionais de comunicação, mas existe uma brecha que vai fazer o esporte explodir nas mídias sociais", disse a especialista. "O vídeo se consolidou como grande plataforma de comunicação em todas as áreas", completou.

Sem internet em casa, o meia Pedro Henrique Lourenço da Silva, que procura um clube para atuar, só consegue assistir aos vídeos na casa da tia. Aos 15 anos, ele conta que conseguiu melhorar a potência dos chutes só corrigindo a distância do corpo em relação à bola, dica que viu nos vídeos de fundamentos. Ele relata que, por isso, as visitas à casa da tia estão se tornando cada vez mais frequentes. 

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