'Falta estrutura para os clubes no Brasil', diz Duda Amorim

Henrique André
Hoje em Dia - Belo Horizonte
08/03/2015 às 10:22.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:16
 (Divulgação)

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Há três meses se recuperando de uma cirurgia no joelho esquerdo, a armadora Eduarda Amorim foi eleita no fim do mês passado a melhor jogadora de handebol do mundo em 2014. O título foi concedido pela Federação Internacional de Handebol, após votação popular via internet.

Campeã mundial com a Seleção Brasileira em 2013, Duda, de 28 anos, é a segunda do país a conseguir esse título individual. A primeira foi Alexandra Nascimento, eleita em 2012.

Em entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, a catarinense, nascida em Blumenau, conta como é a vida de melhor do mundo, compara a realidade do esporte no Brasil e na Europa e fala da expectativa sobre a participação da seleção na Olimpíada do Rio-2016.

A melhor jogadora de handebol do mundo é reconhecida nas ruas ou, em geral, passeia tranquilamente como uma anônima qualquer?

Aqui no Brasil não sou tão conhecida. Mas muita gente está sabendo. Fui num evento e alguns empresários sabiam que havíamos ganhado o último mundial. Sabiam que tinha uma melhor do mundo no grupo, mas não sabiam que era eu.

O curioso é que o handebol é um esporte muito praticado nas escolas em aulas de educação física, mas parece que fica só nisso. Por que não é um esporte popular no país?

É um esporte bem popular, sim, nas escolas. Falta estrutura para os clubes. Falta investimento, suporte e mídia. Às vezes, a Liga atrasa por falta de verba. Então, fica difícil vender o projeto para um patrocinador assim. As atletas precisam ter uma estrutura depois que saem da escola e têm que viver disso. Aí, a atleta tem que acabar optando por outro caminho que renda mais dinheiro e uma melhor condição de vida. Apesar de tanta dificuldade, tem muita gente ainda que luta pela melhora do handebol. Em Blumenau, na minha cidade, saem vários atletas para a seleção. Temos esperança de que com o tempo isso melhore mais ainda e que tenhamos uma Liga digna no Brasil.

Você joga na Hungria. Como é o handebol na Europa? O nível das competições é alto? Quais são os principais times na atualidade?
Recebo agasalho, tênis, carro do patrocinador, apartamento. Só tenho gasto com meu telefone e com comida. Só preciso ir lá e jogar. É o sonho do profissionalismo que sonhamos para o Brasil. É uma outra realidade. Um jogo recebe até cinco mil pessoas. Numa final, a gente pode jogar para dez mil. Noruega e Dinamarca são muito fortes, assim como a Espanha. As ligas húngara, francesa e dinamarquesa são as mais fortes. A Liga dos Campeões da Europa – que tem o mesmo padrão da Champions League do futebol – também é uma competição muito forte.

É viável ter o handebol como profissão no Brasil? Os salários permitem isso?
Hoje, no Brasil, é possível viver apenas do handebol quando se joga em times de ponta. Muitas amigas minhas conseguiram bolsas de estudos e puderam formar e conciliar com o esporte. Mas é lógico que se você tem uma família maior e tem que tomar conta de filhos, por exemplo, não dá para viver apenas do esporte. Mas em alguma coisa já ajuda.

Em 2012, a Alexandra foi a melhor do mundo, e, agora, você. Como as potências europeias e tradicionais rivais veem hoje a seleção brasileira?
Agora, elas nos respeitam mais. A gente vem numa ascensão desde 2009. Algumas equipes nos subestimavam antes dos jogos, até porque o europeu é muito orgulhoso, mas isso vai acabar.

Como recebeu a notícia de que havia sido eleita a melhor do mundo? Teve alguma festa para você?
Foi uma festa total. A partir do momento que a assessora da seleção me ligou parabenizando, comecei a receber vários telefonemas. Minha mãe berrou ao telefone e eu pedi uma churrascada no final do mês, quando eu estiver lá em Blumenau. Fiz um churrasco aqui em São Paulo. Peguei a churrasqueira emprestada, reuni umas amigas mais próximas e comemoramos muito.

Já está capitalizando o título individual de melhor do mundo de alguma forma?
Não. Recebo apenas a premiação. Não muda nada financeiramente. O mesmo acontece com o título coletivo, como no Mundial, por exemplo.

Atletas de sucesso já posaram nua em revistas, como Hortência, Ida, Mari Paraíba. Recebeu convite? Aceitaria se recebesse ou vê isso como um desrespeito?

Tu tinha que ouvir a gargalhada que dei aqui com esta pergunta (risos). Nunca fui requisitada para este tipo de trabalho. Acho que eu nunca aceitaria esta proposta. Acho até engraçado ser questionada sobre isso, mas não me vejo fazendo isso. Gostaria que me vissem apenas como atleta.

Como assimilou a lesão e a necessidade de passar por cirurgia e ficar sem jogar por até oito meses?

Os dois primeiros meses foram os mais difíceis. Chorei bastante de dor, mas depois disso já diminuiu a dor e estou evoluindo cada dia mais. Sempre fui católica e minha fé não aumentou depois da lesão. Hoje, já posso começar a correr, num ritmo mais lento, e ver esta evolução me dá confiança e me deixa muito feliz.

Ficar fora do Pan seria uma frustração?
Ficar fora de cada fase é uma frustração. É ruim ver meu clube jogando a Liga dos Campeões e eu fora. Sobre o Pan, ainda é uma dúvida, mas tenho que me preparar caso não participe.

O seu foco maior está no Mundial da Dinamarca, em dezembro?

O meu foco, agora, é estar bem e confiante. Não adianta participar de uma competição importante sem estar preparada. Quero inicialmente cuidar do meu joelho para, quem sabe, estar nas competições mais importantes do ano.

Como atleta, você já morou na Macedônia e, atualmente, vive na Hungria. Houve algum choque cultural no início?

Foi difícil adaptar nos dois lugares nos seis primeiros meses. Me virei na raça e na coragem. A língua nos engana. A gente se vê apurada, pede alguma coisa, vê no Google, mas aquilo que você fala não tem nada a ver com o que você realmente queria (risos).

O investimento no handebol para o ciclo olímpico ganhou reforço do Banco do Brasil. Junto com os Correios, o apoio será de quase R$ 10 milhões anuais. O Brasil chegará como um dos favoritos ao título na Olimpíada? Podemos sonhar com o ouro ou, no mínimo, bronze ou prata?

Espero que seja um campeonato muito bom. Estamos tendo um ótimo suporte e recebendo todas as condições para tal. Temos que lutar e retribuir com o ouro. O calor humano e jogar em casa será muito bom. Temos que abraçar o trabalho da comissão e fazer exatamente como fizemos no mundial. 

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