Nalbert critica ranking da CBV e patrocínios: ‘Ninguém vai torcer para uma empresa’

Felippe Drummond Neto
fneto@hojeemdia.com.br
26/06/2016 às 06:10.
Atualizado em 16/11/2021 às 04:04
 (Washington Alves/Light Press/Divulgação)

(Washington Alves/Light Press/Divulgação)

Carioca de nascimento, mas mineiro de coração, o ex-ponteiro da seleção Nalbert está de malas prontas para a sua quinta edição dos Jogos. Porém, assim com em Londres, ele estará fora das quadras no Rio de Janeiro. Campeão Olímpico, Mundial, da Copa do Mundo e tricampeão da Liga Mundial pelo Brasil, ele é hoje comentarista de vôlei da TV Globo. Entre uma transmissão e outra durante a Liga, o ex-jogador tirou um tempo para conversar com o Hoje em Dia.

Entre as gerações de 1992, 2004 e a atual, você acha que existe muito desequilíbrio técnico?
São gerações de um voleibol diferente, de épocas diferentes. Acho que a geração atual possui jogadores maiores, mais fortes, e com potencial físico maiores que as outras duas gerações. Em compensação, em 2004 e 1992, eram equipes mais equilibradas tecnicamente. E aí, talvez, a minha geração, de 2004, tenha tido uma quantidade maior de jogadores do mesmo nível.

A naturalização de atletas estrangeiros é polêmica. Qual a sua opinião?
É polêmica, mas tem regras bem definidas. Então, se todas as regras forem cumpridas, acho algo válido. Principalmente os jogadores que, antes de se naturalizarem, construíram uma história com o determinado país. O Leal já está aqui há muito tempo, não caiu de paraquedas, e o Juantorena, a mesma coisa, com a Itália.

Como você viu a contratação do cubano Simón pelo Sada/Cruzeiro?
A partir da hora que o Cruzeiro perdeu o Wallace e o Éder, que eram referências do time no ataque, o Simón vem pra suprir essa ausência. É um jogador fantástico.

Acha que Taubaté e Sesi-SP podem acabar com a hegemonia do Cruzeiro?
Na minha opinião, esta temporada será a mais equilibrada dos últimos anos. O campeão da Superliga e da Copa Brasil certamente virá desses três times. Eu só espero que nenhum desses times tenha problemas de lesões e que cheguem nas fases finais completos para a gente ver grandes jogos.

O que representa uma olimpíada para você? E o que significa ser campeão? Qual a sua principal lembrança?
Olimpíada é o ponto máximo da carreira de qualquer atleta. É meu sonho de menino, que eu consegui realizar. Fui a três edições dos Jogos, e, na terceira, consegui o título, após passar por um drama meses antes (lesão). Por isso, as lembranças são as melhores que eu tenho, juntamente com os nascimentos dos meus filhos.

Depois que sofreu a lesão no ombro às vésperas da Olimpíada de Atenas, de onde você tirou força para superar inclusive as expectativas de recuperação dos médicos?
Da minha fé, da minha esperança e do apoio da minha família. Sabia que, se eu trabalhasse duro todos os dias, poderia ter êxito naquela recuperação. Foi duro, desgastante, difícil, mas foi uma grande vitória. Por isso, guardo aquele momento com muito carinho na memória.

Como avalia o ranking de jogadores da CBV, que prejudica times e jogadores a cada temporada?
Eu sou contra o ranking. Acho que ele está atrapalhando muito mais do que ajudando. Não equilibra a competição, já que os times que têm um orçamento maior acabam sendo mais fortes.

Nas últimas duas Olimpíadas, o Brasil apostou em jogadores veteranos para a posição de ponteiro passador. No Rio, o mesmo deve acontecer com o Murilo. Você concorda com essa escolha?
Acho que jogadores experientes são sempre bem-vindos, ainda mais com experiência olímpica. Em 2004, eu tinha 30 anos e, apesar de não ser veterano, já tinha ido a duas edições. Fui como capitão e titular absoluto do time. Até poderia ter feito esse papel em Pequim, mas o Bernardinho acabou optando por não me levar. Mas concordo com essa opção, pois é uma posição de extrema importância.

Como foi a experiência no vôlei de areia? O que faltou para ter o mesmo êxito que na quadra?
É um outro esporte. São modalidades que caminham juntas, mas ao mesmo tempo são bem diferentes. Inclusive, hoje, não tem mais essa história de um jogador mudar de um esporte para o outro e conseguir ter sucesso. Para ser sincero, o que faltou para conseguir ter êxito na areia foi tempo e condição física. Minhas contusões começaram no mesmo período que fiz a transição. Acho que, se eu ficasse na areia uns quatro anos, eu teria me tornado um grande jogador.

Por ter começado e encerrado a sua carreira no Minas, como é sua relação com o Estado?
Minha história com Minas Gerais é muito especial. Adoro o Estado, pois foi onde tive minha primeira experiência fora de casa e onde me profissionalizei. Também foi onde encerrei a carreira. Minha mãe é mineira, tenho muitos amigos aí e, ainda por cima, foi onde carreguei a Tocha Olímpica, dentro do Mineirão. Só por isso já dá para ver o quanto o estado está marcado na minha vida.

Além de comentarista, você não tem vontade de trabalhar diretamente com o vôlei?
Gosto muito de trabalhar nessa área de comunicação. Também sou palestrante, participo de eventos corporativos, representando empresas, como embaixador do esporte. Gosto muito disso, pois posso transmitir valores que aprendi na carreira como atleta. Agora, diretamente no vôlei, não tenho vontade nenhuma de ser treinador. Talvez dirigente, ou até mesmo trabalhar nas categorias de base de algum clube, para ajudar na formação de atletas. Preparei-me para isso, e quem sabe no futuro não aconteça.

Como você vê o cenário do vôlei brasileiro em relação à demanda dos patrocinadores e à “exportação” de atletas?
Acho que é um sistema complicado para ambos os lados. As empresas entram sabendo que vão investir muito dinheiro e não terão quase nenhum retorno. Acho que deveriam pensar um sistema em que, de alguma forma, os clubes tivessem um retorno financeiro com as transmissões e patrocinadores das placas de publicidade, e aumentar o número de times com camisas importantes ou times de cidades. Porque ninguém vai torcer para uma empresa. Acho que o grande exemplo positivo disso é o Cruzeiro, que tem uma empresa muito forte por trás, mas leva o nome de um time tradicional. Esse é um casamento perfeito.

Para você, a Federação Internacional de Vôlei (FIVB) e a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) fazem um bom trabalho?
É sempre complicado falar sobre essas duas instituições. Com essa atual gestão da CBV, aconteceu uma aproximação maior com clubes e atletas. Acho que, dessa forma, eles estão trabalhando melhor em prol do vôlei brasileiro. Já a FIVB, agente sabe quem está lá (Ary Graça). Não dá para falar que ele é um mau gestor, mas depois de toda a polêmica em que ele se envolveu, punindo o Brasil, afastou a instituição do país. A gente espera que haja essa reaproximação o mais rápido possível e que a situação se defina, já que existe uma dúvida no ar sobre o que realmente aconteceu quando ele ainda estava à frente da CBV.

Recentemente, houve vários protestos de jogadores contra a CBV. Como você viu esses episódios?
Acho que, cada vez mais, os jogadores estão assumindo um espaço importante dentro da CBV. Hoje, eles têm voz ativa. E, de uma forma organizada e com bom senso, a participação dos atletas é sempre boa, seja concordando ou discordando das decisões tomadas.

Como ex-capitão, qual é a explicação para a seleção brasileira nem sempre levar os melhores jogadores em atividade?
Acredito que jogar um campeonato de clube e outro de seleção sejam coisas bem diferentes. Quem já viveu essa realidade sabe. Há jogadores que rendem bem dentro da estrutura do clube, em competições nacionais, em que a exigência física não é tão grande. Mas, lá fora, o buraco é mais embaixo. É claro que alguns jogadores fazem um grande sucesso nos clubes e não têm chance na seleção. Acho que tudo é uma questão de se adaptar ao padrão internacional.

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