‘Os ingressos caros privam o torcedor de ir ao campo, diz Marques

Gláucio Castro - Hoje em Dia
Hoje em Dia - Belo Horizonte
16/11/2014 às 10:23.
Atualizado em 18/11/2021 às 05:02
 (Wesley Rodrigues/Hoje em Dia)

(Wesley Rodrigues/Hoje em Dia)

“Quero sempre Atlético e Cruzeiro na final e, de preferência, com o Atlético ganhando as decisões”. Um dos grandes ídolos da história alvinegra, o ex-atacante Marques, de 41 anos, lembra-se de fases menos grandiosas do Galo.  Não tinha lugar para treinar, estava no time que caiu para a Série B em 2005 e não teve sequer um jogo de despedida do clube que aprendeu a amar em suas três passagens. Hoje, de camarote, ele vê com felicidade o bom momento da equipe.    Aposentado dos gramados em 2010, Marques trocou as chuteiras pelas arquibancadas e pelo gabinete da Assembleia Legislativa, onde vive os últimos dias do seu mandato como deputado estadual pelo PTB. Depois de obter 153 mil votos na primeira eleição, ele teve menos de 40 mil no último pleito, em outubro passado, e não conseguiu uma cadeira. Na última sexta-feira, ele foi à Praça do Papa, no bairro Mangabeiras, para conceder uma entrevista exclusiva ao    Hoje em Dia. Falou do bom momento do futebol mineiro, relembrou os tempos de craque, admitiu que a derrota eleitoral abriu uma ferida e reclamou do alto preço dos ingressos no futebol atual.    O que a vitória do Atlético no jogo de ida da Copa do Brasil representa para o título? É uma boa vantagem. Eu diria que o Atlético hoje tem 60% de chances, ainda mais pela forma que vem atuando. Acho que o Atlético é o favorito porque eles vendem qualquer resultado muito caro.   Como você avalia os dois times? O Cruzeiro é um dos times mais técnicos do Brasil. Tem muita habilidade e jogadas trabalhadas, o que é muito raro hoje. O Atlético é um time que não desiste nunca. Foi assim contra Flamengo e Corinthians. Com a ajuda do torcedor e muita raça, o time vai para cima.   O Marques teria lugar neste time? Lembro com muito saudosismo do meu tempo de jogador. Mas, para ser sincero, não sinto saudade de estar dentro de campo. A saudade é grande quando eu lembro da turma de vestiário, da arquibancada, do torcedor. Eu cheguei ao meu limite por causa das dores no joelho, mas este é um time fantástico e todo bom jogador tem lugar num grande time.    Sente muita falta dos gritos de “Olê, Marques”? Isso é o que mais me remete à época de jogador. Às vezes vou ao youtube e vejo alguns vídeos para matar saudade. O torcedor gritando o meu nome é minha maior saudade do mundo da bola.    Como avalia este momento do futebol mineiro? O momento de glória não vem sem uma dose de sacrifício lá atrás. Eu diria que o momento de Atlético e Cruzeiro foi uma construção, que veio aos poucos, desde a época que nem campo para treinar a gente tinha. Eu sou de uma época em que a gente dividia espaço com o sócio na Vila Olímpica. Os dois clubes, hoje, têm uma estrutura, uma retaguarda muito boa, fruto desta organização. Sem contar a força do Mineirão e do Independência, que fazem parte deste resgate do futebol mineiro. Como amante do futebol, quero sempre Atlético e Cruzeiro na final e, de preferência, com o Atlético ganhando sempre as finais contra o Cruzeiro.   A queda de rendimento do Cruzeiro é natural? O time está cansado? O atleta profissional está preparado para jogar quarta e domingo. As equipes estão em final de temporada. Todas estão pressionadas. Talvez o Cruzeiro tenha que se reinventar em algumas jogadas para surpreender o adversário. Os adversários estudaram o Cruzeiro e sabem o que fazer. Isso é normal. O Cruzeiro tem que se reinventar para não ser tão previsível como foi nos últimos jogos.   A taça do Brasileiro está bem encaminhada para o Cruzeiro? Acho que sim. Mesmo porque as outras equipes estão tendo as mesmas dificuldades. Você vê que o São Paulo, jogando contra o Internacional desfalcado, não conseguiu vencer. As equipes estão muito niveladas. A vantagem é forte e o título está bem encaminhado.   Tem ido aos estádios? Fui neste jogo da Copa do Brasil e foi fantástico   Como é o Marques torcedor? Cara, eu sou muito tenso. Por ter sido atleta sempre tem um olhar mais crítico. Às vezes não consigo entender como erram um passe de dois metros, como cruza uma bola atrás do gol. Mas a vibração na arquibancada é diferente.    Como surgiu esta identificação com a torcida do Atlético, já que você jogou em outros times de massa? Para ser sincero, quando eu cheguei em 1997 não tinha noção do que ia se transformar isso. São os mistérios que fazem parte do futebol. Na oportunidade, a gente montou um time para o Campeonato Brasileiro durante a competição, que é a pior maneira de montar um time, mas deu liga dentro e fora de campo. Aí o Atlético comprou meu passe e a empatia foi crescendo. Eu buscava sempre o entendimento do torcedor, que juntava o dinheirinho para ir ao campo. Na época, o ingresso não era essa ignorância que é hoje.   O que você acha desses preços praticados? Eu vejo com muita tristeza. Você está privando o torcedor de ir ao campo. Mas entendo também a situação dos clubes. A economia que está relacionada a um clube de futebol. Mas num lado mais romântico de ver a coisa, eu vejo com muita tristeza você privar aquele torcedor que ia na geral, com o dinheirinho contado, de participar de um momento tão importante do futebol.   Com esta renovação dos ídolos no Galo, o Marques está perdendo espaço nesta galeria? Não. De forma alguma. O clube é grandioso. A gente está falando de uma história recente, mas lá atrás o Atlético teve nomes importantes. Fico feliz de ficar marcado como um dos grandes nomes da história do clube. Isso ninguém vai tirar. O número de jogos, o número de gol, as assistências. Isso ninguém vai tirar. Isso que é bacana. Sem demagogia, torço muito para que outros jogadores venham também brilhar com a camisa do Atlético.    Quem foi o maior companheiro de ataque? Eu marquei época aqui com dois grandes jogadores: o Valdir e o Guilherme. O que mais me completava era o Guilherme, mas não posso esquecer jamais do Valdir. O Valdir era mais rápido. Um deixava o outro na cara do gol. Com o Guilherme nosso entrosamento era muito no olhar, o que me facilitava muito, principalmente nas jogadas pela beirada do campo.   Que treinador você mais gostou? Enumerá-los é até difícil. Mas o Nelsinho, que me deu a primeira oportunidade no Corinthians, é um dos mais emblemáticos. Depois o reencontrei no Japão. Eu tinha muita confiança jogando com ele. Outro foi o Levir (Culpi). Ele foi o treinador com quem eu mais joguei. Ele me deu a melhor condição para eu crescer como atleta. Eu tinha marca de ser um garçom e com ele fui artilheiro. É um treinador que eu guardo com muito carinho.   Foi difícil trabalhar com Emerson Leão? Nós chegamos juntos ao Atlético em 1997. Num primeiro contato, o atleta fica desconfiado porque ele é muito linha dura, gosta de dar uma dura, mas no decorrer da situação ele foi se soltando junto com o grupo e as brincadeiras fluiam até com ele. A lembrança que eu tenho dele é essa. Primeiro ele turrão, como sempre, mas depois entra na onda.   Tem mágoa do Vanderlei Luxemburgo por não ter renovado seu contrato no Atlético? Na época eu achava que não precisava daquilo. Por ser um ídolo do clube, a coisa foi muito mal conduzida. Eu queria simplesmente estender o contrato, mas sem exigir nada. Eu diria que jogaria de graça. Praticamente já o fazia porque eu tinha um contrato simbólico, pelo qual eu recebia R$ 10 ou R$ 15 mil. Eu só queria encerrar minha carreira do jeito que eu tinha planejado no clube que eu amava. Isso foi cortado. Hoje não sinto mais nada.   A coisa foi mal conduzida pelo Atlético? Do Atlético falta esta sensibilidade, mas não só em relação a mim, mas a tantos outros ídolos que passaram pelo clube e mereciam um tratamento especial. Mas não tenho mágoa nenhuma.   O que representou a passagem de Ronaldinho pelo Atlético? Primeiro eu sou fã incondicional do Ronaldinho. Foi uma das maiores sacadas do presidente Alexandre Kalil no Atlético. O Ronaldinho estava no ostracismo no Flamengo. Ou Ronaldinho aproveitava a chance ou estava acabado para o futebol. E ele quis a primeira opção. Jogou muito e representou muito bem a camisa do Atlético. Está entre os grandes do clube. Já fomos parceiros de quarto na Seleção Brasileira. Ele menino ainda. Eu não tinha noção do que ele ia se transformar.   Ele está no mesmo nível do Reinaldo? Não. O Reinaldo é outro patamar. O Reinaldo é nível A, o Ronaldo, B.   Ficou decepcionado em não ser reeleito? Eu fiquei um pouco decepcionado pelo trabalho bem feito que eu fiz nos quatro primeiros anos. Trabalhei de uma forma limpa e transparente o tempo todo. Tomava o cuidado de tornar publico toda verba que chegava até nós. Eu pedia para as pessoas olharem o que foi feito. Mas as pessoas não tomam conta de quem elas votam. Eu queria ser cobrado, mas as pessoas não cobram. Por isso minha decepção, porque fiz um trabalho honesto e você vê tantos fichas-sujas sendo eleitos. Fiz uma campanha com recursos próprios em torno de R$ 140 mil.   Pensa em concorrer de novo? É difícil falar nunca. Tem gente que acredita no meu trabalho. Por isso não fecho as portas. Ficou uma ferida, mas vou tocar minha vida.   Os bastidores da política e do futebol são muito sujos? Têm coisas obscuras. Você jamais vai entender como tantos ingressos chegam às mãos dos cambistas e não vai entender como um candidato pode gastar R$ 4 milhões numa campanha.   Tem visto alguma mudança na Seleção após os 7 a 1? Foi a favor da contratação do Dunga? Pelo que fez e realizou, o meu nome seria o Tite. Mas eu gosto do estilo do Dunga de trabalhar, principalmente neste momento de resgate e auto-confiança do futebol brasileiro. Ele respeita o adversário mais forte e joga fechando a casinha mesmo como a gente gosta de falar, principalmente neste momento de entressafra. Temos que botar a sandália da humildade e jogar conforme a música. Só assim seremos grandes de novo.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por