Contra fake news

Decisão do STF de bloquear o aplicativo Telegram pode ser difícil de ser aplicada, diz especialista

Bernardo Estillac
bernardo.leal@hojeeemdia.com.br
18/03/2022 às 18:41.
Atualizado em 18/03/2022 às 18:51
 (Pixabay / Divulgação)

(Pixabay / Divulgação)

A decisão de bloquear o Telegram no Brasil, anunciada nesta sexta-feira (18) pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, mostra um descompasso entre a determinação judicial e a possibilidade de aplicação, segundo especialista ouvida pelo Hoje em Dia.

A medida apresentada pelo ministro determina a suspensão imediata do aplicativo russo de mensagens, visto como meio de disseminação de notícias falsas (fake news).

Como o Telegram não tem representação no Brasil e não respondeu às solicitações anteriores da Justiça, a decisão de Moraes é direcionada às operadoras de internet e à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que devem impedir os usuários de acessar o serviço.

(Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil )

(Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil )

A mestre em direito e diretora-fundadora do Instituto de Referência em Internet e Sociedade (Iris), Luíza Couto Chaves Brandão, alerta para a amplitude da decisão do ministro.

"Ela prevê uma série de obrigações bastante vastas e que causam dúvidas porque atinge milhões de pessoas que não têm nenhuma relação com a ação específica. Pessoas que usam a plataforma por diversos motivos. Isso, em um primeiro momento, já causa um questionamento em relação à proporcionalidade da decisão, vários usuários são atingidos para que determinado fim seja alcançado", analisa.

Como mostra a especialista, para que o bloqueio seja cumprido, seria necessário, entre outros fatores, interferir na estrutura da internet com risco de causar danos à rede de outros países.

Além dessa complicação no cumprimento da medida do STF, há o fato de ela prever punição para usuários que tentem subterfúgios para acessar o Telegram durante o bloqueio por parte das operadoras de internet no país.

"Você verificar se há usuários acessando o aplicativo é tecnicamente impossível. Primeiro por que isso criaria um sistema de vigilância que não é viável tecnologicamente. A decisão, portanto, determina multas que não serão efetivas", comenta.

A batalha entre STF e Telegram tem no horizonte o período eleitoral deste ano. Em episódios anteriores, como no bloqueio da conta do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, a falta de cooperação entre a Suprema Corte e o aplicativo de origem russa alimenta o receio de que se torne impossível moderar o conteúdo que circula na plataforma.

Para Luiza Brandão, embora a decisão de Alexandre de Moraes tenha pontos criticáveis, é importante que o aplicativo estabeleça um diálogo com a Justiça brasileira. Isso permitiria o estabelecimento de acordos de cooperação que já existem com outros siftwares e redes sociais, como o WhatsApp.

A especialista considera a moderação da plataforma, seguindo diretrizes judiaciais, mais eficiente do que o bloqueio no combate a grupos que disseminam notícias falsas e nocivas à democracia.

"Hoje, a gente já tem estudos que mostram que quando há bloqueio de uma plataforma ou ela deixa de existir, as pessoas migram para outras que oferecem ferramentas parecidas", explica.

Além da desinformação ou fake news, plataformas digitais podem ser meios para troca de mensagens com conteúdo de ódio, por exemplo. Por isso, é interessante que exista alguma forma de anuência entre os serviços digitais e as leis do país em que atuam.

O tempo de validade da decisão de Moraes é incerto. Luíza Brandão avalia que o ministro pode suspender a determinação se o Telegram abrir diálogo com o Brasil, mas o provável é que alguém afetado pela medida perpetre um agravo regimental para anular os efeitos.

"A suspensão da decisão, agora, depende de um agravo regimental por algum ator envolvido e que vai para apreciação dos outros ministros do STF. Porém, me parece que, apesar de ter muitas obrigações para vários atores, se o Telegram se manifestar em juízo, essa ordem pode ser suspensa pelo próprio Alexandre de Moraes", conclui a diretora do Iris.

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