Água motiva 18 crimes ambientais por dia em Minas Gerais

Tatiana Lagôa
tlagoa@hojeemdia.com.br
05/06/2017 às 19:42.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:56
 (Flávio Tavares/Arquivo Hoje em Dia)

(Flávio Tavares/Arquivo Hoje em Dia)

Construções em áreas de proteção permanente, captação irregular de água e até contaminação de lençol freático. Somente em 2016, foram descobertos 6.714 crimes ambientais do tipo em Minas Gerais, o equivalente a 18 infrações por dia. Esse é mais um capítulo da batalha pela utilização do recurso natural cada vez mais escasso no país. Nessa luta, porém, quem “morre”, seja por assoreamento ou poluição, são os rios. 

Crime ambiental contra a água está previsto na Lei Federal 9.605; punição vai de multa até prisão

É o que mostra a segunda matéria da série publicada pelo Hoje em Dia na Semana Nacional do Meio Ambiente. As reportagens revelam as lutas travadas no Estado em consequência da menor disponibilidade da água somada com a dependência dela para sobrevivência dos moradores e das empresas. Na disputa, uma parte das pessoas recorre à ilegalidade. 

As infrações registradas em Minas no ano passado pela Polícia Militar (PM) e pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) resultaram em R$ 60,4 milhões em multas. Segundo o tenente Rômulo Morati, da Companhia de Polícia Militar Independente de Meio Ambiente, as principais infrações estão relacionadas à retirada irregular de água, sem a devida outorga, ao lançamento de efluentes nos rios e ao desrespeito às áreas de proteção.

Ilegalidade

Quem vê a represa Várzea das Flores, responsável por 10% do abastecimento hídrico da Grande Belo Horizonte, nem imagina que o local é classificado como Área de Proteção Ambiental (APA). Barracas e casas – desde as mais simples até mansões – substituíram parte da mata ciliar e deques invadem a água. Lanchas ao longo do leito e música no último volume não deixam dúvida: a urbanização chegou como um trator naquele local. 

Conforme o Código Florestal, essa ocupação é ilegal. A manutenção da área verde ao redor da água é necessária para manter vivas as nascentes e evitar o assoreamento da represa.

O problema fica mais grave quando se leva em conta os 23 bairros formados na área, com uma população estimada em 60 mil pessoas. Boa parte do esgoto das residências é jogada dentro da água que, após tratamento, chega nas casas de 640 mil pessoas que moram na região metropolitana.

A Prefeitura de Contagem busca legalizar a situação, afirma o diretor de Planejamento Ambiental da Secretaria Municipal de Meio Ambiente Eric Alves Machado. Proprietários de imóveis e barracas já foram notificados e poderão até ser retirados de lá. Já o novo Plano Diretor da cidade, que está em discussão, poderá legalizar parte desses bairros, o que tornaria possível, por exemplo, um planejamento com redução dos danos ambientais. 

Por outro lado, segundo o líder comunitário do bairro Tupã, Gilmar Batista Pereira, existem famílias que estão no local desde a década 1960. Até mesmo equipamentos públicos, como escolas e postos de saúde, foram implantados em algumas áreas, o que pode tornar o caminho da ocupação sem volta. “Muitos não têm para onde ir e chegaram antes do local virar área de proteção”, diz.

Ligação clandestina é problema nas cidades e no campo

As ligações clandestinas de água agravam a crise hídrica. Por todo o país, milhões de pessoas utilizam o recurso, cada dia mais valioso, sem pagar um centavo por isso. Em Belo Horizonte, desde 2015, a Copasa descobriu 6.269 “gatos” por meio do programa Caça-Gotas. 

A Agência Nacional das Águas (ANA) aplicou 38 autos de infração no rio São Francisco de 2016 a maio de 2017 – nove deles na porção mineira; o Ministério Público Estadual também tenta combater condutas ilícitas, segundo a promotora de Justiça do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente, Andressa Lanchotti

Em Ubá, na Zona da Mata, onde a concessionária também combate essa irregularidade, foram 158 casos no mesmo período. “Estamos trabalhando para reduzir as perdas de água. As ligações clandestinas aumentam durante a crise”, afirma o diretor de Operação Metropolitana da Copasa, Rômulo Perilli. O percentual de perdas de água pela companhia é de 36%. 

No campo, a utilização não autorizada é crescente em Minas. “Como a disponibilidade hídrica nos poços superficiais reduziu, aumentou a quantidade de poços artesianos feitos sem outorga para retirada de água subterrânea”, diz o superintendente de Estratégia e Fiscalização Ambiental da Semad, Marcelo Fonseca. 

A utilização de poços para irrigação não era tão comum. Porém, com a seca dos últimos anos, tornou-se uma prática recorrente para manter as plantações. A situação é tão grave que, neste ano, a Semad está realizando operações especiais e criando estratégias para detectar os infratores. “A fiscalização do uso irregular de água subterrânea é complexa porque um poço tubular é muito pequeno”, frisa Marcelo. 

Por essa razão, está sendo desenvolvida uma técnica com base em imagens de satélites para encontrar os poços irregulares no campo. Foi dessa forma, por exemplo, que somente durante uma operação em abril deste ano foram flagrados 52 pontos de retirada ilegal de água no entorno da represa de Três Marias, que corta pelo menos duas regiões do Estado (como a Central e a Centro-Oeste), com a distribuição de R$ 570 mil em multas. 

Até o momento, desde o início do ano, apenas a Semad aplicou R$ 850 mil em multas por conta de 243 irregularidades encontradas em todo o Estado.
A ação pode contaminar as águas subterrâneas além de afetar a disponibilidade do recurso em época de escassez. 

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