1.825 dias de dor: para os atingidos pelo rompimento da barragem em Mariana, a tragédia é diária

Cinthya Oliveira
cioliveira@hojeemdia.com.br
04/11/2020 às 19:56.
Atualizado em 27/10/2021 às 04:57
 (Lucas De Godoy/Ramboll/MPF/Divulgação)

(Lucas De Godoy/Ramboll/MPF/Divulgação)

Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, em Mariana, e Gesteira, em Barra Longa. Essas foram as comunidades mais devastadas pelo rompimento da barragem de Fundão, na região Central de Minas. O desastre, que deixou 19 mortos e um rastro de destruição, completa cinco anos nesta quinta-feira (5).

Para os moradores desses e outros locais atingidos, a tragédia é diária desde aquele 5 de novembro de 2015. Quem afirma é a chefe da Força-Tarefa Rio Doce, a procuradora da República Silmara Goulart.Lucas De Godoy/Ramboll/MPF/DivulgaçãoCinco anos depois, as marcas do mar de lama ainda estão presentes em Mariana

“Quando vemos na TV a barragem se rompendo e o tsunami de lama, o desastre dura um dia para nós. Para os atingidos, são 1.825 dias. São pessoas simples, do universo rural, pescadores e artesãos, que olham ao redor e não reconhecem a própria vida. Eles vivem problemas diários”, afirma a procuradora Silmara Goulart

Dezenas de famílias que tiveram residências destruídas parcialmente ou totalmente ainda aguardam o reassentamento coletivo. “Meu sonho é ter minha casa de volta. Não quero dinheiro, só a minha casinha simples”, afirma Romeu Geraldo de Oliveira, de Paracatu de Baixo. Hoje, ele mora na região urbana de Mariana e está desempregado.

As obras de reassentamento da comunidade foram iniciadas ano passado, mas nenhuma construção foi erguida. Por causa da pandemia, os trabalhos foram paralisados no 1º semestre. O prazo para a entrega não foi firmado.

“Estamos apreensivos, porque não sabemos quando o reassentamento vai acontecer. Muitos já perderam a esperança. O pessoal da roça andava com as próprias pernas, plantava de tudo no quintal, mas agora a gente depende muito da Renova”, diz Romeu.

Há cinco anos, a família dele depende do auxílio emergencial de um salário mínimo (mais 20% por dependente e uma cesta básica), mas o valor não é suficiente para ter conforto na região urbana, segundo Romeu.

“Na roça a gente não paga por gás, porque tem lenha. Não gasta para comprar verduras e legumes. Em Paracatu, antigamente, dava para viver bem com um salário. Aqui, em Mariana, com dois salários, você fica apertado no fim do mês”, desabafa o morador Romeu Oliveira

Reassentamentos

Em Paracatu, 98 famílias decidiram participar do reassentamento. Até o momento, na área escolhida para abrigar a nova comunidade, houve terraplanagem e abertura das vias.

Em Bento Rodrigues, são 211 famílias que optaram por morar no reassentamento e existem alvarás para a construção de 98 casas – duas estão prontas. A Fundação Renova informou que tem levado ao Poder Judiciário todas as questões.

Já em Gesteira, distrito de Barra Longa, a proposta não saiu do papel. O projeto foi acordado entre a Fundação Renova, MPF e atingidos, mas não recebeu aval da Justiça. Trinta e sete famílias participaram, mas oito já preferiram o reassentamento familiar – oferecido pela Renova para quem prefere morar em local diferente da comunidade a ser reerguida.

Para o procurador da República Helder Magno da Silva, a fundação desmobiliza a comunidade. “É extremamente preocupante a Renova levar essas pessoas a deixarem de lado o convívio em comunidade e realizar acordos sem a participação do MPF, o que daria transparência ao processo. As pessoas estão aderindo ao outro modelo porque estão cansadas de esperar, mas os vínculos comunitários são muito importantes e devem ser prioritários”, afirma.

A Fundação Renova - entidade mantida pelas mineradoras e criada para trabalhar as reparações sociais e ambientais em Mariana e ao longo da bacia do rio Doce - afirma que foram pagos R$ 2,6 bilhões em indenizações e auxílios emergenciais a mais de 320 mil pessoas.

Por nota, a Renova informou que as obras chegaram a ser suspensas em dois momentos, devido à pandemia, mas foram retomadas em 15 de junho, após autorização da Prefeitura de Mariana. “De forma gradual e com todas as medidas de segurança”.

Com relação aos reassentamento em Paracatu de Baixo, a fundação disse que intervenções estão em andamento. Dentre elas, a terraplenagem das vias de acesso e das áreas dos lotes, contenções, drenagem e rede de esgoto. “Foi iniciada a construção de 8 casas e da escola. Mais de 50 projetos conceituais foram concluídos e cerca de 20 estão em andamento”. 

Já sobre Bento Rodrigues, foi informado além das duas casas prontas, outras três estão em fase avançada. Há ainda outras 32 que tiveram obras iniciadas, mas os trabalhos foram revistos devido às restrições impostas pela pandemia. “Em andamento, ainda, a construção de 3 bens públicos (escola, posto de serviços e posto de saúde)”.

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