Advogado condenado a 99 anos de prisão é solto com base na 'Lei de Abuso de Autoridade'

Renata Evangelista*
rsouza@hojeemdia.com.br
14/01/2020 às 10:24.
Atualizado em 27/10/2021 às 02:17
 (Amadeu Barbosa / Arquivo Hoje em Dia)

(Amadeu Barbosa / Arquivo Hoje em Dia)

"Como diria Raul Seixas, eu não sou besta pra tirar onda de herói”'. Este foi um dos argumentos descritos por um juiz de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), para mandar soltar um advogado condenado a 99 anos e 10 meses de prisão  - por apropriação indébita previdenciária, falsidade ideológica e crimes previstos na Legislação Extravagante, como fraudes e outros.

Na decisão proferida no último dia 8, o magistrado disse cumprir a Lei de Abuso de Autoridade, em vigor desde o início deste ano e que torna crime uma série de condutas praticadas por policiais, juízes e promotores, como negar habeas corpus.Amadeu Barbosa / Arquivo Hoje em Dia / N/A

O advogado estava recluso no Complexo Penitenciário Nelson Hungria, em Contagem 

"A lei do abuso de autoridade, por outros chamada de lei da impunidade, incluiu no estatuto da advocacia o art. 7B, o qual criou a figura do crime contra a prerrogativa do advogado consistente em mantê-lo preso, antes do trânsito em julgado da condenação, em sala que não seja de “estado maior”', descreveu o juiz ao mandar soltar o homem.

Como a condenação era provisória e o advogado estava recluso no Complexo Penitenciário Nelson Hungria (CPNH), o magistrado entendeu que, baseado na nova norma, o réu não poderia permanecer detido. "Embora este juízo continue convicto de que o Pavilhão H do CPNH seja instalação dotada de condições físicas que se enquadrem no conceito da tal 'sala de estado maior', há discordância por parte da Ordem dos Advogados do Brasil, o que torna o tema polêmico e incerto", argumentou.

Na decisão, o juiz prosseguiu: "Aliás, a nova lei criou para o magistrado a ameaça de responder a crime de abuso de autoridade em tal hipótese, o que não me parece razoável e nem justo. Colocou-se a espada da incerteza sobre a cabeça daquele, que ao final e ao cabo, pretendia aplicar a própria lei".

A Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Minas Gerais (OAB-MG) informou que não comenta decisões proferidas por juízes.

O que diz a lei

A  Lei de Abuso de Autoridade, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, passa a prever punição de multa ou até mesmo prisão para condutas como negar habeas corpus quando manifestamente cabível (um a quatro anos de prisão, mais multa) e negar o acesso aos autos do processo ao interessado ou a seu defensor (seis meses a dois anos de prisão, mais multa).

Além de penas de prisão e multa, diversos pontos preveem ainda sanções administrativas, como a perda ou afastamento do cargo, e cíveis, como indenização. Para incorrer em crime, a lei prevê que as condutas sejam praticadas com a finalidade de beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou com o objetivo de prejudicar alguém, ou ainda “por mero capricho ou satisfação pessoal”.

Confira abaixo outros pontos que passam a ser crime, de acordo com a nova lei de abuso de autoridade:

-   Invadir ou adentrar imóvel à revelia da vontade do ocupante sem determinação judicial. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.

-  Decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado sem prévia intimação de comparecimento ao juízo. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.

- Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.

- Grampear telefone, interceptar comunicações de informática ou quebrar segredo de Justiça sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Pena: de dois a quatro anos de prisão, mais multa.

- Divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investigado ou acusado. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.

- Estender injustificadamente a investigação, procrastinando-a em prejuízo do investigado ou fiscalizado. Pena: de seis meses a dois anos de prisão, mais multa.

- Insistir em interrogatório de quem tenha optado por ficar em silêncio ou pedido assistência de um advogado. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.

- Manda prender em manifesta desconformidade com a lei ou não soltar alguém quando a prisão for manifestamente ilegal. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.

- Manter presos de ambos os sexos na mesma cela ou espaço de confinamento. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.

*Com Agência Brasil.

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