Autor de canção-hino ao rio Doce se diz arrasado com a tragédia ambiental

Marcelo Machado - Hoje em Dia
15/11/2015 às 08:43.
Atualizado em 17/11/2021 às 02:29
 (Foto Reprodução)

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Com a degradação das matas ciliares nas últimas décadas, as gameleiras, ipês e pés de jenipapo cantados por Zé Geraldo já não emolduram o rio Doce em Governador Valadares, Leste de Minas, a 324 quilômetros de Belo Horizonte.

Autor da poética canção “Rio Doce”, um hino ao rio que marcou a infância e a adolescência dele, o cantor e compositor mineiro, de 70 anos, expressou a indignação por ver, mesmo à distância, o mar de lama tomar conta do outrora caudaloso fluxo de água.

“Estou completamente assim... Arrasado. Não tenho palavras. O rio Doce, tão maltratado, já não era mais aquele, já não tinha a mesma força, a mesma vazão. Agora, está nessa condição de calamidade, algo pavoroso para as cidades nas quais ele passa. É uma sacanagem”, desabafou o cantor em entrevista ao Hoje em Dia, por telefone, de São Paulo, onde radicou-se desde o início dos anos 1960.

Nascido em Rodeiro, na Zona da Mata mineira, Zé Geraldo mudou-se com a família para Governador Valadares ainda garoto, aos 7 anos. “Fui criado e morei lá até os 18 anos. Vivia na beira do rio Doce, lá no Santa Terezinha”, relata, referindo-se a um dos 20 bairros ribeirinhos da cidade.

“Com o Carlos Antônio, meu irmão, eu jogava bola às margens do rio. Aprendi a pescar ali. Caçava preás. Entrava na água, mas como não sabia nadar direito, eu me segurava nas canoas que ficavam embaixo dos pés de ingá”, recorda-se Zé Geraldo.

Pedido do irmão

Uma das 11 faixas do segundo álbum do cantor (Estradas, de 1980), “Rio Doce” passou a ser compartilhada por valadarenses em redes sociais, como forma de lamento e protesto, desde que a lama das barragens da Samarco, com níveis elevados de ferro, manganês e alumínio, invadiu o leito do rio, causando a morte de peixes e provocando a interrupção do abastecimento de água em Valadares e outras cidades.

“O que mais me marca na música são as lembranças que tenho das gameleiras, ingás, jenipapos. É uma coisa muito viva na minha memória”, conta ele, explicando que compôs “Rio Doce” após um pedido de Carlos Antônio – já morto. “Ele me cobrava, me dizia que eu deveria fazer algo para evocar a minha vida em Valadares e falar mais da cidade. Aí fiz, e acredito ter sido muito feliz nessa composição”.

Falta de fiscalização

Agora, com o quadro ainda mais degradante do rio, Zé Geraldo confessa que busca equilíbrio e inspiração para documentar um desabafo. “Estou para escrever um texto, um lamento sobre toda essa tragédia. É uma maneira de registrar a minha indignação”, diz o cantor, que critica a omissão dos governos em relação às mineradoras.

“Tem coisa que não dá para prever, mas não é este o caso. O problema é a falta de fiscalização. O Estado não monitora, não fiscaliza. Tudo é muito largado. Tanto que não foi a primeira vez que isso aconteceu. E isso é muito grave, porque pode acontecer em outras barragens”.

Zé Geraldo também diz que a conscientização do brasileiro sobre a preservação ambiental ainda não é a ideal. “O Brasil acordou tarde para a questão ambiental. É um tema que deveria, há muito tempo, estar presente desde cedo, com ênfase, nas escolas”.

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