(Maurício Vieira)
Homens, mulheres, idosos e crianças recém-nascidas. A Ocupação Carolina Maria de Jesus, iniciada na madrugada de ontem em um prédio da avenida Afonso Pena, no Centro da capital, já tem 200 famílias e a expectativa de receber ainda mais pessoas, segundo os organizadores.
O imóvel foi ocupado por volta de 1h e já tinha três dos 14 andares tomados pelos manifestantes. Coordenados pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), eles reivindicam que edifícios abandonados na capital sejam destinados à moradia popular.
Segundo a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), o prédio ocupado está entre os imóveis ociosos que constam no plano de revitalização do hipercentro. Porém, não informou se o imóvel é de propriedade particular nem há quanto tempo ele está vazio.
Mutirão
No local, um mutirão de limpeza e organização foi feito para que todos se acomodassem. Com vassouras, rodos e panos de chão, dezenas de cômodos foram higienizados para que colchonetes e cobertores pudessem ser estendidos. Uma cozinha foi improvisada no terceiro andar do edifício. Sobre a mesa, dezenas de pacotes de feijão, arroz e outros alimentos não perecíveis iam sendo preparados. As refeições são comunitárias e destinadas a todas as famílias acampadas.
No térreo, uma das salas está funcionando como creche dentro da ocupação e foi decorada com brinquedos e lençóis coloridos. Há cerca de 15 crianças no local, conforme as lideranças do movimento.
Com o filho de três meses no colo, o motorista Deividi Freitas, de 35 anos, sonha com o sucesso da ação. Ao lado da mulher, Brenda Cruz, na tarde de ontem ele preparava cuidadosamente o espaço em que iriam passar a primeira noite na nova casa. “Quero brigar pelos direitos de moradia do meu filho porque os meus já foram roubados”, afirma. Maurício VieiraDeividi e a esposa afirmam lutar pelo direito do filho, de apenas três meses
O operador de empilhadeira Clerisson Pereira, de 35 anos, também chegou ao local acompanhado da mulher e dos dois filhos. Os pertences estavam divididos em sacolas. Desempregado e sem condição de arcar com aluguel, ele e a família depositam as esperanças na ocupação. “Precisamos de uma resposta. Estamos cobrando um direito nosso, que é moradia”.
Resistência
Poliana de Souza, uma das coordenadoras do movimento, explica que o grupo é formado por famílias vindas de outras ocupações, ex-moradores de rua e pessoas despejadas depois de não conseguirem pagar o aluguel. “Vamos permanecer aqui até que apareça uma resposta. Esperamos a liberação do imóvel para moradia ou a transferência para um outro prédio”, explica.
Entidades como o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG) apoiam a ocupação. “Se não houver esse tipo de pressão, o poder público não se movimenta”, defende Beatriz Cerqueira, coordenadora do sindicato.Maurício VieiraA família de Clerisson foi para a ocupação porque não tem como pagar aluguel
Retirada de movimento só com mandado judicial, diz PM
A legalidade da ocupação ainda não é consenso. Para o advogado Kênio Pereira, especialista em direito imobiliário, a lei autoriza que os membros da ocupação sejam retirados do imóvel mesmo sem mandado judicial. Ele esclarece, no entanto, que a recomendação é entrar com uma ação de reintegração de posse e pedir uma liminar de desocupação imediata, que só é concedida se a ocupação tiver menos de um ano. “Por isso, o proprietário do imóvel deve acionar a Justiça o quanto antes”, reforça Pereira.
Já na avaliação do major Flávio Santiago, chefe da Sala de Imprensa da Polícia Militar, a corporação só faz a retirada das famílias se houver mandado judicial. “A PM, nessas situações, garante o poder de polícia somente nos casos de reintegração de posse”.
Histórico
O imóvel ocupado no Centro de BH foi sede da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) de 2001 a 2006. Segundo a pasta, o órgão foi transferido para o bairro Floresta, na zona Leste, saindo de lá em dezembro de 2010 para a Cidade Administrativa, onde está hoje. Segundo a SES-MG, o imóvel da avenida Afonso Pena, 2.300, foi alugado da Fundação Sistel de Seguridade Social. A reportagem tentou contato com a empresa, que não atendeu às ligações até o fechamento desta edição.
Parte dos integrantes da ocupação chegou a cogitar que o prédio poderia pertencer à União. Porém, o Ministério do Planejamento afirmou, em nota, que o edifício não está sob a administração da Secretaria de Patrimônio do Governo Federal.Maurício Vieira Local foi higienizado para dar condições de as pessoas se acomodarem