Conselho tutelar à espera de socorro em Belo Horizonte

Anderson Rocha
arocha@hojeemdia.com.br
28/08/2017 às 20:28.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:18
 (Mauricio Vieira)

(Mauricio Vieira)

Faltam profissionais e estrutura nos conselhos tutelares de Belo Horizonte. Responsável por tomar providências em casos de ameaças ou violações dos direitos da criança e do adolescente, o órgão carece de melhores condições de trabalho. A incapacidade de atender a todas às demandas de maneira satisfatória vem à tona em meio às discussões sobre o acompanhamento de bebês filhos de mulheres usuárias de drogas e álcool ou em situação de rua na capital.

Recentemente, a Justiça suspendeu a medida que determinava aos profissionais da área de saúde informar esses casos. Uma nova portaria deverá ser publicada. Mas, enquanto o novo texto está em análise na Corregedoria-Geral de Justiça, situações de suspeita de vulnerabilidade serão comunicadas diretamente ao Conselho Tutelar.

Na capital, são nove unidades, uma por regional. A falta de estrutura para o atendimento é a principal queixa dos conselheiros, que afirmam que, em muitas espaços, não há área adequada para receber o público, carro com motorista e até goteira no imóvel, como é o caso no da regional Nordeste.

Sem espaço

Marlise Ely Gonçalves, do Conselho Tutelar Barreiro, diz que divide a sala, na casa alugada pela prefeitura para o funcionamento da unidade, com uma colega. Geladeira e pia disputam espaço com escaninhos e arquivos, e não há área de brinquedos para crianças. Sem internet há um ano e meio, o computador de lá ficou on-line há apenas uma semana.

“Se chegarem cinco cidadãos ao mesmo tempo, um terá que esperar, mesmo que seja uma situação grave. Nunca atendemos duas pessoas ao mesmo tempo. Eu peço uma sala emprestada”, diz.

Mão de obra

Funcionando no prédio da administração regional, o Conselho Tutelar Pampulha enfrenta a falta de funcionários. “Não temos carro com motorista e os estagiários são de nível médio, o que é inadequado. A prefeitura nos prometeu quatro estagiários de nível superior”, afirma a conselheira Adriana Coutinho, que reforça a necessidade de guardas municipais para dar segurança aos trabalhos realizados. 

Na Norte, também há escassez de mão de obra. Segundo fontes ouvidas pelo Hoje em Dia, lá não há funcionários administrativos. Já no da região Leste, trabalhadores da área e um carro exclusivo para as atividades, com motorista, só foram possíveis após a intervenção do Ministério Público (MP).Mauricio Vieira / N/A

APERTADO - Geladeira e escaninho com processos disputam espaço

O plantão dos conselheiros – feito de segunda a sexta, das 18h às 7h, e aos fins de semana – é outro ponto de insatisfação, segundo Alciene Fátima da Silva, da regional Pampulha. “É abafado, desorganizado, só tem um basculante, a cama quebrada. O plantão não é para dormir, mas precisamos de um mínimo de qualidade. No dia seguinte já trabalhamos na regional”. 

Ela afirma que a situação piora no fim de semana, quando não há limpeza nos banheiros. “Nós queremos uma reunião para tentar melhorar isso”, diz Alciene. 

Readequação

A Secretaria Municipal de Políticas Sociais afirma trabalhar na readequação física e administrativa dos conselhos tutelares da capital. Dentre as ações, conforme a gerente de Coordenação de Projetos Especiais da pasta, Andréa Francisca de Passos, está a nomeação de assistentes administrativos exclusivos para atuar nas unidades. 

“Esse fato é primordial para que possamos dar agilidade aos processos de trabalhos e garantir que os conselheiros estejam disponíveis para executar suas funções de forma eficaz e eficiente”, frisou.

Transferência para os prédios das regionais busca centralizar atendimento a usuários

Apesar dos problemas enfrentados, a conselheira Adriana Coutinho diz que o diálogo com a prefeitura está avançando e pequenas melhorias estão acontecendo. Ela destaca a realocação das unidades nas dependências das administrações regionais, como já é na Pampulha, Norte e Centro-Sul.

“Para o usuário é excelente. O serviço está lá dentro (da regional). Encaminhamos para a área da educação, ele sobe a escada e leva a requisição. Antes, ele tinha que pegar ônibus”, enfatiza Adriana.

Segundo a Secretaria Municipal de Políticas Sociais, a transferência das unidades para as regionais é primordial, otimizando recursos materiais, físicos e humanos. “Os conselhos estarão mais próximos dos serviços, favorecendo o trabalho de articulação em rede, fator primordial no trabalho dos conselheiros”, disse Andréa Francisca dos Passos, gerente de Coordenação de Projetos Especiais da pasta.

Além disso, a secretaria garantiu que foram feitas reestruturações físicas nas unidades Centro-Sul e plantão e que foram readequados os conselhos Noroeste, Barreiro, Venda Nova e Leste. Pampulha e Norte passarão por reformas. 

Uma das principais queixas, a ampliação do número de conselhos tutelares só deverá ocorrer após a análise de indicadores, como a quantidade de atendimentos, percentual de crianças e adolescentes por regional e população em situação de vulnerabilidade. 

Para isso, conforme a pasta, o município informatizará os processos com a regulamentação do Sistema de Informação dos conselhos tutelares. Atualmente, os relatórios de atendimentos são feitos à mão.

Vagas em Umeis, evasão escolar e violência são as principais demandas nas unidades

Falta de vagas nas Unidades Municipais de Educação Infantil (Umeis), evasão escolar e casos de violência contra crianças e adolescentes são os principais casos atendidos nos conselhos tutelares da capital. 

A procura por uma vaga nas Umeis é a campeã das demandas. Nessas situações, o conselho auxilia fazendo a requisição na Gerência de Educação, nas regionais, e encaminha casos para a Defensoria Pública ou Ministério Público.

Convocação

A evasão escolar também deve ser acompanhada pelos conselheiros. Quando o estudante falta à aula três vezes seguidas ou cinco alternadas, os pais devem ser notificados.

Foi o que aconteceu com a auxiliar de limpeza Mirian Teixeira Alves, de 24 anos. Moradora do Barreiro, ela e o marido foram convocados a comparecerem ao conselho. O filho do casal, de 9, se ausentou da escola, que fica a 40 minutos a pé da casa onde mora a família.

Segundo eles, as faltas foram necessárias porque faltou dinheiro para pagar o transporte. “O conselho é uma proteção correta da criança. Eu sabia que teria que vir me explicar. Estou tirando dinheiro para pagar a van, já que não há vaga na escola mais próxima da nossa casa”, afirmou a mulher.

Providências

Mirian disse que irá procurar a regional se não conseguir vaga para o menino estudar mais perto de casa no próximo ano. A solicitação, segundo ela, já teria sido feita. “É um direito nosso, e eles não nos dão essa condição”.

Em nota, a Secretaria Municipal de Educação informou que oferece todas as possibilidades para o aluno estar na escola. Sobre o caso relatado, a pasta disse haver necessidade de verificar o que está ocorrendo.

Além disso

A conselheira tutelar Marlise Ely Gonçalves, do Barreiro, afirma que a estrutura da política de inclusão às crianças não está preparada para a atribuição referente aos casos dos filhos de usuárias de drogas. “Mas não deixa de ser a nossa tarefa”, diz. Já Denise Dias, conselheira na Oeste, aponta que o fluxo maior irá dificultar o trabalho. “Não acredito que esteja em nossa atribuição falar se ela (mãe) pode ou não sair com a criança da maternidade, deveria ser responsabilidade da assistência social do hospital. Ajudaríamos de outra forma”.

Defensora pública da Infância Cível de BH, Adriane da Silveira Seixas frisa que o acompanhamento não é uma nova atribuição do conselheiro tutelar, pois está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “Se o conselho alega falta de estrutura para deixar de fazer algo que está na lei, temos que cobrar capacitação e pedir o empoderamento dos conselhos, já que existe um déficit no número de unidades”, reforça. Já Marcelo Moreira de Oliveira, presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, enfatiza que o ideal é a prevenção. “O encaminhamento para acolhimento institucional deve ser a última medida. As ações devem ser anteriores”, afirma.Editoria de Arte / N/A

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