Comunidade escolar dividida sobre ação contra suposta 'doutrinação' no Santo Agostinho

Bruno Inácio e Malú Damázio
horizontes@hojeemdia.com.br
26/11/2018 às 21:13.
Atualizado em 28/10/2021 às 02:23
 (Lucas Prates)

(Lucas Prates)

A discussão sobre o ensino de gênero e sexualidade no Colégio Santo Agostinho, em Belo Horizonte, ganhou novo capítulo. O Ministério Público (MP) ingressou com ação pedindo indenização por supostas aulas ministradas sobre o tema. A polêmica divide a comunidade escolar.

Segundo os promotores de Defesa dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes Celso Penna Fernandes Júnior e Maria de Lurdes Rodrigues Santa Gema, o conteúdo dado em sala estaria se referindo à “teoria de gênero”.

Na argumentação da ação, o MP afirma que a suposta implementação da “ideologia de gênero” poderia expor “inúmeras crianças a uma doutrina exótica e radical, contrária à própria natureza humana”. O texto diz que o colégio teria feito uma palestra para alunos do ensino médio, abordando um experimento sueco, em que crianças foram criadas sem diferenças de sexo. 

Segundo o órgão, essa postura, utilizada como “pretexto para uma suposta defesa da igualdade entre homens e mulheres”, expôs os estudantes a uma situação de “risco pessoal, doutrinando-os” com um tema que seria contrário à Constituição. Ainda conforme a argumentação, o colégio visaria “diminuir a importância da família e o papel dos pais na educação dos filhos”, ampliando o poder do Estado.

O Colégio Santo Agostinho informou, em nota, que a ação judicial “contém alegações absurdas, desconectadas da realidade e sem correspondência com a verdade”. A escola está tomando medidas judiciais cabíveis, “seja para nos defender contra as falsas alegações a nós atribuídas, seja para responsabilizar as pessoas e os agentes que estão divulgando essas mentiras”. 

Confusão

Em entrevista ao Hoje em Dia, o superintendente da Sociedade Inteligência e Coração, mantenedora da escola, acredita haver uma “grande confusão”. “O que debatemos é igualdade de gênero, de direitos iguais para homens e mulheres. Essa é a nossa vocação cristã, católica e, inclusive, em consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)”, diz ]Márcio Horta. 

O imbróglio começou em 2017, quando 128 pais de estudantes questionaram o colégio por supostamente incluir “ideologia de gênero” na proposta pedagógica e no material didático do 3º ao 6º anos do ensino fundamental. O Santo Agostinho nega abordar o assunto em aula.

Para o professor Teodoro Zanardi, especialista em educação da PUC Minas, os pais devem participar do processo pedagógico, mas o debate sobre temas atuais precisa ser acolhido. “A escola forma alunos comprometidos com a diversidade, e a tolerância está estabelecida em normas do Ministério da Educação”. 

De mesma opinião, o professor Paulo Nogueira, da Faculdade de Educação da UFMG, afirma que “não falar de diversidade é dar um cheque em branco para a violência”.

O MP pede indenização coletiva no valor das matrículas e mensalidades de 2017 de todos os alunos dos 3º ao6º anos, pelo “risco a que foram expostos”. O dinheiro seria destinado ao Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente de BH

Repercussão

Mãe de um menino de 9 anos que estuda no Santo Agostinho, Vírginia Larage diz não ver necessidade de tratar o tema com crianças. “O melhor seria no ensino médio”. “Acredito que, primeiro, é preciso debater entre os pais para depois ser falado na escola”, completou Bruna Saldanha, que tem uma filha de 10 anos matriculada no colégio.

Renata Pessamilo frisa que o tema deve ser discutido entre os estudantes. “É muito importante falar sobre igualdade. Ideologia de gênero é outra coisa. Sei que isso não é debatido na escola, acompanho tudo”, afirmou a mulher, mãe de uma menina de 9 anos.

Em apoio ao colégio, o Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG) defendeu o ensino de gênero, uma vez que as instituições educacionais devem “preparar os alunos para um mundo tão plural e diverso”, informou, por meio de nota. 

Esse seria o trabalho que os funcionários do Santo Agostinho buscam realizar, observou uma educadora que trabalha no local e pediu para não ser identificada. “Estamos tranquilos por seguir as normas da lei e da missão da escola, mas desgastados em ter que repetir sempre que não tratamos de ideologia de gênero, apenas de igualdade”, afirmou.

Procurados, os promotores que assinam a ação civil não quiseram se manifestar sobre o caso. Em nota enviada à imprensa na noite de ontem, porém, a Promotoria de Defesa do Direito à Educação sustenta que a denúncia não compete aos representantes dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes. Por isso, um pedido para a suspensão do processo foi solicitado.

O Tribunal de Justiça informou que a ação está em fase de tramitação, sem previsão de julgamento.

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