'Creche dos maridos': quadro em cervejaria de shopping em BH gera polêmica sobre machismo

Juliana Baeta
29/07/2019 às 16:21.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:45
 (Arquivo pessoal )

(Arquivo pessoal )

Um quadro na entrada de uma unidade da cervejaria Backer no Shopping Del Rey, na região Noroeste de Belo Horizonte, que sugere que os maridos devem ficar "relaxando" e bebendo cerveja enquanto as mulheres fazem compras, tem gerado polêmica em grupos de WhatsApp. "Ele não gosta de fazer compras? Precisa respirar? Temos a solução. Deixe ele aqui! É grátis. Cobramos somente o consumo!!!", diz o anúncio, flagrado no fim da tarde desse domingo (28), pela assistente de gerente logística Giselle Pâmela Porto, de 30 anos, que passou o dia no mall com o marido e as duas filhas, de 2 e 5 anos. 

"Eu achei de um extremo machismo disfarçado de marketing. E justamente neste dia foi o meu marido que havia sugerido de irmos ao shopping com as crianças e nós só estávamos indo embora porque eu já estava esgotada. É um retrocesso este posicionamento, porque nos dias de hoje, é bem mais comum que os homens estejam mais presentes na rotina da casa", conta. 

Segundo Giselle, o marido costuma gostar mais de ir ao shopping do que ela. "Eu não vou nem dizer que sou uma mulher de sorte, porque não acho que ele me 'ajuda' em casa. As obrigações são iguais e lá em casa é tudo dividido, inclusive a criação das nossas filhas. E assim, se o seu marido aceitou ou propôs ir ao shopping, ele vai chegar lá e ficar entediado por quê? Ele não está sendo obrigado a isso. Ele precisa sair para respirar? A gente faz tanta coisa no dia a dia que nos deixa entediadas e que não gostamos de fazer, mas infelizmente não dá pra sair e dar uma respirada, né?", comenta.   

No entanto, o posicionamento contrário à inscrição no quadro, apesar de ser compartilhado por muitas mulheres e mães, não é uma unanimidade entre elas. A empresária e mãe Thaís Helena Saraiva, de 39 anos, por exemplo, achou a ideia divertida. "Eu achei de extremo bom humor, porque homem realmente não tem a menor paciência quando as compras são femininas e não têm obrigação de acompanhar. Inclusive, se eu estivesse no shopping com meu marido e ele visse essa placa, ia largar a minha mão na mesma hora e dizer que achou o lugar dele. E eu ia achar ótimo, só ia pedir o cartão dele pra fazer compras enquanto isso", brinca a empresária.

Especialistas apontam machismo

O professor de psicanálise Evaristo Magalhães, do curso de psicologia da Faculdade Promove, entende que a placa ajuda a perpetuar estereótipos de gênero. "Isso reforça um padrão de que a mulher compra muito, é consumista e de que o shopping foi feito para ela, enquanto o lugar do homem é no bar. E isso não é uma regra. Mas ainda que fosse, qual o problema de algumas mulheres gostarem de fazer compras? Por que moralizar e julgar isso como algo chato ou entendiante? Há algo de misógino nesta placa, sim", comenta.

A coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa Sobre a Mulher da UFMG, Marlise Matos, lembra que o machismo também mora nos detalhes. "Por mais que pareça uma piada ou um chiste, uma coisa pequena, é aí que a lógica estrutural da opressão de gênero se manifesta. Não é somente na facada do feminicídio. São estas pequenas dinâmicas que mostram que há uma assimetria nos papéis de gênero na sociedade, dentro da lógica do patriarcado estrutural. Sem falar neste processo nítido de infantilização do homem enquanto à mulher cabe o papel da maternagem, do cuidado", esclarece.   

O que dizem a cervejaria e o shopping 

Procurada pela reportagem, a Cervejaria Backer respondeu que "não apoia qualquer manifestação machista ou preconceituosa. A iniciativa partiu do ponto de venda, que já retirou a placa e pede desculpas pelo ocorrido, além de reiterar que não houve qualquer intenção de ofender ninguém". 

Já o Shopping Del Rey, por meio de nota, informou que "embora não tenha qualquer participação na ação realizada pelo lojista, repudia qualquer tipo de discriminação, atos ou mensagens machistas. A administração já orientou o operador para retirar ou alterar o conteúdo de divulgação do estabelecimento".

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