Depoimentos de terceirizados confirmam vazamento em barragem meses antes de tragédia em Brumadinho

Rosiane Cunha*
15/07/2019 às 21:26.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:33
 (ALMG/Divulgação)

(ALMG/Divulgação)

Funcionários das empresas terceirizadas que prestavam serviços para a Vale em Brumadinho, na Grande BH, foram ouvidos pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na tarde desta segunda-feira (15), e reforçaram que a mineradora sabia dos riscos de rompimento.

No dia 25 de janeiro deste ano, a barragem na mina Córrego do Feijão se rompeu, causando um dos maiores desastres socioambientais do país. Até o momento, 248 corpos de vítimas já foram identificados e outras 22 vítimas continuam desaparecidas.

Segundo a ALMG, a Alphageos Tecnologia Aplicada foi responsável pela instalação, entre abril e junho do ano passado, dos drenos horizontais profundos (DHPs), sugeridos pela empresa de auditoria Tüv Süd para retirar água de dentro da estrutura.

Em 2017, foi contratada a empresa Fugro In Situ Geotecnia, que instalou os piezômetros dentro da barragem, que são instrumentos usados para medir a pressão de líquidos dentro da estrutura. E a Reframax Engenharia foi acionada pela mineradora para atuar no vazamento de água e lama, ocorrido após um fraturamento hidráulico que seria decorrente da instalação do 15º dreno no local.

Durante o depoimento o ajudante Antônio França Filho, da Reframax Engenharia lembrou os momentos de terror que viveu durante o rompimento. Ele estava na Instalação de Tratamento de Minério (ITM), que fica 7 metros acima da barragem e ficou preso em ferragens de equipamentos. 

O ajudante contou que por duas horas ele gritou por socorro e foi ouvido por colegas que voltavam de uma mina vizinha. “Eu não sabia o que estava acontecendo. Quando a poeira baixou que percebi que estava preso. Gritava pelos colegas e não tinha resposta”, relatou Antônio. 

Ainda de acordo com o ajudante, ele trabalhou na tentativa de solução de um vazamento ocorrido em junho do ano passado. Durante quatro dias, ele ajudou a retirar os rejeitos drenados da barragem.

Dos 59 empregados da empresa que prestavam serviço na mina, 37 morreram na tragédia.

Outro depoimento foi do gestor de produção da Reframax, Romero Xavier, que passou a exercer a função em dezembro de 2018. Ele não chegou a trabalhar no vazamento, mas disse que por dois dias levou funcionários para executar os trabalhos no local. Ele afirmou ter participado de treinamentos para autossalvamento promovidos pela Vale e que a fuga levaria entre 8 e 20 minutos, dependendo do ponto em que estariam.

O relator da CPI, deputado André Quintão (PT) criticou o plano de fuga oferecido pela mineradora uma vez que a lama demorou cerca de 34 segundos para atingir a área administrativa. “Fica claro que o vazamento não foi simples, corriqueiro, como a Vale tenta demonstrar”, afirmou Quintão.  

Já o diretor de operações da Alphageos Tecnologia Aplicada, Marcelo dos Santos, contestou a informação de técnicos da Vale de que o 15º dreno tenha causado um fraturamento hidráulico na estrutura da barragem. Ele  explicou que o equipamento nem chegou a ser instalado. Segundo o funcionário, a perfuração foi feita com uma broca com água, que deveria retornar à medida que rompesse a estrutura. Mas, naquele momento, começou a vazar a dez metros de altura. Ele acredita que já havia uma perfuração anterior, que serviu de escape para a água. Após esse problema, o trabalho foi suspenso e não mais retomado.

A geóloga da Fugro In Situ Geotecnia, Laís Antonelli, contou que a empresa foi contratada em 2017 para atuar em várias minas da Vale. Os serviços previstos no contrato foram 14 sondagens geotécnicas e instalação de 40 piezômetros e quatro inclinômetros. Ela disse que na mina B1 do Córrego do Feijão, foram instalados todos os inclinômetros e 20 piezômetros, a partir de setembro de 2018. O restante deveria ser implantado até fevereiro de 2019, mas não deu tempo.

Ela também foi questionada sobre informações de dirigentes da Vale, os quais, confrontados com dados preocupantes apontados pelos piezômetros pouco antes da tragédia, declararam que havia falha nessas medições. A geóloga disse que não poderia responder por piezômetros que já estavam instalados no local, mas somente pelos que a Fugro In Situ implantou a partir de 2018, os quais ela garantiu terem funcionamento adequado. E que o monitoramento desses instrumentos não cabia a ela, mas à área de engenharia da Vale.

A reportagem do Hoje em Dia não conseguiu contato com as empresas terceirizadas. Nós também entramos em contato e aguardamos uma posição da Vale sobre os depoimentos.

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