Empresa tem bens bloqueados por danos à Serra da Canastra

Hoje em Dia*
09/04/2015 às 18:59.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:34
 (serradacanastra.com.br/Reprodução)

(serradacanastra.com.br/Reprodução)

A empresa vencedora de uma licitação para a recuperação de estradas no Parque Nacional da Serra da Canastra, na região Sul de Minas Gerais, a GPO-Gestão em Projetos e Obra Ltda., assim como os sócios-proprietários José Bonifácio Pinto Júnior e Sávio Rubens Souza Andrade, tiveram os bens bloqueados nesta quinta-feira (9) pela Justiça Federal, devido ao abandono da obra e danos ambientais.   Segundo o Ministério Público Federal (MPF), que fez o pedido da ordem judicial é para assegurar a recuperação de gravíssimos danos ambientais na reserva natural. O órgão informou que a empresa foi contratada pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), empresa vinculada ao Ministério da Integração Nacional, para a execução de obras e serviços de recuperação e reforma de estradas e acessos no Parque da Canastra.    As obras, orçadas em mais de R$ 51 milhões, tiveram início em maio de 2013 e foram suspensas poucos meses depois, no último bimestre daquele ano, deixando para trás o assoreamento de cursos dágua que alimentam a bacia do São Francisco, a poluição de águas que abastecem populações locais e a queda de barreiras e erosão do solo, entre outros danos ambientais.   “A interrupção, que, na verdade, constituiu verdadeiro abandono das obras, expôs de maneira drástica os inúmeros vícios construtivos: erros grosseiros, perceptíveis até mesmo para leigos, sobretudo nas dragagens e aterros, com descumprimento do projeto e de normas técnicas, além de intervenções visivelmente temerárias”, afirma o procurador da República Gustavo Henrique Oliveira, autor da ação cautelar, proposta no último dia 24 de março.   Na ação , o MPF pediu que a Justiça Federal expedisse mandado de busca e apreensão no canteiro de obras e no escritório da empresa, sediado no município de São Roque de Minas, para impedir o extravio de documentos e viabilizar tecnicamente a recuperação emergencial das obras por terceiros.   O juízo federal de Passos/MG concordou com o pedido e determinou a busca e apreensão de todos os documentos, mídias, equipamentos, computadores, discos rígidos e registros, especialmente o Diário de Obras, relacionados ao projeto de reforma da estrada. Ele explicou que a medida fez-se necessária, diante “da evidente recalcitrância da empresa GPO em franquear acesso aos mesmos, bem como os sólidos indícios de que, com o encerramento unilateral do contrato, urde-se uma blindagem dos arquivos que constituirão eventualmente o eixo das aferições de responsabilidade técnica, financeira e ambiental”.    Foi expedida também ordem judicial de bloqueio de bens da empresa e de seus administradores, com a suspensão de qualquer repasse de verbas federais à GPO. O depósito de eventuais créditos a que a empresa tenha direito em razão de contratos celebrados com o Poder Público federal deverá ser feito em juízo.   A reportagem tentou contato com a GPO e seus proprietários, mas eles não foram localizados.   Histórico   Segundo o MPF, o comportamento da empresa foi negligente com recursos públicos. Após dois meses de assumir a obra, a Codevasf emitiu relatório apontando erros de execução do projeto, como taludes de corte e aterro sem os devidos direcionamento e apoio da equipe topográfica.    Em reunião realizada em agosto de 2013, a empresa pública também se queixou do descumprimento, pela GPO, de obrigações contratuais, como a construção de um canteiro de obras aparelhado e de pátios para manutenção de máquinas, além de inúmeros outros problemas, como insuficiência da resistência do concreto utilizado pela empresa, insuficiência do grau de compactação dos aterros, má execução dos bueiros e desqualificação da equipe de técnicos em campo.   Após receber, no mês seguinte (setembro de 2013), notificação extrajudicial para correção das irregularidades, ao invés de acolhê-la, a GPO tentou emplacar aditivos contratuais, um deles de custo superior a 5,9 milhões de reais, que, se aceito, teria impacto multiplicador sobre todo o empreendimento. A Codevasf indeferiu os aditivos, mas acabou acatando o pedido da empresa de suspensão das obras por 120 dias, com retorno previsto para março de 2014.   “O que se viu nos meses finais de 2013 e ao longo de todo o ano de 2014 foi a evidente desídia da GPO, que não tomou qualquer cuidado para evitar os danos ambientais na principal estrada do parque. Mesmo após autuação dos órgãos ambientais e por mais de 15 meses após a paralisação da obra, a empreiteira quedou-se inerte, deixando não só os danos se agravarem, como descumprindo seguidos compromissos de efetuar as devidas reparações. Nesse período, a despeito das insistentes tratativas, reuniões, prorrogações de prazos e concessões, a GPO não tomou nenhuma medida para contenção dos danos”, relata o procurador da República.   Parque fechado   Devido ao abandono da obra, houve bloqueio do acesso ao Parque Nacional da Serra da Canastra, causando transtornos e prejuízos diretamente nos serviços de manutenção, monitoramento, proteção, visitação pública.   A resposta da GPO à notificação extrajudicial foi a de que os serviços foram executados “dentro do mais alto padrão de qualidade”.   Mas não foi o que encontrou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que, em novembro de 2013, autuou e notificou a empresa a realizar reparos na estrada em virtude de determinados pontos críticos, entre eles, pontos de drenagem inacabados (a terra mal compactada estava sendo carreada para cursos dágua); aterros com compactação insuficiente (permitindo a erosão e risco à segurança das pessoas); alta declividade dos taludes e fragilidade do solo (causando quedas de barreiras) e grande quantidade de material causando assoreamento do rio do Peixe e do Córrego Estiva, responsável pelo abastecimento hídrico na cidade de São Roque de Minas. Os intensivos processos erosivos impactaram inclusive as populações de pato mergulhão, espécie de ave em extinção que somente se alimenta em ambiente de águas cristalinas.   Apesar disso, a empreiteira continuou afirmando que “sequer restou caracterizado a ocorrência de dano à unidade de conservação”, para, finalmente, em julho de 2014, um preposto da GPO reconhecer que sua equipe de campo “não estava correspondendo aos anseios da empresa referente ao padrão de qualidade que ela desenvolve em suas obras”.   O que parecia ser um sinal de que, finalmente, a empresa iria recuperar os danos ambientais, acabou frustrado. Passados oito meses daquela declaração, o ICMBio informou ao MPF que as obras continuavam abandonadas pela GPO e ainda alertou que o estado da via estava impedindo inclusive o combate a incêndios pelas viaturas de brigadistas, com graves avarias às viaturas utilizadas pelos técnicos do órgão de fiscalização ambiental.    A situação acabou levando, em janeiro de 2014, ao fechamento da visitação ao Parque Nacional da Serra da Canastra, gerando prejuízos também à economia local, que tem no ecoturismo sua principal fonte de renda. A prefeitura de São Roque de Minas, por exemplo, informou ao MPF que os hotéis e pousadas tiveram queda de 80% na ocupação de leitos.   No último dia 18 de março, a Codevasf resolveu rescindir unilateralmente o contrato com a GPO, o que motivou o MPF a ingressar com a ação cautelar para assegurar o resguardo de documentos que possam embasar futuro processo judicial.    Outro pedido feito pelo Ministério Público Federal e atendido pela Justiça Federal foi o de obrigar a Codevasf a adotar medidas emergenciais, para recuperar a trafegabilidade mínima da estrada principal do parque, de modo a estancar os danos ambientais que se agravam há quase dois anos. As obras deverão ser iniciadas no prazo de cinco dias e deverão observar as diretrizes técnicas indicadas pelo ICMBio.   A decisão judicial também autorizou a prefeitura de São Roque de Minas a recuperar, de maneira emergencial e segura, os acessos ao Parque Nacional, com possibilidade de futuro ressarcimento do que o município gastar com as obras.   (* Com MPF)

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