Estímulo à troca de cartas e afetos une gerações em Belo Horizonte

Lucas Eduardo Soares
01/11/2019 às 21:43.
Atualizado em 05/09/2021 às 22:30
 (Maurício Vieira)

(Maurício Vieira)

Belo Horizonte, 2 de novembro de 2019

Caro leitor,

Sei que os últimos tempos não têm sido fáceis. Algumas notícias, tristes, apareceram neste jornal ao longo desta semana. Porém, aproveito o espaço para lhe contar uma novidade que já tem aquecido o coração de muita gente. O projeto “Carta pra você”, lançado no fim de outubro pelo Movimento Gentileza, em parceria com a Prefeitura de BH e os Correios. Já ouviu falar? Pois bem. Funciona assim: uma criança – ou até mesmo um adulto – matriculada na rede municipal escreve uma cartinha que deverá ser entregue a um idoso. O objetivo é promover interação entre as gerações, estimulando a troca afetiva.

Com o propósito de narrar as duas partes, acompanhei o caminho de uma carta feita por Ana Carolina Gonçalves, de 10 anos. A menina, que estuda na Escola Municipal Francisca Alves, no bairro Santa Terezinha, na Pampulha, pôs no papel os sinceros desejos endereçados à dona Maria Altina Ferreira, de 78. Em uma tarde chuvosa, ao lado dos colegas que também redigiam com empenho e dedicação – afinal, a letra precisa ser legível, alertava a professora –, a remetente mencionou que as pessoas, nos tempos atuais, não têm tido tempo para afetos.

 Maurício VieiraAna Carolina Gonçalves, de 10 anos, estuda na Escola Municipal Francisca Alves, no bairro Santa Terezinha

A flor vermelha na cabeça e o cuidado com as frases chamaram-me a atenção. No texto, Ana Carolina dizia que nunca era tarde para praticar gentileza e que o ato deveria ser feito com mais frequência. Dobrou o papel e guardou dentro do envelope, que me foi entregue para levá-lo à dona Maria. Eu e o fotógrafo Maurício Vieira até recebemos um “mimo”: uma caixa de chocolates, acompanhada por uma bela mensagem, e abraços, seguidos por uma breve sessão de selfies.

Emocionado com a atitude tão cativante, mal esperei para ver a reação da senhora que me receberia no dia seguinte no Instituto Geriátrico Afonso Pena (Igap), no Santa Efigênia. Ao entrar no hall, lá estava a sorridente Maria com uma camisa vermelha que brilhava. Nos levou para o quarto onde dorme há dois anos, quando veio de Divinópolis, no Centro-Oeste de Minas. Um adesivo marcava o nome dela na cama, que tinha um rádio ao lado. Ela falou que gostava de ouvir forró e até me convidou para frequentar o instituto, pois “havia muitas mulheres” e seriam necessários homens para formar duplas. Respondi que sim.

Quando soube o que eu levava, dona Maria ficou ansiosa para conhecer o conteúdo da carta. Revelou que não sabia ler, pois não aprendeu na roça, e me pediu que contasse o que estava escrito. Os olhos lacrimejados acompanharam a leitura. “Vai ficar comigo?”, perguntou, aos risos. “É claro que sim”, respondi, de pronto. Pegou o papel e guardou. Nos contou que ficou muito feliz e se mostrou animada ao saber que as colegas também receberiam, em breve, cartinhas: “É coisa linda demais”. Após abraços carinhosos, nos acompanhou de volta ao hall e se despediu. “Fala para ela vir me ver?”, solicitou.Maurício VieiraDona Maria ficou ansiosa para conhecer o conteúdo da carta

Naquele momento, percebi a potência dos gestos e das palavras sinceras. A gentileza, como havia aprendido com Ana Carolina, deve, mesmo, ser feita a todo momento. Afinal, como ela mesma diz, uma hora pode ser tarde demais.

Grande abraço, espero que nos encontremos mais pelas páginas do Hoje em Dia.

Com carinho,

Lucas Eduardo Soares

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