Falta de máscaras e luvas preocupa profissionais da enfermagem em Belo Horizonte

Renata Galdino
rgaldino@hojeemdia.com.br
24/04/2020 às 19:52.
Atualizado em 27/10/2021 às 03:21
 (UFMG/Reprodução)

(UFMG/Reprodução)

Para Lúcia*, que há mais de 15 anos se dedica à enfermagem, passar pelas portas do hospital público onde trabalha, em Belo Horizonte, é como ir para a guerra. A batalha é dupla, diz ela. Além de enfrentar diariamente o novo coronavírus, a profissional afirma temer pela falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), situação que, segundo a mulher, tem ocorrido desde antes da pandemia.

As queixas de ausência, restrição ou proibição de materiais como máscaras e roupas adequadas em unidades de saúde públicas e privadas, em Minas, subiram 30% em apenas uma semana, indo de 191 em 17 de abril para 250 até a última quinta-feira. Os dados são do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen).

Lúcia trabalha no Hospital Eduardo de Menezes, referência em infectologia no Estado. Segundo ela, o protocolo de uso dos EPIs vem mudando nas últimas semanas. Hoje, o mesmo capote (avental cirúrgico) e a mesma máscara são usados por 12 horas de plantão. Só as luvas são trocadas. “Entro por aquela porta (do hospital) e não sei se, depois de passar o ponto e subir as escadas, vou encontrar um equipamento para usar. Vivo em pânico”.

Crítica
Presidente do Conselho Regional de Enfermagem (Coren) – Seção Minas Gerais, Carla Prado diz que a situação dos profissionais é crítica, mas também reconhece a dificuldade de compra de EPIs tanto por órgãos públicos como privados.

A entidade, inclusive, levou quase um mês para adquirir 150 mil máscaras que estão sendo doadas aos trabalhadores. “O processo de licitação já estava finalizado.

O fornecedor ligou dizendo ter recebido outra oferta e que só mandaria a encomenda se cobríssemos o valor. Começou a leiloar o preço. Agora está havendo mais opção de onde comprar, o que está facilitando”, conta Carla.

A representante do Coren-MG revela que, das denúncias recebidas sobre falta de EPIs, a maioria vem de trabalhadores de unidades de saúde públicas, principalmente na região metropolitana. Ela conta que, nas vistorias, os gestores das instituições alegam estarem abastecidos com EPIs. “Mas sabemos que a realidade nem sempre é essa”.

Em BH, segundo Carla Prado, a fiscalização chegou a ser barrada nos centros de saúde. A entidade conseguiu liminar judicial para entrar nos postos.

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde alegou não ser responsabilidade do Coren-MG vistoriar supostos descumprimentos de obrigação trabalhista, como falta de entrega de EPIs. “Sua competência é a fiscalização do exercício da profissão, se o profissional é formado e inscrito no conselho. O município recebeu a decisão e irá cumpri-la”. A prefeitura diz não haver falta de EPIs na rede municipal de saúde.

Estão cadastrados no Conselho Regional da categoria de Minas Gerais 190 mil profissionais da enfermagem.

Além disso
Em nota, a Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig), responsável pelo Hospital Eduardo de Menezes, informou que os EPIs descartáveis (máscaras, capotes, gorros e luvas) devem ser utilizados por todos os profissionais no atendimento aos casos suspeitos e confirmados, quando necessitar de transporte ou circulação fora do quarto de isolamento. As máscaras recomendadas são as cirúrgicas, que não podem ser reutilizadas e devem ser trocadas se estiverem úmidas. 

Na rede, ainda segundo o comunicado, 31 servidores foram afastados por suspeita de Covid-19. Outros 20 tiveram confirmação da doença por meio de exame laboratorial, mas cinco ainda farão contraprova.

“A Fhemig vem recebendo entregas parceladas da SES-MG (Secretaria de Estado de Saúde), referente ao fornecimento de EPI e, até a presente data, não houve desabastecimento de nenhum EPI a nenhuma das unidades que compõem a rede, sendo que os estoques estão sendo verificados diariamente”.

‘A ficha só caiu quando chegou o primeiro paciente grave’

Há cinco anos como técnica de enfermagem em um hospital particular da capital, Sheila*, de 28, já atendeu a pacientes com suspeita do novo coronavírus onde trabalha. Apesar do que sabia sobre os outros países, ela afirma que a “ficha só caiu” quando o primeiro caso grave chegou à unidade.

“Foi preciso ver para acreditar o que realmente é essa doença, a gente se coloca no lugar do doente. Tinha pesadelo, estava adoecendo psicologicamente”, conta.

Pânico

Márcia*, de 38 anos, também diz que os primeiros dias de atendimento aos pacientes com sintomas de Covid-19 foram de pânico. Hoje, o maior medo é levar o vírus para dentro de casa. “Nos primeiros dias eu chegava ao serviço chorando. O apoio psicológico dado alivia. O problema é que esse vírus ainda é novo, não se sabe como será a manifestação dele”. *Nomes fictícios

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