Famílias já abandonam casas mesmo sem vistoria da Defesa Civil da capital

Renata Evangelista
rsouza@hojeemdia.com.br
29/01/2020 às 10:16.
Atualizado em 27/10/2021 às 02:28
 (LUCAS PRATES)

(LUCAS PRATES)

Mortes, deslizamentos e desmoronamentos têm levado pavor a famílias que vivem nas áreas atingidas pelas fortes chuvas em Belo Horizonte. Mesmo sem ter as casas oficialmente condenadas, muitos já abandonaram o próprio lar. Atualmente, 50 engenheiros da prefeitura atuam na vistoria e avaliação de riscos.

Palco de tragédia, a Vila Bernadete, na região do Barreiro, foi um dos locais mais atingidos pelo último temporal. Lá, foram sete óbitos de duas famílias. O aposentado José do Porto Alves, de 69, era vizinho das pessoas soterradas. Além do trauma, viu rachaduras surgirem na residência, que fica na rua 12.

Ele mora no local há mais de três décadas. “Nunca soube que o bairro era área de risco. A Defesa Civil e a Urbel (Companhia Urbanizadora de BH) estão verificando todo o quarteirão, mas, antes dos técnicos chegarem aqui, já decidi sair. A vida em primeiro lugar”, disse, bastante emocionado. Ontem, o idoso foi pegar alguns pertences, como a identidade.

Desde o último sábado, ele se mudou para a casa da filha, no bairro Milionários. “Ele, minha mãe e minha irmã caçula não voltam nunca mais (para o antigo endereço). Atrás do imóvel tem um barranco. Não vamos arriscar”, garantiu Renata Carlaite.
 LUCAS PRATES / N/A

SEM DORMIR – Terezinha tem pesadelos após a tragédia; com medo de um novo desastre, ela irá para a casa da irmã

Abrigo seguro

Quem também recorreu aos parentes para ter abrigo seguro foi Terezinha Basílica da Silva, de 65 anos. O medo e o luto ainda rondam a mulher, que tem pesadelos com os gritos de populares tentando socorrer as vítimas da chuva.

“Sinto muito em deixar minha casa. Porém, não tenho psicológico para continuar aqui. Estou provisoriamente lá na minha irmã, mas vou precisar de um canto para poder colocar minhas coisinhas. Não sei como fazer”, lamentou ela, que há 20 anos mora na Vila Bernadete.

Não bastasse sair de casa, alguns moradores ainda tiveram que abandonar o sustento da família. O casal Heli Donizette e Maria Helena da Cruz, de 63 e 61, deixou um imóvel e dois comércios. 

“Não arrisco minha vida e do meu neto, que vive comigo. Por isso, decidi sair antes mesmo da vistoria chegar. Mas a prefeitura terá que ajudar a custear uma moradia”, disse ela, que residia e trabalhava na rua 13, esquina do local da tragédia.LUCAS PRATES / N/A

RESISTÊNCIA – Hernani mora à beira de barranco; casa está com rachaduras, mas até a tarde de ontem ele não pensava em sair 


Apesar dos riscos, alguns resistem em sair dos imóveis

Muitos moradores decidem sair de casa, mas há quem resista a deixar para trás o fruto de uma vida inteira. Morando à beira de um barranco, o marteleiro Hernani Moreira da Silva, de 36 anos, garante não largar o único bem que possui.

A residência dele, na rua dos Esportes, fica ao lado do local do desabamento que matou as sete pessoas. A vistoria do imóvel ainda não foi feita, mas os riscos saltam aos olhos de quem observa o local. 

Desde a tragédia de sexta-feira, trincas e rachaduras surgiram na cozinha, muro, banheiro e área externa. O quintal, que tem plantações de seriguela e goiaba, por muito pouco não foi levado pela avalanche de terra. “Medo até tenho, mas não quero ir morar na casa de parentes. Quero ficar no meu próprio lar. Deus vai proteger”, declarou. 

A mãe do marteleiro, a doméstica Auri Moreira da Silva, de 60, está apavorada com a decisão do filho. “Nem durmo à noite”, revela. A residência dela também fica próxima ao barranco que cedeu. O desejo da mulher é deixar o local o mais rápido possível. “Sempre que chove, fico desesperada. Meu sonho é sair daqui, mas enfrento a resistência do meu marido. Por enquanto, não tenho condições de comprar outra residência”, contou.

A Vila Bernadete existe há 50 anos e não foi considerada prioritária para atendimento na sexta-feira, antes do deslizamento. Moradores tentaram acionar a Defesa Civil, mas não foram atendidos a tempo. 
 

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​Trabalhos

Desde a tragédia, agentes da Defesa Civil vistoriam imóveis na Vila Bernadete. Pelo menos 20 já foram interditados, conforme um funcionário da Urbel. A Defesa Civil admitiu que a área não era considerada de risco. Porém, destacou que houve alteração no terreno por causa das construções irregulares. O solo ficou mais vulnerável devido à quantidade de água.


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