Lei que proíbe o cerol completa 15 anos com muitos feridos e pouca fiscalização

Tatiana Lagôa
tlagoa@hojeemdia.com.br
23/06/2017 às 18:29.
Atualizado em 15/11/2021 às 09:13
 (Arquivo Pessoal/Divulgação)

(Arquivo Pessoal/Divulgação)

Um garotinho de apenas 5 anos sai para brincar com o pai e morre após ter o pescoço atingido por uma linha de pipa produzida com materiais potencialmente cortantes. Poucos dias depois, um jovem, de 18, é detido pela polícia com 19 mil metros da mesma linha que seriam comercializados. 
Em menos de uma semana, uma tragédia ocorrida em Ibirité, na Grande BH, e um flagrante em Venda Nova, na capital, lançam luz a um crime praticado livremente nas ruas de Minas Gerais.

A utilização do cerol ou de linha chilena foi proibida há 15 anos no Estado. Lei de julho de 2002 prevê multa de até R$ 1.500 para quem portar o material. Além disso, segundo a Polícia Civil, o Código Penal qualifica o uso como crime passível de prisão. 

Em BH, o cerol é proibido desde 1996; lei também prevê multa e até cassação de alvará para estabelecimentos que o vendem

A norma determina que a fiscalização seja feita pelo Corpo de Bombeiros em conjunto com a Polícia Militar (PM) e as guardas municipais. No entanto, os próprios órgãos de segurança admitem a dificuldade em fazer o monitoramento.

Sem o cerco, uma brincadeira inocente é suja de sangue, tira vidas e leva centenas de pessoas a pedir socorro nas unidades de saúde. 

Referência em atendimentos de urgência no território mineiro, só o Hospital de Pronto-Socorro (HPS) João XXIII atendeu 488 pessoas feridas por cerol de 2005 a 2016. Os dados são da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig).

E o alerta é ainda maior nesta época do ano. Em julho, os ventos são mais propícios para empinar pipas e as crianças entram em férias escolares. “Observamos, estatisticamente, que nesse período o número de acidentes é maior. Todo cuidado é pouco”, afirma o tenente dos Bombeiros Pedro Aihara.

Fiscalização

A fiscalização não é tão simples. Como o cerol é feito em casa, a polícia teria que analisar cada material utilizado nas ruas. “O uso e venda desses produtos são comportamentos difíceis de ser fiscalizados e combatidos. A eficácia da lei é comprometida pela dificuldade de analisar cada uma das linhas em uso no Estado”, acrescenta o tenente.

“É difícil a fiscalização porque é um problema cultural, passado de pai para filho, além de ser pulverizado. Mas a Polícia Militar tem feito apreensões e prisões nas áreas de risco, como próximo às rodovias”, afirma o chefe da Sala de Imprensa da PM, major Flávio Santiago. 

A Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais não apresentaram dados sobre essas prisões.

Mistura perigosa é temida por motociclistas; riscos também para a rede elétrica e pedestres

O cerol e as linhas chilenas oferecem risco a qualquer pessoa, mas são os ciclistas e motociclistas as vítimas mais frequentes. A velocidade com que passam pelo material cortante é uma das justificativas, o Corpo de Bombeiros.

Motoboy há 12 anos, Emerson de Melo Faria, de 38, sentiu na pele esse perigo. “Eu estava na avenida Antônio Carlos. Quando senti a linha, me joguei na moto. Foi o que me salvou”, conta. A atitude impediu que o acidente fosse fatal, mas não evitou o corte no pescoço, que demandou dez pontos para ser fechado.

“É um acidente que pode acontecer com qualquer um que trabalha nas ruas. E não vejo as pessoas sendo presas por uso de linhas cortantes”, afirma o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Motociclistas e Ciclistas de Minas Gerais, Rogério dos Santos Lara.

Ele lembra que, nesse contexto, o uso de anteninhas nos veículos é extremamente necessário. “Temos que tomar cuidados para nos proteger. Sempre que tem criança soltando pipa há um risco para quem pilota motos”, conclui. 

Outro risco potencial é o de corte dos fios da rede elétrica. Segundo a Cemig, só nos quatro primeiros meses deste ano foram 663 ocorrências de interrupção no fornecimento de energia elétrica. Cerca de 240 mil consumidores ficaram prejudicados em todo o Estado.

Engenheiro da companhia elétrica, Demetrio Venicio Aguiar diz que pode acontecer de a própria pessoa que está segurando a linha tomar um choque ou de o fio cair energizado sobre outro pedestre na rua. O acidente pode levar a um choque leve ou até mesmo à morte.

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