Mais de 470 milhões de animais morrem atropelados todo ano no país

Raquel Ramos - Hoje em Dia
05/07/2015 às 10:58.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:46
 (Leonardo Merçon/)

(Leonardo Merçon/)

Verdadeiras armadilhas para a fauna silvestre, as estradas tornam-se ainda mais perigosas para os animais durante o inverno. É nesta época do ano que aumentam os casos de incêndios florestais, favorecidos pelo tempo mais seco. Para fugir do fogo, muitos bichos atravessam movimentadas rodovias e são atropelados.

O problema é tão grave que pesquisadores já consideram a morte por atropelamento como a segunda maior causa de perda da biodiversidade da fauna no Brasil e no mundo. Em primeiro lugar, está a supressão e redução de ambientes naturais.

Os números mostram a dimensão da violência. Com base em artigos científicos, o Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas (CBEE) estimou que, em média, 15 animais são vítimas de atropelamentos nas estradas brasileiras a cada segundo. Em 365 dias, são 473 milhões de óbitos.

Minas é um dos estados que mais contribui para as estatísticas, afirma Alex Bager, coordenador do CBEE e professor do Departamento de Biologia da Universidade Federal de Lavras (Ufla). “Aqui está a maior malha viária do Brasil e, consequentemente, as ocorrências tornam-se mais frequentes”.

O perigo não existe apenas para os bichos. A presença de animais de grande porte em rodovias também coloca em risco os motoristas. Os dados mais recentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF), de 2013, revelam que 549 ocorrências do tipo foram registradas nas BRs mineiras naquele ano.

Algumas medidas poderiam reduzir os impactos. “É possível criar passagens de fauna, como túneis subterrâneos ou uma espécie de ‘passarela’ no alto, unindo copas de árvores para os primatas”, exemplifica Alex. Placas alertando para a travessia de bichos e redutores de velocidade em pontos estratégicos também são fundamentais.

Em nota, o Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER-MG) informou que tem executado ações de proteção ao meio ambiente, como as citadas acima.

Administradora de 936 quilômetros da BR-040, entre Juiz de Fora e Brasília, a Via 040 também está dando os primeiros passos na tentativa de proteger os animais silvestres. Foram instaladas 40 placas indicando a travessia de fauna. Agora, a concessionária estuda a viabilidade de criar passagens para os bichos.

“Estradas levam progresso, mas ele não pode existir a qualquer custo. No futuro, ao enfrentarmos problemas por desequilíbrio ambiental, perceberemos o preço alto disso” - Leonardo Merçon, Presidente do Instituto Últimos Refúgios

Apesar de algumas ações já estarem sendo executadas nas estradas mineiras, Maria Dalce Ricas, superintendente executiva da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda), considera que as iniciativas ainda são tímidas. “A construção de uma nova rodovia só poderia ser permitida mediante licenciamento com estudos de impacto ambiental”, pontua. E o rigor para autorizar a construção de novas estradas deveria ser maior nos locais que cruzam ou margeiam áreas de proteção ao meio ambiente, defende Dalce.

Para o presidente do Instituto Últimos Refúgios, do Espírito Santo, Leonardo Merçon, as estradas não podem cortar uma reserva, ignorando que esse processo destrói o habitat de vários bichos. “A presença de animais é menor em áreas já degradadas. Mas alguns trechos são considerados hotspot (zona quente) de biodiversidade. São patrimônios naturais e abrigos para várias espécies ameaçadas de extinção”, argumenta Merçon.

Em Minas, várias rodovias já atravessam áreas de grande relevância para o meio ambiente, critica Dalce. De um lado da MG-010, por exemplo, encontra-se o Parque Nacional da Serra do Curral e, do outro, a Área de Proteção Ambiental Morro da Pedreira.

De forma semelhante, a BR-040 passa pelo Parque Estadual de Paracatu, pelo Monumento Natural Serra da Moeda e outros corredores ecológicos.

Consequências

O impacto vai além dos atropelamentos. “Os animais precisam se deslocar para sobreviver, seja para caçar ou até reproduzir. As rodovias fragmentam o habitat deles”, diz Alex Bager, da Ufla. Como consequência, as espécies que não atravessam as estradas também acabam sendo afetadas. “Ficam presas a uma área menor do que a que precisam para viver. Morrem porque não têm alimento e sequer percebemos isso”, afirma Bager.

Além disso, acrescenta Leonardo Merçon, a presença de uma rodovia facilita o acesso de caçadores, aumenta a quantidade de lixo nas proximidades dos parques e, ainda, contribui para o aumento de incêndios florestais.

Em Brasília, o Projeto de Lei (PL) 466, de 2015, quer tornar obrigatória a adoção de várias medidas que possam assegurar a circulação segura de animais silvestres no Brasil.

Dentre as ações previstas está a criação de um cadastro público para registro de todos os incidentes envolvendo a fauna, fiscalização constante nas áreas com maior incidência de atropelamentos, bem como a exigência de estudos de viabilidade de impacto ambiental para construção, reforma e duplicação de rodovias ou ferrovias.

Audiências públicas já foram realizadas para debater o assunto e, no momento, o PL está sendo analisado pela Comissão de Viação e Transportes, da Câmara dos Deputados. A expectativa, segundo a assessoria de imprensa do deputado Ricardo Izar, autor do projeto, é a de que o texto seja colocado para votação em agosto.

Aplicativo

Enquanto não há uma lei que exija a criação de um banco de dados sobre mortes de animais em rodovias brasileiras, o professor Alex Bager, do Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas, tenta coletar informações com ajuda de usuários de todo o país.

Por meio do aplicativo Urubu Mobile, disponível para Android e iPhone, qualquer pessoa pode registrar o atropelamento de animais. Todos os dados são avaliados por pesquisadores e especialistas em identificação de espécies. Atualmente, 14,5 mil pessoas já estão envolvidas nessa causa, informou Bager.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por