Mais verde sob ameaça: fogo tem sido o principal inimigo do Rola-Moça

Raquel Ramos - Hoje em Dia
27/09/2014 às 09:05.
Atualizado em 18/11/2021 às 04:22
 (Eugênio Moraes/Hoje em Dia)

(Eugênio Moraes/Hoje em Dia)

O fogo castiga o Parque Estadual da Serra do Rola-Moça, uma das mais importantes áreas verdes do Estado. De janeiro para cá, já foram 102 focos de incêndio transformando em cinza mais de 100 hectares da reserva, que completa neste sábado (27) duas décadas de existência. A agonia é agravada pela invasão de ervas daninhas, como o capim meloso. Originária da África, a planta é uma das primeiras a ressurgir depois que as chamas são debeladas. Além de competir com espécies endêmicas, contribui para novas queimadas porque produz uma substância inflamável.   Há muitos anos os incêndios florestais são o principal inimigo da unidade de conservação. A maioria deles provocada pela ação direta ou indireta do homem, explica Rodrigo Bueno, diretor de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).    O episódio mais lamentável de incêndio foi registrado em 2011, quando as chamas consumiram 49% da cobertura vegetal. Naquele ano, a estiagem prolongada favoreceu novas ocorrências, num momento em que a natureza reconstruía as belas paisagens.    Dentre as características que fazem da reserva – o terceiro maior parque em área urbana do país, localizado na Região Metropolitana de Belo Horizonte – um lugar tão peculiar, está a presença de campos ferruginosos, vegetação muito rara e única em terras mineiras, segundo Marcus Vinicius de Freitas, gerente do parque.    O Rola-Moça é também reduto para dois biomas: Cerrado e Mata Atlântica. Esse último, diz o gerente do parque, resiste no Estado com apenas 3% da distribuição original.   Combate   Todos os esforços são feitos para conter o avanço das queimadas. No interior do parque, há um pelotão do Corpo de Bombeiros para atender os casos. Brigadistas populares também atuam, fazendo plantões dentro da reserva nos fins de semana, entre maio e outubro, detalha Marcus Vinicius.   A tecnologia também é uma aliada. A Semad tem equipamentos como motobombas com capacidade para 500 litros de água, além de aeronaves e helicópteros que auxiliam no combate às chamas.   “O atendimento é sempre rápido. Nem sempre, porém, a agilidade é suficiente. As condições climáticas influenciam muito na dispersão do fogo e a estratégia a ser adotada muda a cada ocorrência”, explica Rodrigo Bueno, diretor de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais da Semad.   Riqueza   A importância extrapola os limites dos quatro mil hectares de natureza, ressalta o biólogo Francisco Mourão, conselheiro da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda). E a extensa área verde cumpre o papel de amenizar o forte calor nos bairros que a cercam. “As nascentes que lá brotam abastecem parte de Belo Horizonte, Brumadinho e Ibirité”.   A proteção de toda essa riqueza só foi possível após a assinatura do Decreto 36.071/94 que, há exatos 20 anos, criou a unidade de conservação.    Espécies nativas inibem capim meloso   A origem do capim meloso dentro do parque só foi descoberta em 2012. Empreendimentos e áreas de mineração vizinhos à reserva cultivavam a espécie, que tem as sementes dispersadas pelo vento.   Após um longo trabalho de conscientização ambiental para tentar dar um fim à gramínea exótica, a solução para o problema está na plantação de espécies nativas do Cerrado e da Mata Atlântica, só que mais resistentes e capazes de competir com o capim meloso, a ponto de inibir seu crescimento. Pode-se levar uma década até que a unidade se recomponha desse mal.   Verde ressurge das cinzas após incêndios   Bastam as primeiras chuvas após um incêndio para que a natureza mostre o poder de recuperação. Ainda em meio às marcas de queimada e fuligem, gramíneas rebrotam, sementes voltam a se dispersar e, rapidamente, a paisagem se recompõe.   O impacto do fogo, porém, não pode ser medido apenas pelo olhar, afirma Francisco Mourão, biólogo e conselheiro da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda). As chamas provocam perda da biodiversidade e, a cada ocorrência, morrem animais e espécies da flora – algumas que, talvez, sequer chegaram a ser descobertas.   “As aves conseguem fugir, mas a época de estiagem coincide com o período de procriação delas. Os filhotes não resistem”. Anfíbios também estão entre os mais atingidos por dependerem de ambientes úmidos para sobreviver.   Comércio ilegal de espécies do parque ameaça a reserva   Os incêndios florestais não são o único desafio a ser enfrentado para garantir a conservação do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça. Atividades irregulares ameaçam a reserva e trazem prejuízos que mancham os 20 anos de existência da unidade.   “Muita gente vai ao parque aos fins de semana para coletar espécies botânicas. Orquídeas, bromélias e plantas medicinais como arnica são levadas e comercializadas”, afirma Marcus Vinícis Freitas, gerente do Rola-Moça.   Além do auxílio da Polícia Militar do Meio Ambiente para inibir a ação dessas pessoas, é feito um trabalho de conscientização para que não comprem as flores, incentivando o comércio ilegal de flora.   Outro problema, segundo o biólogo Chico Mourão, é o loteamento irregular de áreas que estão dentro dos limites do parque. “Hoje, cerca de 40 famílias integram a ocupação Solar do Barreiro. Infelizmente, poluem cursos d’água e trazem outros prejuízos ao meio ambiente”.   Além disso, acrescenta o especialista, a unidade de conservação precisa de resistir às constantes pressões de construtoras, que idealizam condomínios no meio da área verde.   Poema de Mário de Andrade deu nome à reserva   O nome do parque foi inspirado em um poema de Mário de Andrade. Na história, um casal cruzou a serra logo após a cerimônia de casamento. No caminho, o cavalo da mulher escorregou no cascalho e caiu no fundo do grotão. Desesperado, o marido também esporeou seu cavalo ribanceira abaixo e “a Serra do Rola-Moça, Rola-Moça se chamou”.   O parque abriga seis importantes mananciais de água – Taboões, Rola-Moça, Bálsamo, Barreiro, Mutuca e Catarina – declarados pelo Estado como Áreas de Proteção Especial.   Onça parda, jaguatirica, lobo-guará, gato-do-mato, macuco e veado campeiro são algumas das espécies de fauna presentes no parque que estão ameaçadas de extinção. Entre as espécies de flora, são encontradas orquídeas, bromélias, candeias, jacarandá, cedro, jequitibá, arnica e a canela-de-ema, que se tornou o símbolo do parque   As visitas devem ser feitas entre 8h e 17h. Atividades monitoradas, como trilhas e passeios pelos mananciais, trilhas e viveiros, precisam ser agendadas previamente pelo telefone (31) 3581-3523.

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