Moradores do Vista Alegre denunciam cobrança por descarte irregular de entulho de construção

Ricardo Rodrigues - Hoje em Dia
24/10/2015 às 08:09.
Atualizado em 17/11/2021 às 02:12
 (CARLOS HENRIQUE)

(CARLOS HENRIQUE)

“Está recebendo material aí? Tenho um caminhão de coleta e quero saber quanto você cobra”. A resposta é imediata: “R$ 60, e dou prazo de dez dias para o pagamento”, diz Adair Linhares, por telefone.

O valor é para receber 5 metros cúbicos de entulho, o equivalente a uma caçamba lotada. O dono do estabelecimento admite que não tem alvará de funcionamento do que ele chama de “transbordo” e nem licença ambiental para operar com resíduos sólidos urbanos. “Não está em situação legalizada”, reconhece.

Quem desce a Via do Minério se depara com o local de desova de lixo abaixo da linha férrea, na margem direita do Anel Rodoviário, perto de barracões que proliferam da noite para o dia no bairro Vista Alegre, região Oeste de BH. Linhares diz que tem “mais de 300 caminhões lá dentro”, o equivalente a pelo menos 300 toneladas de entulho.

“Não tenho lucro, estou tirando o material para evitar multa”, diz. Ele informa que o tudo será levado para o aterro “Ramires, atrás da Fiat”, em Betim. Porém, não informa qual o custo dessa operação.

O valor de R$ 60 que ele pede para receber o entulho é bem menor do que o de mercado. Filiadas ao Sindicato das Locadoras de Equipamentos, Máquinas, Ferramentas e Serviços (Sindileq-MG) cobram de R$ 140 a R$ 230 por cada caçamba de 5 metros cúbicos. Por R$ 200, a Caçamba Lima, por exemplo, recolhe e leva o material para “bota-fora licenciado de Betim”. A Cebola, que atua na região Norte de BH, cobra R$ 140. O preço sugerido pela Caçamba Ltda, na Pampulha, é R$ 230, e o destino é o aterro Areias, em Pedro Leopoldo.

RISCOS

O bota-fora do Vista Alegre tem incomodado os vizinhos, mas nunca foi alvo de fiscalização da Superintendência de Limpeza Urbana (SLU). Moradores da rua Pátio da Estação afirmam que a quantidade de ratos, baratas e escorpiões aumentou desde 2014.

A redução de três para duas pistas na descida do Anel, próximo ao cruzamento com a avenida Teresa Cristina, aumenta o risco de acidentes. Caminhões param no local aguardando para descarregar o lixo. “Suja a marginal do Anel com resíduos que caem das caçambas”, reclama um comerciante.

O bota-fora ocupa uma área pública, usada para descarte de entulho de todo tipo, “inclusive bicho morto”, segundo Maria de Lourdes Ferreira, de 59 anos, moradora no bairro desde 1984.

“Tem oito meses que esse negócio (o bota-fora) tá aí. Eles põem fogo dia e noite. A roupa que eu lavo e ponho no varal, quando seca, está mais suja do que antes”, diz dona Lourdes. “Olha só como a gente tá vivendo. Isso parecia avenida, mas agora é só lixo e poeira. A prefeitura não vem mais roçar o mato no bairro”, acrescenta.

Bota-fora clandestino funciona em área invadida há 20 anos
 
Moradores do bairro Vista Alegre afirmam que a área do bota-fora foi invadida há 20 anos. Desde 2014, Adair Linhares estaria depositando resíduos no terreno.

Os vizinhos ao lixão dizem que Linhares cobra para receber o conteúdo das caçambas, tira sucata para vender no ferro-velho e leva para outros locais o que não tem proveito. Parte do terreno está alugada a terceiros, de acordo com comerciantes locais.

“Mais de dez caminhões despejam por dia lixo que não serve para reciclar”, diz Maria Lenir Fernandes, de 67 anos. Moradora no bairro desde 1975, ela reclama do mau-cheiro e da “fumaça fedorenta que fica agarrada na garganta”.

O estudante Kaíke Nunes, de 12 anos, é categórico: “Tem que tirar o lixão do bairro. A fumaça (da queima do lixo) vai pra dentro de casa, a rua inteira sofre com isso”.

Moradores afirmam que já denunciaram o lixão à Secretaria Estadual do Meio Ambiente, Polícia Militar Ambiental e Prefeitura de BH, sem sucesso. “Não resolvem nada, nem atendem o telefone. A PM atendeu, mas disse que não mexe com isso”, diz Maria Lenir.

REGULARIZADO
Presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB, Mário Werneck destaca que o único local regularizado para receber entulho e material de demolição é o Centro de Tratamento de Resíduos Sólidos da Construção Civil Maquiné, às margens da BR-381, em Santa Luzia, que tem capacidade de operar até 480 toneladas/dia.

“Os demais só podem receber terra, não resíduos. O Estado e as prefeituras não têm controle efetivo sobre a destinação final desses resíduos”, critica o advogado.

Consultados sobre o lixão no Vista Alegre, a SLU e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit) não se pronunciaram a respeito da fiscalização e a ocupação irregular das margens do Anel Rodoviário.
 

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