Número de presos provisórios em Minas cresce a cada ano e já supera o de condenados

Malú Damázio
mdamazio@hojeemdia.com.br
15/08/2018 às 15:37.
Atualizado em 10/11/2021 às 01:56
Policias penais tem prisão preventiva decretada por suspeita de tortura. (Wilson Dias/Agência Br)

Policias penais tem prisão preventiva decretada por suspeita de tortura. (Wilson Dias/Agência Br)

Mais da metade dos presos mineiros estão atrás das grades à espera de um julgamento definitivo, o que equivale a 58% do total de 71,7 mil detentos do Estado. O número cresce a cada ano e, em apenas sete meses de 2018, já superou o de aprisionados temporários de 2017. Na lista estão incluídos os condenados em segunda instância, mas que ainda podem recorrer aos tribunais superiores, em Brasília. Por outro lado, a quantidade de presídios em Minas caiu de 209 para 199 no mesmo período. A situação alarma especialistas da área.

Levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aponta que, em média, uma pessoa fica na penitenciária de cinco meses a quase três anos aguardando a definição da pena. Lentidão da Justiça para analisar processos, aumento da criminalidade, baixa aplicação de medidas alternativas e até pressão da população para que infratores sejam levados para a cadeia são fatores que explicam o cenário.

Volume de processos

O juiz aposentado Juarez Morais de Azevedo, que atuou na Vara Criminal e de Execução Penal de Nova Lima, na Grande BH, acrescenta ainda a maior participação de jovens em crimes, principalmente no tráfico de drogas. Membro do Conselho de Criminologia de Minas, o magistrado não acredita existir uma política de encarceramento, mas crescimento do volume de inquéritos a serem avaliados.

“Enquanto isso, o número de juízes, promotores e defensores não aumentou na mesma proporção. Também há um clamor da sociedade para que quem pratica delito seja preso. Se isso não acontece, ela fica revoltada”, diz.

Crime organizado

A situação pode favorecer, inclusive, a expansão do crime organizado. É o que afirma a pesquisadora Ludmila Ribeiro, do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), da UFMG, ao referir-se a detentos que cometeram delitos de menor potencial ofensivo e cumprem pena junto a acautelados mais perigosos, até mesmo membros de quadrilhas.

Segundo ela, um dos estudos feitos pelo órgão constatou um homem flagrado com 15 gramas de drogas e, mesmo alegando ser para consumo próprio, ficou em regime fechado. “Ele esteve três anos em uma unidade superlotada, sem material de higiene e sem fornecer fonte de renda para a família. Depois, outro juiz entendeu que ele não havia cometido o crime e o soltou. O que será que aconteceu quando esse rapaz voltou para a sociedade?”.

A pesquisadora explica que, em situações nas quais o processo é transformado em cumprimento de pena, inocentes podem ser inseridos no crime. “A família fica desestruturada, ele vive em condições precárias, tem o estigma de presidiário e acaba recorrendo ao crime organizado. O ideal seria que tivéssemos uma Justiça mais eficiente e que se ocupasse, de fato, com delitos graves”, afirma.

Segundo a Seap, detentos provisórios são de responsabilidade do TJMG

Medidas alternativas 

A prisão temporária divide opiniões entre especialistas. Presidente da Comissão Estadual de Assuntos Carcerários da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Fábio Piló afirma que deixar uma pessoa na cadeia à espera da sentença viola o princípio da presunção da inocência.

“A privação de liberdade deve ser a última medida nesses casos, não a primeira, como vem ocorrendo”, diz Piló, que defende aumentar a aplicação das medidas alternativas, como a tornozeleira eletrônica.

Já o desembargador da 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), Jaubert Carneiro Jaques, reforça que a detenção provisória é legal e, que na maior parte das situações, quem aguarda na penitenciária por uma definição é criminoso reincidente.

“Não estamos decretando prisões de inocentes. Casos insignificantes, como a mãe que no supermercado pega leite para amamentar o filho pequeno, nem chegam ao tribunal, são resolvidos antes, com recursos como o monitoramento eletrônico. Estamos tirando da sociedade pessoas de alta periculosidade”, afirma Jaques.

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