Polícia promete intervir para conter guerra entre traficantes

Aline Louise e Gabriela Sales - Hoje em Dia
30/01/2016 às 07:15.
Atualizado em 16/11/2021 às 01:14

Após o registro de tiroteios quase diários entre bandidos no maior Aglomerado de Belo Horizonte, a Polícia Militar (PM) tenta neste sábado (30) devolver a ordem ao complexo de favelas da região Centro-Sul, onde moram cerca de 46 mil pessoas. O Comando de Policiamento Especializado (CPE) promete enviar ao morro tropas preparadas para atuar em conflitos. Nessa sexta (29) de manhã, a polícia foi recebida a tiros na Praça do Cardoso, referência na região.

Vão participar da operação o Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) e o Batalhão de Choque. Desde segunda-feira, moradores convivem com tiroteios entre traficantes. Nessa sexta (29), foi em plena luz do dia, por volta das 10h, na esquina das ruas 21 de Maio e Bandonion, e terminou em confronto com a PM. Uma viatura foi atingida por tiros e um suspeito ficou ferido.

Criminosos impõem toque de recolher. Integrantes das gangues exibem em redes sociais fotos com armamento pesado, numa demonstração de poder e ousadia. Também são compartilhados áudios supostamente de traficantes, avisando que o morro está em “guerra”. “Evita passar na Serra, falou! A guerra estourou aqui, cabulosa, na pracinha do Cardoso”, alerta um deles.

Uma moradora da rua Corinto, no bairro Serra, que prefere não se identificar, diz que nesta semana foi acordada todos os dias de madrugada, por volta das 2h, pelo barulho intenso dos tiroteios. “É como se fosse dentro do apartamento. A sensação é de pavor, dá vontade de deitar embaixo da cama. O medo é de uma bala perfurar a parede, pois, pelo barulho, o armamento é pesado”.

Aterrorizada, a moradora está mudando a rotina. “Desde que recebi mensagens no WhatsApp de que moradores da favela afirmam haver toque de recolher, tenho evitado ficar fora de casa depois das 23 horas”.

“Antes, os tiroteios eram só de madrugada, agora é a qualquer hora e o barulho está cada vez mais próximo. Parece de metralhadora”, reforça outra moradora, da rua Capelinha. As duas sentem falta da presença mais constante da polícia. “Cheguei a ligar para a emergência e a má vontade foi nítida”.

Tensão

Para quem mora no aglomerado, o clima é ainda mais tenso. “Se essa guerra não terminar, não poderemos levar nossos filhos para a escola”, disse uma vendedora de 28 anos. Até para entrar na favela as pessoas têm hora marcada. “Quem tenta subir (o morro) depois das 20h não consegue”, disse um jovem morador.

O comandante do Comando de Policiamento da Capital (CPC), coronel Winston Costa, garante que a corporação está presente. Segundo ele, além do batalhão da área, atuam na operação os policiais do CPE, com helicóptero. Militares das outras unidades da capital estão em alerta.

Para especialista, forças de segurança perderam o controle

Os tiroteios mais intensos desta semana no aglomerado da Serra são fruto da disputa por poder na região, por parte de duas gangues rivais. “Na última semana, prendemos o chefe do tráfico do aglomerado e a disputa pelos principais pontos se acentuou”, explica o chefe da assessoria de imprensa da PM, capitão Flávio Santiago.

O traficante conhecido como Thiago foi preso na última quarta-feira (27), após uma troca de tiros com a polícia. Ainda de acordo com o capitão, além do líder, outros dois traficantes foram capturados. Os cabeças dos grupos rivais também já foram identificados. Enquanto não são detidos, a polícia promete manter o aglomerado ocupado.

“Estamos empenhados em prender todos os envolvidos. O serviço de inteligência da PM também está identificando a origem das fotos em que os criminosos exibem armas e dos áudios”, disse.

Toque de recolher

De acordo com Santiago, a PM também não vai tolerar intimidação dos criminosos aos moradores. “Vamos garantir a segurança no aglomerado e do entorno. O trabalho desenvolvido no local é de aproximação junto a comunidade”, informou.

Insegurança

Apesar dos esforços, para o Coordenador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), da UFMG, Cláudio Beato, os conflitos constantes no complexo de vilas e favelas da Serra demonstram a perda de controle por parte da polícia com relação ao tráfico de drogas na região. “Deveria haver uma atuação mais incisiva da polícia, tanto do ponto de vista da investigação quanto do monitoramento. Aparentemente, o que deve ter acontecido foi que a corporação perdeu um pouco o controle”, avalia.

Segundo o especialista, a presença de armamento pesado nas mãos dos traficantes e os tiroteios evidenciam falhas do poder público. “A polícia tem perdido a capacidade de inteligência, de vigilância, talvez por falta de investimento, coordenação entre as duas polícias, Civil e Militar. Aí, fica aberto o espaço para os confrontos frequentes entre gangues”, conclui.



PONTO A PONTO

Em 19 de fevereiro de 2011, Renilson Veriano da Silva, de 39 anos, e o sobrinho, Jeferson Coelho da Silva, de 17, que não tinham passagem pela polícia, foram mortos por militares do Batalhão Rotam. Moradores protestaram e ônibus foram incendiados. Três PMs foram presos. Um se suicidou. Jonas David Rosa e Jason Ferreira Paschoalino foram condenados e expulsos da corporação.

De 19 a 29 de dezembro de 2013, oito boletins de ocorrência de confronto, com troca de tiros, foram registrados pela PM no aglomerado da Serra.

Em 9 de janeiro de 2014, traficantes ostentando armas circularam pelo local atirando para cima e intimidando moradores.

Em 24 de fevereiro de 2014, quase um mês após a inauguração da Área Integrada de Segurança Pública (Aisp), moradores denunciam intensos tiroteios devido à disputa por pontos do tráfico de drogas.

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