(PEDRO GONTIJO)
Prometida como principal atrativo da Lagoa da Pampulha, após o longo processo de limpeza do espelho d’água, a prática de esportes náuticos esbarra na fauna local.
A possibilidade de pesca amadora e atividades de recreação não tem a menor perspectiva de sair do papel. A presença de cerca de 20 jacarés no cartão-postal impede o contato das pessoas com a água.
Em março deste ano, a lagoa atingiu a chamada “Classe 3”. O nível, além de garantir as opções de lazer, permite a irrigação e até o abastecimento humano, após tratamento convencional.
No entanto, a liberação completa carece de um plano de manejo dos animais. Conversas entre prefeitura de BH e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) – que autoriza ou não a retirada dos bichos – sequer começaram. Restrições orçamentárias também estão entre os entraves.
Espécie
Os répteis seriam da espécie jacaré-de-papo-amarelo, que pode atingir até três metros de comprimento. São considerados “tranquilos” e os ataques ao homem são raros, segundo especialistas. Não há informações oficiais de como os bichos foram parar na lagoa. Uma das suspeitas é a de que podem ter vindo de outros cursos d’água. Mas, há relatos até de que filhotes teriam sido colocados na lagoa.
Análises
Para decidir como, quando e se será preciso remanejar esses animais, são necessárias mais informações. “Deve ser feito um censo detalhado da população e da distribuição deles na lagoa”, explica Marcos Coutinho, biólogo do Centro de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
O monitoramento também é essencial para definir o comportamento, os hábitos e o estado de saúde. Especialistas explicam que é possível marcá-los com dispositivos tecnológicos na escama. O método, além de evitar que o mesmo jacaré seja contado mais de uma vez, é mais eficaz para acompanhar o deslocamento dos animais no ambiente.
A retirada, no entanto, deve ser vista com cautela, diz o analista ambiental do Ibama Junio Augusto dos Santos Silva. “Eles já são habitantes de lá. Assim como capivaras, peixes. Todo procedimento envolve o contexto completo da fauna. Não há solução imediata quando o assunto é natureza”.
A possibilidade de isolar os jacarés em alguns pontos da represa – como tem sido pensado em relação às capivaras – também é descartada, segundo a especialista em taxonomia e biologia de anfíbios e répteis brasileiros e sul-americanos Luciana Barreto Nascimento. Para ela, a medida é improvável, uma vez que os jacarés se acomodam conforme os recursos alimentares e o tamanho da população.PEDRO GONTIJO / N/A
Quando vistos, bichos sempre despertam a atenção de moradores e visitantes da Pampulha
A reportagem entrou em contato com a Fundação Municipal de Cultura, responsável pelo complexo elevado a Patrimônio Cultural da Humanidade, mas não obteve retorno. Em recente entrevista ao Hoje em Dia, o diretor do Conjunto Moderno da Pampulha, Gustavo Mendicino, mostrou-se otimista. Afirmou que reuniões estavam previstas e que um primeiro planejamento para a regulamentação do uso do espelho d’água começaria ainda neste ano.
Mas para o secretário de Meio Ambiente de BH, Mário Werneck, existem problemas mais urgentes. “A mosca branca, os besouros metálicos (que matam as árvores) e os carroceiros, além das capivaras”, enumera. Segundo ele, falta, também, conhecimento sobre a situação dos répteis. “Sabemos muito pouco sobre a população, então fica muito difícil deliberar”.
Qualidade da água gera desconfiança de população
Outro entrave enfrentando na Lagoa da Pampulha é a desconfiança da população em relação à água. A limpeza da represa foi uma das recomendações feitas pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Dados da Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura mostram níveis aceitáveis de indicadores como coliformes termotolerantes (presença de microrganismos patogênicos), clorofila-a e DBO (matéria orgânica).
Apesar da meta atingida, muitas pessoas ainda têm dúvidas das melhorias obtidas. “Fico receoso porque não sei se está limpa de verdade. Olhando assim de longe dá um pouco de receio. Em alguns pontos parece bem suja, tem um cheiro ruim e bastante algas”, observa o técnico mecânico Rafael Ribeiro Silva, que passa pela região todos os dias no caminho entre a casa e o trabalho.
Atualmente, ainda é grande a quantidade de lixo que chega à lagoa. De acordo com a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), são recolhidas, diariamente, cerca de 10 toneladas de entulho durante o período de estiagem e 20 toneladas na época de chuva. Além disso, esgoto ainda é despejado no local. Para chegar a 100%, a Copasa desenvolve o Programa Caça-Esgoto, que identifica os lançamentos indevidos em galerias pluviais e sarjetas. Atualmente, 95% do projeto já foi atingido.