Prisão de jovens aumenta 533 vezes em Minas; 18 mil detentos com menos de 24 anos atrás das grades

Raul Mariano e Lucas Eduardo Soares
horizontes@hojeemdia.com.br
20/09/2018 às 20:30.
Atualizado em 10/11/2021 às 02:34
 (Marcello Casal Jr./Agência Brasi)

(Marcello Casal Jr./Agência Brasi)

A população carcerária em Minas triplicou na última década. Porém, o que chama atenção nesse contexto é o aumento de presos menores de 24 anos. De 2007 a 2017, essa parcela, que correspondia a menos de 1% do total, cresceu 533 vezes e equivale, hoje, a mais de 18 mil detentos, conforme dados da Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap), obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação.

Os números vão ao encontro das estatísticas nacionais, que apontam que os presidiários desse grupo etário já somam mais de 165 mil indivíduos – cerca de 30% do total de encarcerados no Brasil.

Se considerada a camada de acautelados de 25 a 29 anos, o público jovem representa mais da metade de detentos no país, conforme levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Para especialistas, o fenômeno é um reflexo direto da publicação da Lei de Drogas, em 2006. Segundo eles, a partir daí foi criado o cenário de repressão onde os critérios para a prisão de usuários e traficantes não foram claramente estabelecidos.

Presidente da Comissão de Assuntos Carcerários da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Fábio Piló afirma ter ficado a cargo da polícia definir se o detido será considerado usuário ou traficante. De acordo com ele, houve um encarceramento massivo da juventude.

“É um câncer para o país, uma enorme distorção que fez o número de presos triplicar. Pior do que isso, não acabou com o tráfico nem com os grandes traficantes”, analisa Piló.

Contramão

O advogado criminalista Lázaro Guilherme, membro do Instituto de Ciências Penais (ICP), também aponta a mesma lei como razão para que mais jovens estejam sendo colocados atrás das grades. Ele diz que, ao invés de coibir o comércio de entorpecente, a medida apenas contribuiu para abarrotar as cadeias.

“Até mesmo os crimes de homicídio têm ligação direta com as drogas. É um cenário que só vai mudar quando discutirmos, de forma séria, a descriminalização dessas substâncias”, opina.

Frederico Marinho, pesquisador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG (Crisp), corrobora o argumento e avalia que a lei contribuiu para a arbitrariedade dos policiais nos momentos de apreensão de drogas. “Agora, temos um sistema penitenciário superlotado, propício para violência entre os presos e para as tentativas de fuga”.

A PM discorda dos dados informados pela Seap, informou o chefe da Sala de Imprensa da corporação, major Flávio Santiago. Ele admite a expansão da população carcerária, porém de forma menos expressiva na faixa etária de 18 a 24 anos.

“O crescimento pode ter sim ligação com a Lei de Drogas, mas porque muitos entraram para o mundo do crime com a percepção de que o tráfico poderia ser uma forma de ganho financeiro fácil”, analisa o militar.

Santiago destacou que a reincidência criminal também aumentou. “Muitas pessoas são presas dezenas de vezes até que sejam condenadas definitivamente pela Justiça”.

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 602 mil pessoas pessoas estão encarceradas no Brasil

Falta política pública

A ausência de políticas públicas de educação voltadas para o público jovem também é um dos fatores que podem ter relação com o crescimento da população carcerária abaixo dos 24 anos. Quem afirma é a juíza titular da Vara de Execuções Criminais da Comarca de Ribeirão das Neves, Miriam Vaz Chagas.

Ela defende que, sozinha, a Lei de Drogas não pode ser considerada a responsável pelo encarceramento em massa. “O endurecimento da legislação penal em relação ao tráfico e uso se mostrou necessário naquela ocasião, pois a sociedade estava farta de tolerar esse tipo de delito”.

Hoje, explica a magistrada, o Estado tem fechado os olhos para a necessidade de estratégias, sobretudo na área da educação, para evitar que os jovens optem pelo caminho da criminalidade. “Temos instrumentos adequados para implementar essas ações, o que falta é vontade do poder público para que isso aconteça”, diz.

Francis Albert Cotta, doutor em história pela UFMG, com experiência em negociação de conflitos em presídios, entende que a raiz do problema está na falta de oportunidades. “Em termos sociais, precisamos abrir os canais de inserção de crianças e adolescentes e não deixar que a porta de entrada à educação seja somente a escola”.

Prevenção

Por nota, a Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) informou que os programas “Fica Vivo!” e “Mediação de Conflitos” são voltados para evitar a entrada de pessoas mais novas no crime.

Segundo a pasta, nas áreas onde os projetos foram implantados, houve redução de 20% nas mortes de jovens no primeiro semestre deste ano, em comparação com o mesmo período de 2017.N/A / N/A

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