Projeto quer atrair 150 mil pessoas para entorno da Lagoa dos Ingleses

Ricardo Rodrigues - Hoje em Dia
24/01/2016 às 09:15.
Atualizado em 16/11/2021 às 01:08
 (Arte HD)

(Arte HD)

O alteamento do dique da Lagoa dos Ingleses, em Nova Lima, é o primeiro passo para um processo contínuo, e intenso, de adensamento populacional da região. Maior disponibilidade de água permitirá a expansão imobiliária e um salto dos atuais 5 mil habitantes para 150 mil nos próximos 45 anos.

Para atender a tanta gente, será preciso construir escolas, universidades, shoppings, espaços culturais e hospital. Tudo isso está previsto no projeto de desenvolvimento da região elaborado pela CSul, grupo formado por cinco empreendedores, proprietários de 25% da área, inclusive da própria lagoa.

Eles consideram a obra de alteamento da barragem, em 60 cm, essencial para implantar a chamada Centralidade Sul, prevista no Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (PDDI) da região metropolitana. A proposta é englobar um misto de habitação, trabalho e lazer.

A preocupação de especialistas é com os impactos ambientais e sociais numa região que, em pouco tempo, receberá uma população equivalente à de uma cidade de porte médio, como Patos de Minas (Alto Paranaíba).

Com relação ao trânsito, por exemplo, a frota aproximada seria de 70 mil carros – se considerada a proporção atual em Belo Horizonte de 0,7 veículo por pessoa – o que já bastaria para criar um corredor de trânsito mais intenso na BR-040, entre a “nova Alphaville” e a capital.

“Com a verticalização da região, a infraestrutura de trânsito e transporte, que hoje é precária e apresenta vários gargalos, teria de ser repensada para evitar problemas maiores com os congestionamentos que já acontecem”, afirma o professor Guilherme de Castro Leiva, coordenador do curso de engenharia de transporte do Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet-MG).

Contrário

Estudo da Fundação Israel Pinheiro indica que 95% dos moradores do Vetor Sul não trabalham na região onde vivem. E 95% dos que trabalham lá residem em outro local. “É preciso corrigir essas distorções, que fazem trabalhadores e empresários se deslocarem diariamente em sentidos opostos”, diz o economista João Santiago.

Para o diretor de desenvolvimento econômico da Prefeitura de Nova Lima, João Batista Santiago Neto, a especulação imobiliária traz distorções à ocupação do território e demanda altos investimentos públicos em áreas como transporte, saúde, educação e saneamento. “Há propostas de novos condomínios de luxo por todo Vetor Sul de BH. São bem-vindos, mas devem dar suas contribuições de melhoria”.

Conceito permite redução da dependência por automóvel

Assessor da Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana, o urbanista Sandro Veríssimo explica que o desafio da RMBH é criar novas centralidades. Ou seja, lugares com lazer, mobilidade, emprego e estudo. “As pessoas se deslocariam menos. É como se nesses locais houvesse uma avenida do Contorno, onde o cidadão encontraria tudo o que precisa dentro daquele perímetro”.

Esse é o conceito de cidade compacta, de condomínios mistos com tudo o que se precisa. “As coisas têm de estar perto uma das outras. Isso é o que tem de mais moderno em urbanização. Condomínio apenas residencial aumenta a dependência do carro, mas temos de reduzir a necessidade de deslocamento.

Veríssimo lembra que, na época em que o Alphaville foi criado, a média era de um automóvel para cinco pessoas. Hoje, a frota está crescendo de 8 a 10% ao ano, sem que a população cresça no mesmo ritmo. “Não tem como o crescimento da frota competir com a abertura de vias. O mundo está sinalizando que o modelo de cidade atual deu errado”.

Mais água

Lagoa do Ingleses ocupa uma área de 2 milhões de metros quadrados. Por causa da estiagem, apenas metade da capacidade está preenchida.

O lago é bastante usado para esportes náuticos “O alteamento do dique favorece o lazer e a prática esportiva”, afirma o presidente do Minas Tênis Clube, Luiz Gustavo Lage. “O objetivo é manter o nível da lagoa. Sem o espelho d’água perene, o entorno morre”.

Área foi considerada prioritária para conservação por governos estadual e federal

O crescimento imobiliário às margens da Lagoa dos Ingleses, em Nova Lima e Itabirito, também vai aumentar a pressão sobre os recursos hídricos, cada vez mais escassos na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). A opinião é do biólogo Francisco Mourão, conselheiro da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda).

Ele destaca que a área foi declarada prioritária para a conservação pelos governos estadual e federal, por abrigar mananciais importantes para a capital e para as cidades do colar metropolitano.
 
Portanto, ambientalistas discordam da implantação desse megaempreendimento para a região, por temerem a destruição de áreas naturais de florestas e de campos ferruginosos, associados à Mata Atlântica. “Estudos prévios indicam que o projeto vai comprometer esses ambientes raros e únicos no planeta. É uma área com espécies endêmicas de fauna e flora”, afirma Mourão.

“Com certeza, novos empreendimentos só aumentam a fragilidade das áreas naturais existentes na região”, diz a pesquisadora Janise Bruno Dias, professora do Instituto de Geociências da UFMG. Ela exige do Estado a recuperação das áreas para manutenção dos serviços ambientais, em especial de sustentabilidade hídrica para a metrópole.

Fonte desconhecida

Integrante do Movimento pelas Serras e Águas de Minas, Maria Teresa Corujo afirma não existir informações sobre como ficará o abastecimento de água com o aumento da população na região da lagoa.

“O sistema Paraopeba está em situação de escassez. Como se planeja uma construção desse porte sem ter essa resposta para dar? Esses questionamentos foram feitos em uma audiência pública na Assembleia Legislativa, e saímos de lá mais confusos”.

Ainda na avaliação de Maria Tereza, é insensato planejar novos empreendimentos na região em um momento crítico em termos de recursos hídricos. “É fundamental manter íntegros os espaços naturais onde será construído o projeto CSul”, defende Maria Teresa.

A Associação Geral Alphaville Lagoa dos Ingleses reconhece que haverá impactos no trânsito, na segurança e até no meio ambiente, com o maior volume de lixo e esgoto produzido. Porém, diz que os condomínios têm contrato com uma empresa responsável pela captação e tratamento dos efluentes.

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