Qualidade do treinamento da Guarda Municipal é questionada

Gabriela Sales - Hoje em Dia
01/02/2016 às 07:21.
Atualizado em 16/11/2021 às 01:14
 (Lucas Prates/Hoje em Dia)

(Lucas Prates/Hoje em Dia)

Ainda neste mês, cem guardas municipais estreiam em Belo Horizonte a patrulha armada da corporação. Embora aparentemente os agentes passem a assumir, cada dia mais, funções que se confundem com as da Polícia Militar, o treinamento é menos rigoroso. Fator que levanta questionamentos sobre a capacidade desses profissionais de manusear revólveres e pistolas semiautomáticas.

No curso de formação de um soldado da PM, por exemplo, a preparação é realizada em dois anos, numa carga horária de mais de 2 mil horas que engloba estudo de leis, treinamento psicológico, psicotécnico e físico, além, é claro, de aulas de tiro. Ao todo, a média é de 1.500 disparos.

O número é 65% maior que o efetuado por um guarda municipal de BH (em torno de 900) – o curso de tiro para os estreantes termina no dia 18. A carga horária global de treinamento também é inferior à da PM, com cerca de 520 horas, totalizando quatro meses para início de carreira.

A Guarda esclarece que os requisitos estipulados pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) para a formação de um agente municipal, em qualquer cidade do país, é ter no currículo um total de 600 tiros durante o treinamento. Portanto, os da capital atendem às normas vigentes, superando o mínimo determinado.

A previsão da Guarda Municipal é a de que, em dois anos, todo o efetivo de 2.117 agentes esteja apto ao uso do armamento.

Controvérsia

Para alguns especialistas, um reforço merecido na segurança pública, mas, para outros, mais um ingrediente que potencializa a violência. “A partir do momento em que a Guarda se arma, a instituição acaba afastando a sociedade dela e se tornando uma polícia repressora. Está fadada ao fracasso”, avalia o coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC Minas (Nesp), Robson Sávio.

O pesquisador defende que quanto mais armas estiverem circulando, maior serão os índices de violência. “A Guarda perde esse conceito de mediadora da comunidade e passa a atuar como repressora, o que desqualifica o sentido da sua criação. Além disso, o preparo pode não ser suficiente para avaliar a ocasião em que esse equipamento deve ser usado”, reforça Sávio.

A Guarda informa que cursos de reciclagem e de qualificação serão ministrados periodicamente. “Uma promessa já feita pela Polícia Militar para diminuir conflitos nas abordagens e melhorar sua atuação e, que até o momento, não apresenta bons resultados. Sem um controle ou monitoramento de uma corregedoria, isso será impossível acontecer”, analisa o especialista em segurança pública do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), da UFMG, Frederico Marinho.

Atuação em escolas e em postos de saúde é descartada
 
A Guarda Municipal não divulga os locais onde os agentes armados irão atuar, mas deixa claro que eles não serão empenhados em escolas e em centros de saúde.

O que não seria um problema, pelo menos na avaliação do especialista em segurança pública do Crisp, Bráulio Figueiredo. “A prática pode ajudar a melhorar a área de segurança pública ao estimular a criação de uma polícia com atuações específicas, inclusive na educação e na saúde”.
Apesar de aprovar a guarda armada, Figueiredo reforça a necessidade de treinamento e acompanhamento contínuo dos agentes. “É fundamental uma capacitação e reciclagem constantes, para que a própria corporação consiga pontuar as necessidades dos agentes e assegurar um serviço de qualidade à população”.

O coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná, Pedro Bodê, defende o uso cauteloso do novo equipamento. “O agente deve estar seguro na hora do uso da arma de fogo. Como grande parte deles, em todo o país, passou por treinamentos ministrados por militares, acreditamos que essa cautela será preservada”, afirma.

Ainda segundo Bodê, com a Guarda armada, as demandas da área de segurança pública poderão ficar melhor distribuídas. “A PM poderá prevenir as ações criminosas e a Polícia Civil, melhorar o empenho nas investigações”.

Para o presidente interino da Associação dos Praças Polícias e Bombeiros Militares (Aspra-MG), Israel Sanches, o guarda municipal armado poderá auxiliar a PM em áreas consideradas de risco ou de alto índice de criminalidade. “A arma garante a segurança dos agentes e também da população”.

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