Risco de rompimento força fuga em nove comunidades mineiras

Raul Mariano e Malú Damázio
20/02/2019 às 20:42.
Atualizado em 05/09/2021 às 16:38
 (Maurício Vieira)

(Maurício Vieira)

O risco do rompimento de novas barragens após o desastre de Brumadinho, na Grande BH, já atingiu nove comunidades em Minas. Em apenas 13 dias, exatas 971 pessoas foram obrigadas a deixar as casas. Ontem, moradores do condomínio de luxo Solar da Lagoa e do vilarejo Rio do Peixe, na zona rural de Nova Lima, precisaram ser retirados. Além deles, moradores de Miguel Burnier e Pires, em Ouro Preto, foram levados para hotéis, sem data de retorno para os antigos endereços. 

As evacuações começaram no início de fevereiro, levando pânico também aos povoados de Socorro, Tabuleiro e Piteiras, em Barão de Cocais, e a Pinheiros, em Itatiaiuçu, municípios da região Central do Estado. No último sábado, moradores de Macacos, distrito de Nova Lima, viveram a mesma tensão. 

Em todos os casos, as barragens são construídas no método de alteamento a montante, o mesmo do reservatório da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, que se rompeu em 25 de janeiro, deixando 171 mortos.

No complexo de Rio do Peixe, o medo é que a Barragem Vargem Grande – que acumula mais de 9 milhões de metros cúbicos de rejeitos do minério de ferro – atinja todas as residências no caso de uma tragédia.

A dona de casa Maria das Dores, de 56 anos, precisou, em meio ao sufoco, garantir a segurança da mãe, que é acamada e teve que ser levada até o ponto de encontro estabelecido pela mineradora. “Não consigo nem falar direito. Disseram que temos só duas horas para estar na capela com tudo. Vou lá fechar a casa correndo e dar um jeito de tirar minha mãe”, contou.

Bomba-relógio

Em Minas, 42 barragens foram construídas com alteamento a montante e, do total, 30 têm “alto dano potencial associado”. Isto significa que podem provocar desastres em caso de rompimento, segundo dados da Agência Nacional de Mineração (ANM).

Para especialistas, o cenário é preocupante, vez que o processo de descomissionamento dos reservatórios é lento. Professor do curso de engenharia mecânica da Universidade Federal de Itajubá e da pós-graduação em engenharia hidráulica da UFMG, Carlos Barreira Martinez explica que o clima de apreensão pode durar até dez anos.

“A situação é lamentável, há barragens com alteamento a montante em muitas regiões urbanas e não podemos mais nos dar ao luxo de perder vidas”, argumenta. “Há inúmeros profissionais qualificados dentro dessas companhias e eles têm total conhecimento do problema há tempos”, afirma o professor. 

A Vale foi procurada, mas não se pronunciou até o fechamento desta edição. O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) também não deu retorno.Editoria de Arte

Interdição

A BR-356, que liga Belo Horizonte a Itabirito, foi interditada pela Polícia Militar entre os quilômetros 35 e 50, na tarde de ontem. A medida foi preventiva, de acordo com a corporação, vez que o plano de emergência da Barragem Vargem Grande, da Vale, mostra que os rejeitos atingiriam a rodovia em caso de rompimento.

“A PM e a Defesa Civil não podem brincar com a vida das pessoas. Por isso, isolamos a área de risco”, disse o major Flávio Santiago. “Veículos leves vão precisar fazer o desvio pela MG-030, passando por Rio Acima (Grande BH)”.

Já os veículos de carga terão duas opções. A primeira, seguindo pela BR-040 até Congonhas, em direção a Ouro Branco, para passar pela comunidade de Lobo Leite. “Neste local, haverá acesso à MG-030 em direção a Itabirito. Quem quiser evitar, deve pegar a MG-443 até Ouro Preto, onde há o acesso até Itabirito”, explicou o major.

Moradores que se mudaram para a região de Nova Lima em busca de sossego lamentam a situação. É o caso do engenheiro Carlos Alberto Fonseca, de 50 anos, que precisou deixar o chalé que construiu há seis anos no condomínio Solar da Lagoa. “Meus quatro cachorros e eu tivemos que sair. Vim de Belo Horizonte para viver na paz, na natureza, procurando felicidade, e agora estou saindo de casa por conta da barragem”, queixou-se o engenheiro.

Decisão

Uma decisão judicial expedida ontem determinou que a Vale adote medidas emergenciais para garantir a segurança também da população de Itabirito, na região Central, em caso de rompimento das barragens de Forquilha I, II e III.

A empresa já iniciou os processos de evacuação dos moradores em Ouro Preto, onde os reservatórios estão localizados, e em Vargem Grande, na divisa com Nova Lima. A empresa terá 72 horas para providenciar a fixação de rotas de fuga e pontos de encontro nas áreas de risco, dentre outras providências.

A Justiça também exige que a Vale, em sete dias, realize simulados para que os moradores comecem a ser treinados sobre as condutas a serem adotadas. 

A mineradora poderá ser multada em R$ 1 milhão por dia se descumprir a liminar. A ação foi uma iniciativa do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).Maurício VieiraPerigo já afeta até condomínios de luxo, como o Solar da Lagoa, em Nova Lima

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