Sem perícia, crime ambiental fica impune em Minas Gerais

Ricardo Rodrigues - Hoje em Dia
05/06/2015 às 07:34.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:21
 (Marcelo Prates)

(Marcelo Prates)

O Dia Mundial do Meio Ambiente, comemorado nesta sexta-feira (5), é a data que marca a luta de ambientalistas de todo o mundo em defesa da natureza e contra ações que degradam o planeta. Minas, no entanto, tem tido dificuldades em apurar crimes ambientais, na maioria incêndios florestais. Segundo o Sindicato dos Peritos Criminais de Minas Gerais (Sindpecri), investigações sobre os delitos não estão sendo concluídas por falta de pessoal especializado.

Segundo a entidade, no momento há apenas um profissional especializado para periciar, se necessário, as 70 Unidades de Conservação (UCs) mineiras, entre parques, estações ecológicas, áreas de proteção ambiental, reservas da vida silvestre, monumentos naturais, reservas de desenvolvimento sustentável e reservas biológicas.

Além disso, cabe a esse profissional periciar, por exemplo, derramamento de óleo e substâncias tóxicas em cursos-d’água, rompimento de barragens de rejeitos da mineração, desmatamentos ilegais e outras atividades danosas ao meio ambiente. Para piorar a situação, ele está licenciado.

“Não tem mais perito ambiental. Um aposentou, outro ainda está na ativa, mas de licença médica. Além disso, a seção de perícias do meio ambiente foi extinta, fundiu-se ao setor de engenharia legal do Instituto de Criminalística”, aponta a diretora do Sindicato dos Peritos Criminais de Minas Gerais (Sindpecri), Andrea Campos.

Sobrecarga

Contudo, inquéritos, investigações preliminares e diligências estão cada vez mais crescentes, de acordo com a Divisão Especializada de Proteção de Meio Ambiente da Polícia Civil. Em 2013, o órgão abriu 104 inquéritos para investigar crimes ambientais em UCs e entorno, apenas na região metropolitana da capital.

Em 2014, esse número mais que triplicou, chegando a 321 procedimentos abertos até o fim de setembro. “Por absoluta falta de mão de obra, a Polícia Civil não conseguiu concluir os processos abertos para apurar os incêndios ocorridos em parques e reservas florestais no Estado em 2014 e neste ano”, diz Andrea.

O balanço dos inquéritos abertos em 2014 e neste ano e dos concluídos não foi informado pela Polícia Civil, que prometeu disponibilizar esses números somente na segunda-feira.

A ausência de um perito para analisar denúncias de crimes ambientais não apenas deixa várias ocorrências sem punição como também incentiva novas infrações, analisa Maria Dalce Ricas, superintendente executiva da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda). “Sem perícia, o juiz não dá a sentença. E se não há penalidade, as pessoas sentem-se blindadas. Elas podem destruir a natureza porque sabem que nada acontecerá. Nem mesmo precisarão se preocupar em reparar a área degradada”.

E as perdas não atingem apenas o meio ambiente. Para Dalce, é um prejuízo para toda a sociedade, que não pode ver seus bens naturais sendo preservados.

Outro lado

A Polícia Civil confirmou que há apenas um perito especialista na capital e que ele é responsável por dar consultoria a perícias ambientais em todo o Estado. Mas disse que também há profissionais em mais sete cidades do interior.

A dirigente do Sindipecri contesta a informação, explicando que esses profissionais no interior “são peritos que ainda estão se especializando na área ambiental e não estariam prontos para esse tipo de trabalho”. Segundo Andrea Campos, eles têm que passar por formação específica para atuar.

Sem punições, incêndios crescem em período chuvoso

Enquanto a apuração anda a passos lentos, os incêndios florestais em áreas protegidas por lei crescem em Minas. É o que mostram os boletins do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) deste ano, mesmo no período chuvoso.

No comparativo de incêndios florestais em UCs administradas pelo governo do Estado, em 2015, foram registradas 45 ocorrências de queimadas de janeiro a maio, contra média de 25 entre os anos de 2010 e 2014, um aumento de 77,1%, de acordo com os cálculos da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Semad). Em 2014, foram registradas 471 ocorrências dentro de parques e 158 no entorno de unidades de conservação, o que totaliza 629 focos de incêndios, que destruíram 13.864 hectares de vegetação nativa. As UCs mais atingidas pelos focos de calor foram, segundo o Inpe, a Área de Proteção Ambiental (APA) do Rio Pandeiros (berço das principais espécies de peixes da bacia do rio São Francisco), a APA Cochá e Gibão, a APA Nascentes do Rio Capivari e a APA do Rio Uberaba, todas estaduais.

Entre os parques nacionais mais atingidos pelo fogo estão o Grande Sertão Veredas, Cavernas do Peruaçu, e Serra do Cipó.

Preocupação

O delegado Aloísio Daniel Fagundes, titular da 2ª Delegacia de Meio Ambiente da Polícia Civil, informou que as UCs mais atingidas por essa prática criminosa têm alta relevância em termos de biodiversidade, por conservarem remanescentes dos biomas Cerrado e Mata Atlântica, além de mananciais de grande importância para a captação de água destinada ao abastecimento humano. “Geralmente são áreas maiores, que se estendem por mais de um município e fazem limite com áreas populosas, com trânsito diário de pessoas. Isso favorece esse tipo de incêndio”, afirma Fagundes.

Ele destaca a dificuldade para desvendar esse tipo de crime. “Essa é a maior dificuldade na investigação: não tem por onde começar. É muito difícil identificar a origem do incêndio e o seu autor. Esse tipo de crime, em geral costuma ser praticado em locais ermos e não têm testemunhas”, pondera o policial.

Novos brigadistas reforçam equipes de combate ao fogo

Orientações à comunidade e aos municípios, reforço de equipes de combate a incêndios com novos equipamentos e recursos humanos são medidas adotadas pelo governo estadual para o enfrentamento do período de estiagem, que começou neste mês. Mesmo assim, 98 municípios já decretarem situação de emergência devido à seca neste ano.

Segundo o diretor do programa Previncêndio, Rodrigo Belo, 408 brigadistas foram contratados e treinados pelo Previncêndio, vão reforçar o efetivo das 44 unidades de conservação espalhadas pelo Estado. O número de brigadistas contratados pela Semad aumentou de 330, em 2014, para 408, em 2015.

Convênio

As unidades de conservação federais localizadas em Minas Gerais são atendidas por uma parceria estabelecida através do Decreto de criação da Força-Tarefa Previncêndio e são apoiadas sob demanda do ICMBio nas unidades federais em Minas Gerais. Quanto as UCs municipais não há nenhuma parceria estabelecida, sendo de responsabilidade das prefeituras, mas caso haja demanda e disponibilidade de apoio a FTP auxilia quando necessário. A Semad possui ainda dois helicópteros, três aviões de monitoramento de focos de chamas e uma aeronave para transporte de pessoas. Foram compradas 36 motobombas com capacidade para 500 litros de água. O aluguel de mais 10 aviões para lançamento de água está em fase de licitação. “Temos trabalhado para melhorar, de forma gradativa, a estrutura de prevenção e combate a incêndios florestais no Estado”, afirma Belo.

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