Sobreviventes de barragens rompidas em Minas amargam espera por indenização

Ernesto Braga - Hoje em Dia
15/11/2015 às 07:31.
Atualizado em 17/11/2021 às 02:29
 (Frederico Haikal)

(Frederico Haikal)

Em uma pequena propriedade rural a sete quilômetros de Moeda, na região Central de Minas, os aposentados Benedito Fernandes da Silva, de 78 anos, e Maria das Graças Silva, de 67, vivem da agricultura de subsistência. Desde que perderam o filho no rompimento da barragem da Herculano Mineração, em setembro do ano passado, o casal não tem força nem dinheiro para criar gado e formar grandes plantações.

Cristiano Fernandes Silva, à época com 32 anos, foi um dos três operários mortos. Eles foram arrastados pela lama que vazou em Itabirito, também na região Central. Um ano e dois meses depois, a família da vítima ainda espera por indenização. “Não recebemos nem o acompanhamento psicológico que prometeram”, lamenta Benedito.

A casa onde Wily da Silva Botelho, de 63 anos, mora com a mulher dele, Maria de Lourdes Botelho, de 56, no Centro de Miraí, na Zona da Mata, foi invadida por rejeito de bauxita na ruptura da barragem da Mineração Rio Pomba Cataguases, em janeiro de 2007. Mais de 4 mil pessoas foram afetadas.

A fazenda do casal, cortada pelo rio Fubá, foi devastada. “A indenização não cobriu nem 10% do meu prejuízo. Muita gente não aceitou o valor e ainda briga na Justiça. Hoje, tento tocar uma fábrica de pré-moldados na área da fazenda, mas sou impedido pela legislação ambiental”,queixa-se Wily.

Em junho de 2001, Jaime Gomes dos Santos, de 68, sobreviveu à avalanche de lama que varreu parte de São Sebastião das Águas Claras (Macacos), distrito de Nova Lima, na Grande BH, no rompimento de barragem na Mineração Rio Verde. Ele conseguiu escapar de dentro de um caminhão após ficar cerca de meia hora soterrado.

Com a saúde fragilizada e problemas psicológicos, Jaime não conseguiu dar sequência à carreira de mestre de obras. Passados mais de 14 anos, ele afirma nunca ter sido procurado pela empresa.

Inquérito parado desde julho à espera de análise pericial

Dez dias se passaram do vazamento de duas barragens com rejeito de minério da Samarco no município de Mariana. Atentos à maior tragédia da história da mineração em Minas e das promessas de assistência às vítimas, pessoas que tiveram a vida afetada por problemas semelhantes em outros cantos do Estado esperam uma definição da Justiça.

A investigação policial sobre as mortes e os danos ambientais causados pelo rompimento da barragem da Herculano Mineração está parada. Segundo a Polícia Civil, o inquérito foi repassado ao Ministério Público Estadual (MPE) em julho e não foi devolvido ao delegado Marcus Vinícius, de Itabirito.

Por meio da assessoria de imprensa, o MPE informou que o inquérito foi solicitado pelo promotor Mauro Ellovitch, de Defesa do Meio Ambiente, “para análise da perícia policial, que será comparada aos resultados periciais obtidos pelo próprio Ministério Público”. Não há previsão de quando volta às mãos da Polícia Civil.

Enquanto isso, de acordo com Clóvis Fernandes da Silva, de 30 anos, irmão mais novo de Cristiano, morto no vazamento da represa, um ano e dois meses depois ainda não foi definido nem o valor da indenização a que a família teria direito. “Arcaram apenas com os custos do caixão e do traslado do corpo”. A Herculano Mineração informou que “aguarda a definição do processo, que está correndo em juízo”.

Subavaliado

O rejeito de bauxita que invadiu a fazenda de Wily Botelho, em Miraí, matou o gado, destruiu o canavial e a capineira. A propriedade ficava bem perto do Centro da cidade, onde ele mora com a mulher.

Dentro da residência, tudo foi danificado pela lama. “Fiquei à deriva. Perdi cerca de R$ 60 mil (em 2007). A mineradora avaliou por baixo e ofereceu R$ 5 mil por família. Quem concordou, pegou. Mas há processos correndo na Justiça até hoje”, diz. Wily parou de criar gado, loteou a propriedade e vendeu os lotes. “A produção de leite era meu ganha-pão, não tive outra alternativa”.

Por telefone, a reportagem entrou em contato com a Bauminas Mineração, em Campinas (SP), atual proprietária da barragem em Miraí, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

Moradores de Macacos assombrados por nova ruptura de represa

O cenário devastado em São Sebastião das Águas Claras (Macacos) pelo rompimento da barragem da mineradora Rio Verde, em 2001, foi recomposto. O córrego Taquaras, por exemplo, voltou a correr limpo pelo distrito de Nova Lima.

“Ainda é possível encontrar ao longo do ribeirão pedaços de trator, de telas e outras coisas que foram arrastadas pela lama”, ressalta Márcio Rodrigues, de 43 anos. O terreno dele, por onde passa o Taquaras, foi invadido pela lama.

Mais de 14 anos depois, a Associação de Moradores de Macacos volta a se preocupar com a possibilidade de ruptura de uma represa. “Está sendo depositado rejeito de minério na barragem de Pasárgada, que não tem estrutura para isso. Ela fica num nível superior e, portanto, é uma bomba apontada para o distrito”, afirma o presidente da associação, José Paulo Ribeiro Fontes Júnior.

Ele garante que em todo o terreno há marcas do rejeito de minério sendo carregado pela água até a represa. “Vamos à Justiça para tentar impedir que isso continue ocorrendo 24 horas por dia”, promete o líder comunitário.

Resposta

De acordo com a assessoria de imprensa da Vale, que faz o beneficiamento de minério de ferro no local, a barragem citada por José Paulo é a de Capão da Serra, localizada em área da Minerações Brasileiras Reunidas S.A. (MBR) e “que não recebe qualquer tipo de rejeito”.

“A barragem tem a função única e exclusiva de receber a drenagem superficial oriunda da mina de Tamanduá. Como medidas de controle, há instrumentos e inspeções periódicas feitas por equipe técnica da Vale, além de auditorias anuais por profissionais independentes”, garante a empresa.

 

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