Tragédias expõem vítimas a distúrbios psicológicos que exigem atenção

Renata Galdino
01/02/2019 às 21:58.
Atualizado em 05/09/2021 às 16:21
 (Editoria de Arte)

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Para quem sobrevive a tragédias ou tem parentes mortos em situações como o rompimento da barragem em Brumadinho, na Grande BH, os problemas vão além das perdas materiais e dos entes queridos. Passado o evento violento, distúrbios psicológicos podem surgir a curto, médio e longo prazos. O transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) é um deles, e é mais comum do que parece.

Estima-se que cerca de 10% das pessoas que tiveram a vida ameaçada apresentem alterações no comportamento. São casos decorrentes de desastres, violência sexual, acidentes automobilísticos graves e até mesmo o recebimento do diagnóstico de doenças mais sérias, como câncer.

De acordo com Antônio Alvim, membro da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), é comum associar os impactos provocados por essas situações apenas a traumas físicos. “Que também merecem atenção. Mas, os sofrimentos psicológicos são maiores, acometem um número maior de pessoas e, se não tratados adequadamente, vão durar por anos”.

Moradora do Córrego do Feijão, bairro de Brumadinho atingido pela lama, Adriana Geraldo Miranda Gomes, de 33 anos, já prevê procurar um psicólogo. “Na terça-feira (29), não dormi, fiquei a madrugada chorando. Estou traumatizada. É toda hora uma lembrança na cabeça”.

Ela saiu de casa com medo de que uma segunda estrutura da Vale desabe no município. No imóvel ainda estavam o marido e a filha, de apenas 5 anos, portadora de fibrose cística. “Ele ainda voltou para pegar a medicação da menina. Agora, não quero mais voltar para lá”, afirma Adriana Geraldo.

Medicamentos devem ser administrados só após o paciente ser avaliado por um especialista


Coordenadora dos ambulatórios de Trauma e de Transtornos de Ansiedade do Hospital das Clínicas, da UFMG, Cíntia Fuzikawa diz que as pessoas com mais chances de desenvolver o TEPT são as que já vivenciaram outros dramas e não receberam apoio adequado, apresentam sofrimentos mentais, como depressão, ou cujo grau de ameaça à vida foi maior. “Há muito quadro de depressão e ansiedade, mas não quer dizer que o paciente irá desenvolver o TEPT”, frisa a psiquiatra.

Quem passou por momentos traumáticos deve ser acompanhado desde o início, até mesmo no posto de saúde, afirma Cíntia. “Lá, é possível detectar evidências de um quadro psicológico mais grave. Então, o paciente é encaminhado para um psiquiatra ou psicólogo”. Conforme a coordenadora, medicamentos como diazepam e clonazepam - usados para esses tratamentos - podem aumentar o risco do desenvolvimento do transtorno de estresse pós-traumático se administrados logo após o evento.

Cuidado estendido

Não somente os que sobreviveram a tragédias ou familiares de mortos sofrem. Os cuidados devem se estender a quem está envolvido no resgate, como bombeiros e policiais. “Qualquer pessoa pode ser afetada, dependendo da história de vida, das suas características. São situações perturbadoras. Nas buscas, um bombeiro pode reconhecer o corpo de uma criança ou partes de um cadáver e ficar imaginando como eles sofreram”, observa o psiquiatra Antônio Alvim.

(Colaborou Malú Damázio)

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