Uber faz um ano, e debate sobre legalidade não evolui

Gabriela Sales e Patrícia Santos Dumont - Hoje em Dia (*)
26/08/2015 às 06:40.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:30
 (Frederico Haikal)

(Frederico Haikal)

Após um ano de atuação do Uber em Belo Horizonte, e em meio a confrontos envolvendo os motoristas e os taxistas da capital, o poder público se mantém omisso quanto à legalidade do serviço oferecido pelo aplicativo norte-americano.

No total, existem sete projetos de lei, que tratam da regulamentação do serviço, em tramitação na Câmara de Vereadores da capital. Regras que, para especialistas, visam apenas a coibir a livre concorrência, que poderia estimular a melhoria do transporte oferecido na cidade.

Desde o início, a BHTrans, responsável por gerenciar o trânsito na capital, não se posiciona sobre o assunto argumentando que “não comenta as funcionalidades de aplicativos como o Uber”. A discussão, no entanto, não é sobre o uso da tecnologia, mas a respeito do transporte de passageiros.

A prefeitura também foi procurada para comentar o assunto mas, novamente, informou, por meio da assessoria de imprensa, que o tema é de responsabilidade da BHTrans e que está sendo tratado por uma comissão especial.

Propostas

Criado há 15 dias, o grupo, formado por vereadores e representantes da BHTrans e do Sindicato dos Taxistas de Belo Horizonte (Sincavir), irá se reunir nesta quarta-feira (26) para debater o assunto, polêmico, e apresentar propostas que serão levadas ao Executivo municipal.

“A ideia é criar uma proposta única e levá-la ao prefeito Marcio Lacerda, para que ele aprecie e elabore um projeto de lei para votação na Câmara”, detalha o presidente da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário da Câmara, vereador Preto.

Em nota, a BHTrans diz que o serviço prestado pelo aplicativo é ilegal, mas não informa de que forma efetua a fiscalização e o combate das ações. Disse, apenas, que trabalha em parceria com a Polícia Militar e o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) e conta com o apoio do Ministério Público para coibir o transporte, que é clandestino, segundo a autarquia.

Serviços complementares

O diretor de Comunicação do Uber Brasil, Fábio Sabba, cobra um diálogo mais aberto envolvendo a população e reforça a importância de um posicionamento do poder público sobre o assunto. Segundo ele, o usuário tem o direito de escolher que tipo de serviço quer utilizar, cabendo ao município definir de que maneira as atividades se complementarão.

“O sistema caiu no gosto da população e o município precisa definir de que forma o serviço irá complementar o dos taxistas. A regulamentação, além de favorecer a criação de políticas públicas, deve melhorar a mobilidade urbana nas cidades que adotarem o sistema”, afirma.

O presidente do Sindicato dos Taxistas de Belo Horizonte (Sincavir), Ricardo Luiz Faedda, não adiantou que tipo de planejamento será apresentado pela comissão, que se reúne nesta quarta-feira (26), ao Executivo.

Projetos de lei para tentar pôr fim ao impasse na capital

Sem definição sobre a atuação do aplicativo Uber, sete projetos de lei tramitam na Câmara Municipal de Belo Horizonte. Quatro proposições são contrárias ao aplicativo. Já as outras três, favoráveis ao tipo de serviço prestado por meio da plataforma digital.

Os próprios parlamentares defendem uma decisão rápida sobre o assunto. “A definição faz com que acabe o embate entre motoristas do Uber e taxistas”, frisou o presidente da Comissão de Trânsito e Transporte, vereador Wagner Messias, o Preto.

Segurança

Autor de uma proposição que prevê a regulamentação do sistema Uber na capital mineira, o vereador Pablo César, o Pablito, afirma que apenas uma legislação irá trazer segurança para usuários, taxistas e os motoristas da plataforma. “O avanço da tecnologia e da atuação dela no plano de mobilidade urbana das grandes cidades é inevitável. É preciso deixar claro que o passageiro tem direito de escolha e o serviço é uma contratação privada, não pública”.

O projeto de lei está sendo analisado pela Diretoria Legislativa da Câmara. Somente depois disso é que a proposição será encaminhada para a avaliação das comissões.

Em Brasília

O tema também é discutido no Congresso Nacional. Na Câmara dos Deputados, Laudívio Carvalho defende a suspensão do aplicativo até que se tenha um entendimento a respeito do serviço prestado.

No Senado, Ricardo Ferraço pede a regulação do Uber e outros serviços de transporte privado individual a partir de provedores de rede digital no Brasil. A matéria está em análise na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da Casa.

1 milhão é a quantidade de viagens feitas, por dia, utilizando o aplicativo

E mais - A situação do Uber em outras cidades do brasil e do mundo

No Rio de Janeiro, a Câmara Municipal aprovou nessa terça-feira (25) projeto de lei que proíbe a circulação de motoristas que façam transporte particular como os associados ao Uber. Caso a norma seja sancionada pela prefeitura, quem for flagrado prestando o serviço poderá ser multado em até R$ 7 mil.

Em São Paulo, onde não há lei que regulamente o aplicativo, a prefeitura apreendeu 53 veículos do Uber entre agosto de 2014 até essa terça-feira (25). Já em Vitória (ES), onde o sistema ainda não opera, a Câmara se antecipou e aprovou lei que proíbe o aplicativo, mas a administração municipal informou que irá vetar a legislação.

Nos EUA, cerca de 50 jurisdições já regulamentaram a plataforma. No entanto, taxistas de Nova York reclamam de queda de 30% nas corridas e da desvalorização do preço das licenças. A prefeitura chegou a anunciar que limitaria o número de carros do Uber, mas voltou atrás.

Em Toronto, no Canadá, os taxistas exigem do Uber, na Justiça, indenização de US$ 307 milhões, além de reivindicar a interrupção do serviço na província de Ontário.

Na América Latina, a Cidade do México foi a primeira a regulamentar o Uber e empresas do tipo. As regras estipula imposto de 1,5% do custo da corrida, que é destinado a um fundo para melhorar os serviços de táxi. Revoltados, taxistas promoveram protestos na cidade.

Na Europa, o Uber sofre resistência em diversas localidades. Em meio a violentos protestos de taxistas, o UberPop foi suspenso temporariamente na França. A empresa também enfrenta proibições na Alemanha, Holanda, Itália e Espanha. Em Londres, a Alta Corte de Justiça deverá decidir em outubro sobre a legalidade do aplicativo.

Ponto a ponto

Detalhando os projetos em tramitação na Câmara de BH, Assembleia de Minas e Congresso

Pela regulamentação (querem normatizar a atuação do aplicativo):

Projeto de Lei 1.663/2015
Autoria: Vereador Adriano Ventura (PT)
Fase atual: Em apreciação pela Comissão de Legislação de Justiça da Câmara Municipal

Projeto de Lei 1.647/2015
Autoria: Vereador Professor Wendel (PSB)
Fase atual: Em apreciação pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário

Projeto de Lei 1.516/2015
Autoria: Vereador Juninho Los Hermanos (PRB)
Fase atual: Tramitação suspensa

Projeto de Lei: 530/2015
Autoria: senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES)
Fase atual: Apreciação pela Comissão de Viação e Transportes do Senado Federal

Pela proibição

Projeto de Lei: 1.645/2015
Autoria: Vereador Wellington Magalhães (PTN)
Fase atual: Em apreciação pela Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana

Projeto de Lei: 1.631/2015
Autoria: Vereador Vilmo Gomes (PTdoB)
Fase atual: Em apreciação pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário

Projeto de Lei:1.582/2015
Autoria: Vereador Lúcio Bocão (PP)
Fase atual: Em apreciação pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário

Projeto de Lei:1.531/2015
Autoria: Vereador Lúcio Bocão (PP)
Fase atual: Em apreciação pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário

Projeto de Lei: 2.316/2015
Autoria: Deputado federal Laudívio Carvalho (PMDB)
Fase atual: Em apreciação pela Comissão de Viação e Transporte da Câmara dos Deputados

Projeto de Lei: 2.675/2015
Autoria: Deputado estadual Fred Costa (PEN )
Fase atual: Tramitação suspensa


Para especialistas, regulamentação encerraria polêmica

Apontado como inovador, Uber esbarra na concorrência com sistema consolidado

Aplicativo de carona paga, o Uber é, na avaliação de especialistas, uma inovação de mercado que, se não fosse a regulamentação do sistema em que está inserido, seria mais um serviço ofertado com qualidade, à disposição do usuário. A polêmica, entretanto, que envolve a tecnologia, está ligada à concorrência com taxistas, meio de transporte consolidado e aprovado.

“Se não existisse um marco legal para os taxistas, o Uber estaria mil anos à frente no que diz respeito ao transporte urbano. O futuro da mobilidade é o compartilhamento, a divisão e otimização de um bem durável. No entanto, em função da regulamentação que existe, fica difícil inovar”, ressalta João Bonomo, coordenador do Núcleo Acadêmico de Vocação Empreendedora (I-Nave) do Ibmec.

Segundo ele, quando se pensa em um negócio que já existe, mas que precisa ser renovado e incrementado, a palavra-chave é evolução. “No mundo dos negócios, evoluir é inovar, especialmente no caso do Uber, que trabalha num setor altamente regulamentado, que é o do transporte”, diz.

Satisfação do cliente

Por outro lado, para o doutor em ciência política Adriano Gianturco, também do Ibmec, a despeito da polêmica que envolve o uso do aplicativo, o sucesso do serviço é um sinônimo claro da satisfação do cliente. E a regulamentação, para ele, pode ser um entrave para a qualidade.

“As regulamentações que existem surgiram para proteger um agente econômico e social e não para determinar a qualidade de um serviço. O resultado é a insatisfação da parte envolvida, não acostumada à competição”, afirma.

O serviço oferecido pelo Uber vai ao encontro do turismo de negócios, vocação reconhecida da capital mineira. Na avaliação do presidente da Comissão de Informática, Direito Eletrônico e Crimes Eletrônicos da OAB, Luis Felipe Silva Freire, além de atender à população, de maneira geral, o sistema é importante sobretudo para um público crescente em BH.

“O novo serviço atrai não somente pela comodidade e praticidade, mas pela qualidade que oferta. E, por não ser o dono dos veículos nem pagar salários aos motoristas, não pode ser considerado ilegal nem ser multado”, completa.

Regulamentar o serviço pode permitir a atuação harmoniosa entre motoristas particulares e taxistas, que poderão dividir um mesmo espaço sem se confrontar. Uma legislação sobre o assunto permitirá ainda um controle da cobrança de impostos e a fiscalização.

Além disso

No Brasil

Zaznu: serviço até 35% mais barato que o táxi
Pongo: o pedido é enviado aos motoristas mais próximos do chamado
TipCar: une pessoas que queiram dividir os gastos
Dwingo: ajuda a encontrar pessoas que vão para um mesmo destino
Beep Me Caronas: a tarifa é estipulada antes da corrida
Karona: o usuário faz o cadastro e traça a rota
Wego Caronas: o usuário marca de se encontrar com quem for passar pela rota

No mundo

Sidecar: disponível apenas nos Estados Unidos, o usuário acompanha por um mapa a chegada da carona
Lyft: usado em 24 cidades norte-americanas, é semelhante ao Uber
RideWith: testado pelo Google em Israel, usa o sistema de navegação do Waze
Shuddle: disponível na Califórnia, nos EUA, é focado no transporte de crianças e adolescentes no trajeto casa-escola

Opinião

“A concorrência do Uber é desleal, pois não pagam tributos como nós, dos táxis” - Gleidison Godoi - Taxista há 11 anos


“O novo modelo abre uma ocorrência saudável, estimula e melhora o sistema” - Leandro Silva - Taxista há 5 anos


“A regulamentação do Uber facilitaria o entendimento. O usuário tem direito” - Rodrigo Ferreira - Motorista do Uber


“A concorrência entre Uber e táxi é saudável desde que seja regulamentado” - Mário Lúcio Brum - Policial Militar


“Os taxistas precisam melhorar o atendimento. Esse é o diferencial do Uber” - Geraldo Primo - Médico


“O usuário quer respeito, conforto e preço justo. Os táxis precisam se adequar” - Joyce Oliveira - Estudante


(*) Colaborou Karla Scarmigliat

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