Um dia após simulado, moradores de Barão de Cocais questionam efetividade do treinamento

José Vítor Camilo
26/03/2019 às 16:27.
Atualizado em 05/09/2021 às 17:58
 (DEFESA CIVIL / DIVULGAÇÃO)

(DEFESA CIVIL / DIVULGAÇÃO)

Apesar de a Defesa Civil de Minas Gerais ter confessado que existiam falhas a serem consertadas no primeiro simulado de rompimento de barragem, com a evacuação das pessoas da área de risco secundário sendo concluída em 32 minutos, nessa segunda-feira (25), em Barão de Cocais, na região Central do Estado, nesta terça-feira (26) diversos moradores que participaram do treinamento foram às redes sociais questionar a efetividade do simulado.

Na página oficial da prefeitura da cidade no Facebook, uma publicação sobre a simulação pedia a opinião dos moradores. Imediatamente passaram a surgir cidadãos revoltados e descrentes sobre o que foi promovido. "Está tudo muito bonito, na teoria. Mas, na prática, não funcionou e não vai funcionar. Eles já pararam pra pensar que a nossa rotina normal continua? Que todo esse planejamento está sendo feito em cima da hipótese que as pessoas estarão em casa, esperando a sirene tocar e prontas pra sair correndo com a malinha? Já pararam pra pensar quantas pessoas estarão no centro comercial da cidade, dentro de supermercados? Uma coisa é evacuar e treinar quem mora no centro, outra coisa é contar com o pânico de quem mora, quem trabalha, quem está fazendo compra, quem está longe de casa, quem está de carro na rua", apontou uma moradora. 

Um outro morador do município apontou que a irmã, que vive dentro da área de risco, estava em um local onde havia um funcionário da Vale e que ninguém ouviu a sirena, sendo que somente depois de 50 minutos do início do simulado a familiar dele se deslocou para o ponto de encontro. "Chegando lá eles foram conversar com uma funcionária da Vale sobre o ocorrido. E a mesma, com bastante rispidez, disse que não tinha problema, já que a maioria do povo tinha conseguido ouvir a sirene. Minha crítica fica à prefeitura, à Vale e à Defesa Civil, que juntos montaram o esquema para morrer o menor número de pessoas, e não para salvar todos", apontou. 

Ainda na rede social da prefeitura, uma pessoa afirmou que o simulado só foi um sucesso por ter sido programado. "Muitos se deslocaram mesmo sem ouvir a sirene. Esse simulado deveria ser em um horário surpresa. Aí sim teria como fazer uma análise justa", argumentou. "Eu não consegui entender como concluíram que gastou 32 minutos, sendo que eu e minha rua inteira só chegamos depois de 1h, pois ficamos esperando mais de 40 minutos ouvir alguma sirene e, mesmo assim, não ouvimos nada", completou outra internauta. 

Defesa Civil

Segundo o tenente-coronel Flávio Godinho, coordenador da Defesa Civil Estadual,  é normal a reação da população, já que a situação é desesperadora no município. "Quando a gente fala dos 32 minutos, é o tempo que conseguimos que todas as pessoas deixassem a área da mancha de inundação. Algumas pessoas deixam essa área andando poucos metros. Porém, levam mais tempo para chegar ao ponto de encontro. O que acontece é que, mesmo que ela leve uma hora para subir até o ponto de encontro, ela já estará segura após alguns metros caminhados", exemplifica. 

Ele confirmou que houve algumas pessoas com dificuldade de locomoção, ou que estavam ajudando outras pessoas, que chegaram ao ponto de encontro somente após 1h.  "Também tivemos várias pessoas que se recusaram a participar, que simplesmente não saíram de casa. Quando a viatura passou, eles falaram que não iriam, que abririam mão do simulado. Por isso informamos que atingimos cerca de 60% do nosso público total", completou Godinho. 

O coordenador da Defesa Civil Estadual disse ainda que, nesta terça-feira, o órgão fez visitas nas casas de 46 pessoas com necessidades especiais de locomoção. Dentre estas, 10 quiseram ir para hotéis, oito para casa de parentes e o restante preferiu ficar em casa mesmo. "Agora vamos determinar um aporte financeiro a ser pago pela Vale para estas pessoas que preferiram ficar na casa de familiares", completou. 

Quando foi questionado sobre a possibilidade levantada por moradores de se fazer um simulado de forma surpresa, a possibilidade foi negada pelo tenente-coronel. "A gente vê muita gente insegura, e com razão, mas não é o momento de fazer outro simulado. Nossa intensão com esse treino era só que as pessoas soubessem para onde ir. Para a Defesa Civil o simulado atingiu seu objetivo", finalizou Godinho. 

A reportagem também tentou contato com o prefeito do município, Décio Geraldo dos Santos (PV), porém, ele não foi encontrado para comentar sobre as reclamações da população. A Vale também foi questionada, mas disse apenas que as perguntas deveriam ser direcionadas à Defesa Civil Estadual. 

Problemas 

Após o fim da simulação, o tenente-coronel Godinho concedeu entrevista para fazer um balanço deste primeiro treinamento. Ele admitiu que alguns problemas foram registrados, principalmente com relação aos carros de som que avisaram sobre a evacuação. “Em dois bairros da cidade os moradores reclamaram que o som dos carros estava muito baixo e temos que ampliar esse som”, enfatizou Godinho.

Segundo ele, o simulado envolveu 3.626 pessoas que poderiam ser atingidas em caso do rompimento da barragem Sul Superior, na mina Gongo Soco. O simulado ocorreu três dias após as sirenes tocarem na cidade após a estrutura passar para o nível 3, que é de alerta máximo para risco de rompimento.

Conforme a Defesa Civil, 652 pessoas trabalharam diretamente no simulado desta segunda, que envolveu ainda 24 viaturas da PM e oito do Corpo de Bombeiros, 10 ambulâncias, duas aeronaves, 21 profissionais de psicologia e 14 de veterinária e de biologia. A MG-129 precisou ficar interditada para que nenhum veículo entrasse na cidade. 

Apesar do aparente sucesso, 26 pessoas acabaram precisando de serem atendidas na área de saúde dos pontos de encontro definidos no simulado.  Ao longo da atividade, três pessoas ainda precisaram ser encaminhadas para hospitais, uma por hipoglicemia, outra por mal súbito e uma terceira por queda de motocicleta.

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