Vale usou laudo da empresa alemã para obstruir ação do MPMG, diz promotor de Brumadinho

José Vítor Camilo*
21/03/2019 às 16:48.
Atualizado em 05/09/2021 às 17:54
 (REPRODUÇÃO / REDES SOCIAIS)

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Para um dos promotores que atua na força-tarefa que investiga o rompimento da barragem em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a mineradora Vale utilizou a empresa alemã Tüv Süd - contratada para atestar a segurança da estrutura - para atrapalhar a atuação de órgãos de fiscalização e controle do setor e, também, a atuação do próprio Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). A afirmação foi feita na última terça-feira (19) durante o Seminário da Associação dos Juízes do Brasil (Ajufe), realizado na capital mineira. 

de certificação de segurança de barragens", afirmou o promotor William Garcia Pinto, do MPMG de Brumadinho, durante palestra concedida no evento. 

Para exemplificar o que ele fala, o promotor afirma que, logo após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na região Central do Estado, foram instaurados inquéritos civis em Brumadinho para apurar a situação de todas as barragens do município, dentre elas a B1, que se rompeu em janeiro deste ano. "Em junho do ano passado, simultaneamente à primeira certiifcação pela Tüv Süd, a geóloga do MPMG encaminhou para a promotoria de Brumadinho um requerimento de documentos complementares que foram requisitados à propria Vale, visando que a análise da barragem B1 fosse aprofundada", afirmou.

Já no dia 6 de novembro de 2018, menos de dois meses antes do rompimento da barragem em Brumadinho, um advogado da Vale teria então protocolado uma solicitação no MPMG requerendo o arquivamento do inquérito civil "por não haver risco para a vida humana, saúde e meio ambiente".

"Ele junta nesse pedido dois CDs com diversos documentos, o principal deles sendo justamente o certificado de estabilidade feito pela empresa alemã. Até hoje a Vale usa desse laudo, se escuda na potencial credibilidade da empresa, para dizer que não sabia. Por isso, afirmo que a empresa foi usada para dificultar a atividade do MPMG e tirar do radar do poder público a prioridade daquela barragem, que estava tão crítica que menos de dois meses depois se rompeu", afirmou Garcia Pinto. 

Por fim, o promotor de Brumadinho lamentou a proporção do crime ambiental que atingiu sua cidade. "Posso afirmar como promotor da cidade que, nos 15 primeiros dias após o rompimento, eu não teve nem um dia que eu não tive informação de um velório de alguém próximo, conhecido da cidade. Muito além de um desastre ambiental, esse caso é um desastre humanitário e que Minas deve levar como lição para identificar quais tipos de corporação, empreendimento, modelo de fiscalização e empresa certificadora são importantes para o Brasil. A mineração todos sabem não deve ser demonizada, mas qual tipo de empreendedor nos queremos para o brasil e MG?", concluiu.

Pressão

Entre os 13 presos temporários - que acabaram obtendo um habeas corpus e estão em liberdade -, dois são engenheiros da Tüv Süd. As outras 11 pessoas alvo de prisões temporária são funcionárias da Vale. Um dos engenheiros da Tüv Süd, Makoto Namba, chegou a afirmar em depoimento ter sido pressionado pelo gerente-executivo corporativo da Vale, Alexandre Campanha, para que emitisse o laudo. O executivo da mineradora, também em depoimento, negou que tenha feito a pressão.

Procurada, a Vale disse que "ao contratar uma empresa de auditoria de renome internacional, como a Tüv Süd, que atua em mais de 50 países, a Vale esperava que os auditores dessa empresa tivessem responsabilidade técnica, independência e autonomia na prestação de seus serviços, pois cabe ao auditor o papel de realizar um processo sistemático, documentado e independente para obter todas as evidências possíveis e avaliá-las objetivamente, privilegiando a segurança acima de tudo".

Em relação ao inquérito instaurado em 2016 para averiguar a estabilidade das barragens de Brumadinho, a empresa afirma na nota que "novembro de 2018 apresentou os planos de segurança dessas estruturas, conforme solicitado pelo Ministério Público de Minas Gerais, e solicitou o arquivamento do inquérito por confiar plenamente que as informações prestadas desde 2016 atestavam a estabilidade das barragens conforme a legislação vigente."

A empresa alemã também se posicionou por nota e disse que prefere não comentar sobre as investigações. Afirmou somente que "imediatamente após o rompimento da barragem, iniciou uma investigação independente sobre o caso e ofereceu sua total cooperação às autoridades para o esclarecimento das circunstâncias do colapso da estrutura."

(*Com Estadão Conteúdo)

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